sábado, 26 de junho de 2010

Decifrar a esfinge do governo Lula.








Decifrar a esfinge do governo Lula. Foi esse o desafio proposto pelo sociólogo e professor aposentado da USP, Chico de Oliveira, durante a mesa de abertura do Seminário de Programa da candidatura Zé Maria, na manhã desse dia 26 na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, em São Paulo. Sob pena de, segundo Chico, essa esfinge cumprir sua promessa e “devorar” a esquerda.

Foi o tema no qual se debruçaram, além do sociólogo da USP, o professor da Unicamp Álvaro Bianchi e Valério Arcary, professor do Cefet e militante do PSTU. Chico de Oliveria classificou o governo Lula como um governo de “contra-reforma”, no qual foram atacadas grandes conquistas dos trabalhadores dos últimos anos.

Chico de Oliveira atacou os principais mitos que cercam o governo Lula, como a suposta distribuição de renda. “Essa famosa redistribuição é falsa”, setenciou o professor, que lembrou que o capitalismo é capaz de criar renda, mas não distribuir. “Em todas as vezes que houve uma real redistribuição de renda, não foi o mercado que fez, sempre houve grandes lutas ou revoluções”, afirmou.

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Qual seria então o segredo que garante os altos índices de popularidade do governo? Citando pesquisas qualitativas realizadas recentemente, Chico afirmou que, para as pessoas em geral, o governo passa a ideia de ser um governo do não-conflito, que satisfaz os anseios de todas as classes sociais.

Para o professor, essa percepção é fruto de uma complexa engenharia política do governo, que trata de beneficiar a fração mais alta da burguesia com a fração mais baixa do povo. Isso se daria através do Bolsa Família de um lado e da dívida interna de outro. “Essa junção dos mais altos com os mais baixos é muito perigosa, toda vez que isso ocorre no capitalismo, deu fascismo”, disse, salientando que não acha que o atual governo seja fascista, mas que tal situação causa preocupação.

Ele citou ainda a transformação do PT, de um partido da transformação para um partido da ordem, o mesmo que aconteceu com todos os partidos “críticos” que subiram ao poder. “Vivemos uma hegemonia às avessas; é como se a burguesia dissesse: fiquem vocês se divertindo com a política como um programa de auditório do Sílvio Santos e deixe a economia com a gente”, disse.

Social-liberalismo
Já o professor da Unicamp, Álvaro Bianchi, trouxe o conceito de “social-liberalismo”, um fenômeno internacional que teria sido incorporado pelo governo, que trata de impor uma política econômica neoliberal mas colocando, no discurso, elementos das reivindicações históricas dos trabalhadores. Álvaro citou como exemplo os governos trabalhistas na Europa.

“É uma falácia dizer que o governo Lula é igual ao de FHC; e é uma falácia dizer que o governo Lula é diferente ao de FHC”, desafiou o professor. Para ele, o governo desvia recursos de serviços públicos universais como Saúde e Educação para canalizar no aumento dos gastos com assistência social, principalmente com o Bolsa Família, as chamadas “políticas focalizadas”. Ao mesmo tempo em que esse mesmo governo aprofunda o ajuste fiscal e se aproxima, ou até mesmo se funde, com o mercado financeiro, principalmente através dos fundos de pensão.

Se essa mudança não trouxe melhorias para a população, muito pelo contrário, já que a desigualdade se aprofundou durante os anos de governo Lula, ela teria alterado a base social desse governo.

Álvaro Bianchi sintetiza da seguinte forma as principais características do governo: “O que teria então o governo Lula diferente do de FHC? Um conjunto de políticas públicas que lhe garante uma base social mais ampla que a do governo anterior. E de igual? Políticas de ajustes fiscais e uma fusão com o mercado financeiro”.

“Não vamos escolher nossos carrascos”
Valério Arcary lembrou da conjuntura de crescimento econômico nos últimos meses, de crescimento. Mas salientou que, nos últimos anos, a média de crescimento do país esteve muito abaixo do crescimento mundial.

“Segundo o ministério do Trabalho nos últimos sete anos houve a criação de 13 millhões de empregos, mas são empregos de até 2 salários mínimos”, afirmou. Mas Valério lembrou ainda que o país enfrenta uma estagnação econômica há pelo menos vinte anos. O professor lembrou que, mesmo nos anos recentes de crescimento, a participação nos salários na renda nacional estava em 45%. “Se crescêssemos 5% este ano, o que é possível, e 5% no ano que vem, o que é muito difícil dado o impacto da crise internacional, em 2011 chegaríamos a ter 48% da renda formado por salários, o que é um nível de 1990”, afirmou.

Qual a razão então da popularidade do governo, para Valério? “As ilusões não morrem sozinhas”, sentenciou Valério, dizendo que o governo não conta praticamente com oposição de direita e a oposição de esquerda parte de uma tragédia histórica, já que o governo Lula “destruiu a esquerda brasileira”. Ou seja, a capitulação das direções majoritárias do movimento de massas ao governo teria tido causa determinante, e não só o Bolsa Família. “Qual a base material para que metalúrgicos, petroleiros ou qualquer outro batalhão pesado da classe trabalhadora não tenha rompido com o governo?”, pergunta.

A tarefa nessas eleições, para o professor, não pode se limitar ao discurso raso da comparação entre os governos Lula e FHC. Mas, antes disso, contrapor o país que temos hoje ao que poderíamos ter, sem a dominação estrangeira ou a exploração capitalista.

“Nós temos uma confiança na classe trabalhadora”, afirmou. “É uma classe trabalhadora jovem e, sobretudo, amplíssima e que vem crescendo”. Valério Arcary sintetizou as tarefas do PSTU na campanha eleitoral: “A tarefa do nosso partido é oferecer um instrumento de apoio a esse classe operária, fazendo com que ela recupere a confiança em si mesmo, a capacidade de lutar”.
Fonte: Blog Coquetelmolotov

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