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quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Não acredite em combustão espontânea


incendio em favelas sp

Em uma área em que se encontram 114 favelas de São Paulo, houve 9 incêndios em menos de um ano, enquanto que em uma área em que se encontram 330 favelas não houve nenhum. Algo muito peculiar deve acontecer com a minoria das favelas, pois apresentam mais incêndios que a vasta maioria. Ao menos que o clima seja mais seco nessas regiões e que os habitantes dessas comunidades tenham um espírito mais incendiário que os das outras, a coincidência simplesmente não é aceitável. O artigo é de João F. Finazzi.

João F. Finazzi (*)
Segundo a física, propelente ou propulsante é um material que pode ser usado para mover um objeto aplicando uma força, podendo ou não envolver uma reação química, como a combustão.
De acordo com o Corpo de Bombeiros do Estado de São Paulo, até o dia 3 de setembro de 2012, houve 32 incêndios em favelas do estado – cinco somente nas últimas semanas. O último, no dia 3, na Favela do Piolho (ou Sônia Ribeiro) resultou na destruição das casas de 285 famílias, somando um total de 1.140 pessoas desabrigadas por conta dos incêndios em favelas.
O evento não é novo: em quatro anos foram registradas 540 ocorrências. Entretanto, a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) criada em abril deste ano para investigar os incêndios segue parada, desrespeitando todos os trabalhadores brasileiros que tiveram suas moradias engolidas pelo fogo.
Juntamente com o alto número de incêndios, segue-se a suspeita: foram coincidências?
O Município de São Paulo apresenta 1565 favelas ao longo de seu território, distribuídas, majoritariamente na região Sul, Leste e Norte. Os distritos que possuem o maior número de favelas são: Capão Redondo (5,94% ou 93), Jardim Angela (5,43% ou 85), Campo Limpo (5,05% ou 79), Grajaú (4,66% ou 73). O que significa que 21,08% de todas as favelas de São Paulo estão nessas áreas.
Somando as últimas 9 ocorrências de incêndios em favelas (São Miguel, Alba, Buraco Quente, Piolho, Paraisópolis, Vila Prudente, Humaitá, Areão e Presidente Wilson), chega-se ao fato de que elas aconteceram em regiões que concentram apenas 7,28% das favelas da cidade.
Em uma área em que se encontram 114 favelas de São Paulo, houve 9 incêndios em menos de um ano, enquanto que em uma área em que se encontram 330 favelas não houve nenhum. Algo muito peculiar deve acontecer com a minoria das favelas, pois apresentam mais incêndios que a vasta maioria. Ao menos que o clima seja mais seco nessas regiões e que os habitantes dessas comunidades tenham um espírito mais incendiário que os das outras, a coincidência simplesmente não é aceitável.
Àqueles que ainda se apegam às inconsistências do destino, vamos a mais alguns fatos.
A Favela São Miguel, que leva o nome do bairro, divide sua região com apenas outras 5 favelas, representando todas apenas 0,38% das favelas de São Paulo. Desse modo, a possível existência de um incêndio por ali, em comparação com todas as outras favelas da cidade é extremamente baixa. Porém, ao pensar somente de modo abstrato, estatístico, nos esquecemos do fator principal: a realidade. O bairro de São Miguel é vizinho do bairro Ermelino Matarazzo, o qual, de acordo com a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe), teve a maior valorização imobiliária na cidade de São Paulo entre 2009 e novembro de 2011, 213,9%. Lá, o preço do metro quadrado triplicou – mas não aumentou tanto quanto a possibilidade real de um incêndio em favelas por ali.
As favelas Alba e Buraco Negro também estão na rota do mercado imobiliário. Dividindo o bairro do Jabaquara com o restante dos imóveis, a favela inviabiliza um maior investimento do mercado na região, que se valorizou em 128,40%. Mas nada como um incêndio para melhorar as oportunidades dos investidores.
Todas as 9 favelas citadas estão em regiões de valorização imobiliária: Piolho (Campo Belo, 113%), Comunidade Vila Prudente (ao lado do Sacomã, 149%) e Presidente Wilson (a única favela do Cambuci, 117%). Sem contar com Humaitá e Areião (situadas na Marginal Pinheiros) e a já conhecida Paraisópolis.
Soma-se a tudo isso, o fato de que as favelas em que não houve incêndios (que são a vasta maioria), estão situadas em regiões de desvalorização, como o Grajaú (-25,7%) e Cidade Dutra (-9%). Cai, juntamente com o preço dos terrenos, a chance de um incêndio “acidental”.
Pensar em coincidência em uma situação dessa é querer fechar os olhos para o mundo. Resta aos moradores das comunidades resistirem contra as forças do mercado imobiliário, pois quem brinca com fogo acaba por se queimar. Enquanto isso, como disse Leonardo Sakamoto, “…favelas que viram cinzas são um incenso queimando em nome do progresso e do futuro.”
(*) Artigo publicado originalmente no blog do PET RI PUC-SP - Programa de Educação Tutorial do Curso de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Fogo não é o maior problema de uma favela

Por Leonardo SakamotoSobre a disputa entre a Prefeitura de São Paulo e os moradores da favela do Moinho, que pegou fogo nesta quinta (22), trouxe uma informação que ajuda entender porque a Paulicéia é desvairada.

Há cinco anos, a empresa proprietária do terreno onde fica essa comunidade demonstrou interesse em doá-lo aos moradores. Mas a administração municipal não aceitou sob argumento de que não era possível alojar famílias no local. No mesmo ano, Gilberto Kassab emitiu decreto para desapropriar a área. Como a própria Prefeitura disse que a região não serve para residência, então tem outros usos para ela, como finalidades comerciais ou de lazer.
Fascinante. Não é possível alojar moradores, mas provavelmente deve ser plausível receber bancos, salas de concertos e de exposições, teatros, sedes de multinacionais, escritórios da administração pública, restaurantes. Ah, e é claro, apartamentos – desde que de pessoas que tenham dinheiro para pagar para morar em uma região com toda a infra-estrutura de transportes, saneamento, energia.
E a gente de lá, com todas as suas redes de amizades e relações profissionais, que se estabeleceram ao longo de 30 anos? Ao invés de urbanizar o local, garantindo a manutenção de pelo menos parte das mais de 500 famílias que hoje vivem na favela, dando mais vida ao Centro de São Paulo, o governo quer sacá-los. Talvez porque não se encaixem no plano de desenvolvimento para o Centro da cidade, que está ganhando investimentos públicos e privados. Sabe como é, né? Aquele bando de gente pobre só ia jogar o preço do metro quadrado para embaixo e afastar os “homens de bem” de perto.
A área central de São Paulo é alvo prioritário dos movimentos por moradia porque já tem tudo – transporte, cultura, lazer, proximidade com o trabalho. Ao longo do tempo, fomos expulsando os mais pobres para regiões cada vez mais periféricas. Eles, que têm menos recursos financeiros, gastam mais tempo e mais de sua renda com transporte do que os mais ricos que ficaram nas áreas centrais – com exceção das Alphabolhas da vida.
Cortiços e pequenas favelas em regiões retratadas no passado por Alcântara Machado no livro “Brás, Bexiga e Barra Funda” e também nos antes requintados Campos Elísios abrigam dezenas de famílias. Sem o mínimo de saneamento básico, às vezes sem água e sem luz. A maioria dos moradores desses locais prefere continuar assim, pois transporte é o que não falta e a casa fica próxima ao trabalho – ao contrário do que acontece em bairros da periferia, onde o trajeto até o centro chega a levar três horas, dentro de ônibus superlotados.
Tem sido função da Prefeitura tornar a vida desse pessoal um inferno até que eles saiam. E a desse pessoal, resistir. Feito o Cerco a Viena, de 1529, pelo Império Otomano. Naquela ocasião, o exército inimigo era numericamente superior, enquanto a elite paulistana é um mísero grão de areia frente ao restante da população pobre. Que aqui existe para servir.
Torço para que o fim seja o mesmo, com o Moinho resistindo a líderes que não sabem planejar.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

“Realengo, aquele desabafo!”: ótimo documentário sobre política de reassentamento de favelas

Por Raquel Rolnik

“Realengo, aquele desabafo!” é um interessante documentário sobre a política de reassentamento de favelas. O filme mostra o processo de reassentamento de 598 famílias moradoras de assentamentos informais na cidade do Rio de Janeiro.

Parte das famílias saiu de ocupações e favelas em bairros como Copacabana, Madureira e Olaria; outra parte eram vítimas dos desabamentos no morro do Urubu, no bairro do Pilar. Todas elas foram morar a cerca de 25km de seus locais de origem.

Realizado por uma equipe de pesquisadores do Observatório das Metrópoles, o documentário traz entrevistas com moradores dos dois conjuntos habitacionais recém-inaugurados em Realengo que receberam estas 598 famílias.

O vídeo mostra como são feitos os reassentamentos (quando existem, ou seja, quando a solução não é o famigerado “cheque-despejo”). Vale ressaltar que são muitas as situações que estão provocando remoções e, eventualmente, reassentamentos: desde a existência de desabrigados por conta de desastres até os megaprojetos de remodelação de áreas urbanas.

Atualmente, com a preparação do país para a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos, muitas comunidades estão sendo removidas ou estão ameaçadas de remoção sem que haja um plano de reassentamento claro, construído em diálogo com a população que será atingida.

Essa é uma das pautas dos protestos que aconteceram no último sábado no Rio e em São Paulo por ocasião do sorteio das chaves das eliminatórias da Copa.

Segue abaixo o vídeo:


terça-feira, 30 de novembro de 2010

A farsa da pacificação do Estado do Rio de Janeiro


Por Escrito por Cyro García

O estado do Rio de Janeiro vive uma verdadeira guerra civil, um estado de sítio, que desmascara a demagogia e a incompetência do governador reeleito Sergio Cabral (PMDB) e seus subordinados. Para ganhar a eleição divulgaram amplamente que a cidade e o estado estavam pacificados, que tinham através das Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) acabado com o tráfico e, consequentemente, com a violência.

Neste exato momento helicópteros da Polícia Civil e da Polícia Militar sobrevoam a cidade e as comunidades do Complexo do Alemão e a de Manguinhos, tentando encontrar os culpados por esta situação. As escolas estão suspendendo as aulas e os trabalhadores estão voltando mais cedo para as suas casas. No centro da cidade, as pessoas interrompem mais cedo as suas atividades. Neste momento, ônibus estão sendo incendiados, e rodovias bloqueadas por traficantes, que saqueiam os veículos e logo em seguida ateiam fogo. Nos últimos dias, mais de 40 veículos, entre ônibus e carros de passeio, foram incendiados, dezenas de bloqueios de estrada, para em seguida ser praticado o saque aos motoristas.

Em vários pontos do estado, o governador aliado de Lula tenta, através de blitz, inibir a ação dos traficantes, todos os policiais que exerciam funções internas, médicos, mecânicos, funcionários burocráticos, todos foram convocados para atuarem nas ruas das cidades como se o problema da violência fosse resolvido numa ação de guerra. Todas as medidas até agora adotadas pelo setor de segurança do estado falharam, e o que predomina é o pânico, a insegurança e a falta de uma política que de fato enfrente a violência e a insegurança.

Neste momento, a imprensa, em particular a Rede Globo, aproveita a situação para aumentar sua audiência, alardeando o caos em que se encontra a cidade e o estado, mas não fala que tudo isso se explica, por um lado, em função da miséria que vive uma parte da população, que é condenada a viver nos morros da cidade em barracos, sem empregos e com salários insignificantes, reprimida pela polícia fascista e corrupta de Sergio Cabral, pelo tráfico ou pela milícia. Por outro lado, a conivência do Estado com os grandes empresários, que têm ligação com o tráfico internacional de drogas e de armas. Estes senhores, quando são pegos, alegam que são colecionadores de armas.

Neste momento, o secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, disse que quem passar na frente do Estado vai ser atropelado. Os policiais traduzem as ordens do Estado e dizem que vai morrer muita gente. Treze pessoas já morreram, demonstrando qual é a política destes senhores fascistas. Vão exterminar os pobres, negros e jovens e vão dizer que são traficantes. Um bom exemplo a partir do qual não devemos confiar nestes governantes foi a instalação das UPPs na área da Tijuca - o morro do Borel, Formiga, Casa Branca, Macacos, Morro da Liberdade, Turano, Salgueiro, todos com grande presença do tráfico, com centenas de traficantes fortemente armados, foram ocupados após acordo do governo com os traficantes, que garantiu a saída de todos, com seu armamento de guerra, antes da ocupação.

Uma vergonha. Esta manobra do governador e de todos os seus aliados foi comemorada por Sérgio Cabral, Lula e Dilma, e seu secretário de Segurança, que divulgaram amplamente que tinham acabado com o tráfico e pacificado a cidade e o estado sem dar um tiro. Disseram que os traficantes fugiram assustados. Com este discurso, ganharam as eleições de outubro. Quem não lembra da candidata Dilma dizendo na televisão que iria exportar estes exemplos do Rio para o resto do país? Na verdade, o que ocorreu foi um grande acordo do Estado com os traficantes, que se deslocaram para outras regiões da cidade e do estado, preparando a região da Tijuca e da Zona Sul para receber os turistas e os investimentos da Copa do Mundo e para as Olimpíadas.

O governador e seus aliados andam de carro blindado, com escolta de seguranças, de helicóptero, enquanto nós trabalhadores ficamos vulneráveis nos ônibus, que estão frequentemente sendo incendiados. O governo aproveita esta situação para criminalizar a pobreza, estão preparando um verdadeiro extermínio nas regiões mais pobres. Está sendo preparada a invasão do Complexo do Alemão e de Manguinhos. Sabemos que quem vai pagar são os trabalhadores e a juventude, com o pretexto de atacar os traficantes, sabemos onde vai dar essa política. Se for negro e pobre, atira e depois verifica quem é.

Um programa socialista para enfrentar a violência

Não achamos que as UPPs sejam a solução. Não é possível viver sob uma ocupação. Todas as mídidas de maquiagem do Estado, os cursos com os caminhões do SENAC nas comunidades (para pouquíssimas pessoas) para ensinar corte e costura e formar cabeleireiro e noções de informática, não garantem o que é o fundamental. As pessoas precisam na comunidade e no país de um bom emprego, com um salário decente. Por isso propomos que o salário mínimo dobre imediatamente. Propomos a construção de boas escolas com muitas vagas e com profissionais da educação tendo um salário decente, e não o vergonhoso salário de 700 reais que paga o estado ao professor. Defendemos a construção de bons hospitais para que os trabalhadores não morram por falta de leito nas emergências. Exigimos que o governador pare imediatamente com a demolição do IASERJ, com o fechamento do Pedro II, hospitais que são fundamentais. Queremos lazer decente, acesso à cultura, e não maquiagem para turista ver. Queremos moradias decentes e com infra-estrutura. Existe um responsável pelas ações que estão ocorrendo no estado e na cidade: é o governador, os prefeitos e o governo federal, que fizeram muito estardalhaço nas eleições e que agora nos deixam nesta situação.

Não acabaremos com a violência e com o tráfico sem descriminalização das drogas, sem colocar na cadeia os grandes empresários que traficam as armas e as drogas, sem o confisco de seus bens. Não acabaremos com violência se não tivermos empregos decentes para as nossas famílias. Precisamos dissolver essa polícia e construir uma polícia ligada à população e, principalmente, controlada por ela, com eleições para o comando e para os delegados e com mandato revogável. Exigimos o fim do extermínio dos pobres e negros. Não à invasão e ao extermínio dos moradores das comunidades.

Cyro García é presidente do PSTU - Rio de Janeiro.

Página na Web: http://www.pstu.org.br/

domingo, 31 de outubro de 2010

Mais pressões e despejos na periferia de São Paulo


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Brasil de Fato - Desta vez moradores da Vila Rubi, (zona sul da capital) realizaram um protesto contra a derrubada de casas.

Moradores da Vila Rubi, no bairro Cidade Dutra (zona sul de São Paulo) realizaram na terça-feira (20) um protesto contra a derrubada de casas e a falta de políticas habitacionais para as famílias.

Os moradores se digiram à sede da construtora Santa Bárbara, contratada pela Prefeitura para realizar cadastros e efetuar a remoção de casas que estariam localizadas em zonas de risco.

Situada em área de manancial, desde o inicio do ano, a Vila Rubi passapor trabalhos de canalização e despoluição dos córregos. As obras fazem parte do "Programa Mananciais", desenvolvido pela Secretaria Municipal de Habitação (Sehab), que prevê a recuperação do entorno das represas Guarapiranga e Billings.

Os moradores que perdem suas casas, porém, não são indenizados. Eles também reclamam de pressões para deixar a área e de falta de alternativas de moradia. A única alternativa apresentada é o auxílio-aluguel (também chamado cheque-despejo), no valor de 400 reais e válido por seis meses. Moradora da Vila Rubi há 26 anos, Mara conta que os cheques são oferecidos diretamente por assistentes sociais da construtora Santa Bárbara. "As assistentes sociais procuram as famílias toda semana e fazem a proposta [de aceitarem o cheque]. E elas dizem, 'vocês [moradores] têm que se virar", relata.

O valor do cheque, no entanto, é considerado insuficiente para alugar outra casa na região, que passa por uma supervalorização dos imóveis. A insegurança e o medo de não conseguir outra casa leva, assim, muitas famílias a resistirem em suas residências. Neste caso, segundo Mara, as assistentes oferecem uma quantia – que varia entre cinco e dez mil reais - para quem deixar a área e retornar a seu local de origem. "Muita gente, menos esclarecida, acaba aceitando [ir embora]", lamenta Mara.

Protesto

Mara conta que, no momento em que as famílias chegavam à sede da construtora Santa Bárbara, vários moradores se preparavam para aceitar o cheque-despejo. Segundo ela, ao serem informados dos motivos do protesto, muitos desistiram e aderiram à manifestação. "O pessoal achou que era obrigado a sair das casas", relata.

Os moradores tentaram uma audiência com representantes da construtora, mas conseguiram apenas, por meio de um engenheiro, um número de telefone para tentar marcar uma reunião.

As famílias cobram mais informações sobre os seus reassentamentos. Mara conta que, em reunião na comunidade no início do ano, representantes da Prefeitura prometeram que as famílias receberiam, futuramente, moradias definitivas. Até hoje, porém, eles não receberam definições sobre prazos para a entrega ou sobre e forma de obtenção dos imóveis.

Os moradores também pressionam para que a demolição das casas seja suspensa. Segundo Mara, o trabalho das máquinas tem prejudicado a estrutura das casas vizinhas, colocando em risco a vida dos seus habitantes. "Conforme eles [técnicos] vão derrubando as casas, as outras [casas] vão rachando", afirma.

A falta de segurança durante a derrubada das casas também é destacada pela educadora social do Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedeca) de Interlagos, Adriana Oliveira. De acordo com ela, as demolições ocorrem sem o devido isolamento do local. "É absurdo fazer demolições com crianças na área, sem segurança alguma", critica.

A educadora social informa ainda que a situação das crianças tem sido levada ao Conselho Tutelar e Defensoria Pública do Estado, em função das consequencias provocadas pelos despejos. "É uma grave violação a criança perder sua casa e perder o vínculo com a escola. Há casos em que pais e filhos se separam", detalha.

Especulação

De acordo com Adriana, as denúncias de violações de direitos humanos aumentaram não apenas na Vila Rubi, mas em todas as região afetadas por obras de intervenção urbanística. Ela cita, como exemplos, as comunidades XIX e XX, Parque Cocaia I e Jardim Toca.

Além do "Programa Mananciais", a Prefeitura executa na zona sul a Operação Urbana Defesa das Águas, em parceria com o governo do Estado, também com foco na despoluição e "reurbanização" de áreas de mananciais.

A realização de obras coincide com o crescimento do setor imobiliário na região, sobretudo de empreendimentos de alto padrão. De acordo com Mara, já existem construções em andamento em terrenos onde, anteriormente, viviam comunidades pobres.

Para a moradora, a realização das intervenções tem como intuito principal a "limpeza" da área, que vai ao encontro da especulação imobiliária. "Alegam [poder público] que estão protegendo a natureza, mas não estão mexendo nas grandes mansões, nos casarões", alerta Mara.

Casos como o da Vila Rubi se verificam em várias regiões de São Paulo, onde intervenções urbanísticas semelhantes já levaram à realocação de milhares de pessoas. Em Paraisópolis, também na zona sul, um projeto de "urbanização de favelas" - apresentado como modelo pela Sehab - tirou centenas de famílias de suas casas. Já na zona leste, cerca de 28 mil famílias devem ser removidas para a construção do Parque Várzeas do Tietê, já anunciado como o maior parque linear do mundo.

"Eles tiram o pobre do centro e jogam pra periferia. Da periferia eles jogam para a rua. Não tem mais lugar para pobre em São Paulo", conclui Mara.

Procurada pelo Brasil de Fato, a Secretaria de Habitação não retornou as mensagens enviadas.

Foto: Joelma Couto

Fonte: Diário da Liberdade

Prefeitura defende remoções forçadas e urbanista explica ciclo do despejo na cidade

Ontem (27) a Folha publicou mais uma matéria sobre remoções forçadas causadas por projetos desenvolvidos pelo poder público na cidade de São Paulo. Abaixo segue a matéria na qual a prefeitura defende os despejos sem oferta de moradia adequada à população. E, na sequencia, um interessante artigo da urbanista Mariana Fix, que problematiza a questão e explica a lógica do ciclo do despejo como política pública.
Prefeitura defende despejo mesmo sem oferta de moradia

Para secretário da Habitação, aluguel de casa é alternativa para quem vive em área de risco

JOSÉ BENEDITO DA SILVA
DE SÃO PAULO

O secretário municipal de Habitação, Ricardo Pereira Leite, defendeu a retirada de famílias de casas irregulares em áreas de risco mesmo que a prefeitura não possa lhes oferecer moradia definitiva. Hoje, a cidade de São Paulo tem 12 mil famílias recebendo dinheiro da prefeitura para alugar um imóvel. Na segunda-feira, reportagem da Folha mostrou que o Estado vive o maior despejo coletivo de sua história -165 mil perderão sua casas até 2015- e que a maioria é desalojada sem ter para onde ir.

“Em Nova York, 70% dos imóveis são alugados. O presidente da Cohab de lá vive num imóvel alugado. O aluguel é uma forma de provisão de moradia, embora continue sendo necessária a oferta de uma moradia fixa”, diz. Elisabete França, superintendente de habitação popular da secretaria, concorda. “Quantas pessoas de classe média, estudantes, vivem hoje em casas de aluguel?” Segundo ela, os contemplados pelo auxílio-aluguel recebem um termo de compromisso da prefeitura de que terão imóvel definitivo.

Para o secretário, o importante é retirar as famílias de áreas de risco. “No ano passado, algumas pessoas morreram. A gente precisa fazer isso [o despejo]. Temos de, ao mesmo tempo, produzir [imóveis] e zelar pela vida.” Segundo a secretaria, o município precisa mais que dobrar o gasto hoje com habitação para dar conta da demanda -há 800 mil vivendo em moradias inadequadas. O município aplica R$ 1,5 bilhão por ano em habitação, mas o ideal seriam R$ 3,6 bilhões -o Orçamento da cidade para 2011 será de R$ 34,6 bilhões. A prefeitura investe 61% do total, seguida da União (24%) e Estado (15%).

EQUÍVOCO
Para Carlos Loureiro, defensor público de habitação e urbanismo, é um equívoco retirar pessoas de suas casas sem ter moradia definitiva.
“Transfere a responsabilidade para a pessoa. E ela tem de lidar com o mercado de locação, muito sensível à lei da oferta e da procura. Você estimula uma grande procura, os preços variam com muita intensidade e o valor do auxílio se revela insuficiente.”

A desempregada Cássia Ferreira Lopes, 32, é um exemplo de como o auxílio-aluguel pode dar errado. Ela teve de sair de sua casa no Jardim Pantanal (extremo leste de SP), passou a receber ajuda de R$ 300 mensais, morou em dois lugares em Itaquera, não conseguiu pagar o aluguel, voltou e retomou seu imóvel condenado. Lá, onde vivia há 26 anos, resiste agora, com seus três filhos, um deles um bebê de dez meses -ela é divorciada. “Voltei, vi minha casa em pé e entrei. Consegui colocar minha filha de volta na mesma escola. Antes, não comia, chorava, estava em depressão. Agora, vou lutar.”
Moradores de favela vivem ciclo de despejo como política pública

MARIANA FIX
ESPECIAL PARA A FOLHA

O Brasil é conhecido no exterior por sua experiência em urbanização de favelas e por ter uma legislação considerada progressista no campo do direito à cidade. Diversos municípios têm se dedicado, no entanto, a desenvolver uma tecnologia de “remoção” de favelas contrária aos direitos sociais.

Em São Paulo, a prática foi institucionalizada por Jânio Quadros (1985-88) com o nome de “desfavelização” e teve na gestão Maluf (1993-96) um dos seus casos mais emblemáticos: a expulsão de mais de 50 mil pessoas para a abertura da avenida Jornalista Roberto Marinho.

Nessas ações, os habitantes das favelas costumam enfrentar pressão e violência, e são forçados a abandonar rapidamente suas casas. Recebem ofertas como verba em dinheiro (o “cheque-despejo”), bolsa-aluguel ou passagens para mudar de cidade. Se tiverem chance de entrar em algum financiamento para habitação, precisarão aguardar em alojamentos por vários anos.

Na mira do trator, na verdade são geralmente empurrados para outras favelas, cada vez mais longe -frequentemente, em beiras de córregos ou nas margens das represas de abastecimento de água, protegidas por lei.

O destino não é casual. A lei de proteção ambiental retira aquelas terras do jogo imobiliário, que define o preço de cada pedaço da cidade quase sempre acima dos baixos salários que a maioria dos brasileiros recebe.

Nas margens da represa, sua presença é temporariamente tolerada por não interferir nos circuitos de valorização imobiliária, até serem novamente ameaçados de expulsão.

Na falta de alternativas, essa é a saída que encontram pedreiros, porteiros, vigias, domésticos e diaristas, entre muitos outros, para não ficarem mais longe do lugar no qual trabalham.

O problema aumenta quando, em vez de uma política ambiental, prevalece o discurso supostamente ecológico para criminalizar esses moradores, ignorando a lógica de produção social da cidade. Basta ver o panfleto “É crime”, recentemente distribuído pela prefeitura nas escolas aos filhos dos moradores do Jardim Pantanal.

É também grave quando obras como a ponte Octavio Frias de Oliveira absorvem todos os recursos da Operação Urbana, que deveriam ter sido repartidos com a habitação social na região da Água Espraiada. Uma enorme desproporção entre a rapidez para produzir grandes obras viárias e a demora em relação à moradia. Até hoje nenhuma foi construída.

Assim, as favelas não são eliminadas, como dizem, mas deslocadas para áreas de menor interesse imobiliário, onde a população vive em condições ainda piores.

São ciclos implacáveis de assentamento, despejo, reassentamento. Entre as consequências estão o aumento das disparidades sociais, a sobrecarga do sistema de transporte e o agravamento dos problemas ambientais e de saúde pública.

MARIANA FIX é arquiteta e urbanista.
Fonte:http://raquelrolnik.wordpress.com/2010/10/28/prefeitura-defende-remocoes-forcadas-e-urbanista-explica-ciclo-do-despejo-na-cidade/

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Projetos públicos em São Paulo "expulsam" 165 mil pessoas de casa

50 mil famílias serão desalojadas em São Paulo por conta de projetos desenvolvidos pelo poder público

“Projetos em execução pelo poder público em São Paulo vão desalojar compulsoriamente de suas casas cerca de 50 mil famílias em dez anos (2006-2015), no maior deslocamento populacional forçado já registrado no Estado.” A informação é de matéria publicada ontem na Folha de São Paulo e Folha Online.

Esta informação é muito significativa quando pensamos na concretização do direito à moradia em nosso Estado. O Brasil é signatário de tratados internacionais que asseguram o direito à moradia adequada à população. Portanto, remoções só devem ser feitas em casos extremos e, ainda assim, com oferta às famílias de alternativas de moradia no mesmo nível ou melhores que a anterior.

No ano passado, produzimos na Relatoria da ONU para o Direito à Moradia Adequada a cartilha “Como atuar em projetos que envolvem despejos e remoções?”, com orientações aos envolvidos em projetos de desenvolvimento sobre como integrar o direito à moradia adequada na implementação dos empreendimentos.

Segue abaixo a matéria da Folha:

Projetos em execução pelo poder público em São Paulo vão desalojar compulsoriamente de suas casas cerca de 50 mil famílias em dez anos (2006-2015), no maior deslocamento populacional forçado já registrado no Estado. A informação é da reportagem de José Benedito da Silva publicada na edição desta segunda-feira da Folha (íntegra da coluna está disponível para assinantes do jornal e do UOL).

De acordo com o texto, considerando 3,3 moradores por casa --média da prévia do Censo 2010--, o número de desalojados chega a 165 mil, mais que a população de São Caetano do Sul (153 mil). A maioria das casas é irregular, está em áreas de risco ou preservação ambiental. Quase a metade das famílias desalojadas será atingida por ações de cunho ambiental.

Joel Silva/Folhapress
Dona de casa Betania Bonfim sentada nos escombros de sua casa derrubada para obras das margens da represa Billings
Dona de casa Betania Bonfim sentada nos escombros de sua casa derrubada para obras das margens da represa Billings

A maior delas é o Várzeas do Tietê, um megaparque linear de 107 km de extensão que vai do extremo leste de São Paulo até Salesópolis, onde nasce o rio Tietê. O projeto prevê desalojar 10 mil famílias em seis cidades, sendo a maior parte na região do Jardim Pantanal, onde remoções começaram após enchentes em 2009.

A maioria dos projetos é executada pelo governo do Estado ou prefeitura, mas parte tem recursos do PAC (federal) ou financiamento de órgãos como BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e Banco Mundial.

OUTRO LADO

A Prefeitura de São Paulo diz que há 800 mil famílias à espera de moradia adequada, que age diante de situações emergenciais e que uma solução definitiva deverá vir até 2024, como prevê o Plano Municipal de Habitação. Segundo ela, estão sendo urbanizadas 110 favelas na cidade, com verbas estadual, municipal e federal e que o processo é complexo pois envolve uma "negociação ininterrupta com a população".

Um dos problemas é o imediato adensamento populacional de uma favela sempre que sua reurbanização é anunciada, como diz ter acontecido na favela do Sapo (região da Água Branca), onde o número inicial de famílias saltou de 87 para 455.

Joel Silva/Folhapress
Pedreiro Jesuino Ferreira observa máquina derrubar casas ao lado da sua, que também será derrubada, para obras em SP
Pedreiro Jesuino Ferreira observa máquina derrubar casas ao lado da sua, que também será derrubada, para obras em SP

De acordo com a pasta, o objetivo é atender com casas e apartamentos todas as famílias removidas, mas que, emergencialmente, paga o chamado aluguel social --R$ 300 por mês-- para que elas fiquem em moradias provisórias até que sejam concluídas as unidades habitacionais.

Já a CDHU (companhia habitacional do Estado) afirmou que atua em favelas em duas frentes --urbanização e erradicação-- e que "em hipótese nenhuma deixa famílias sem atendimento definitivo nos locais de intervenção". Segundo ela, o Programa de Atuação em Favelas atendeu 18.375 famílias com novas moradias entre 2007 e 2010 e 22.645 foram beneficiadas com urbanização.

No Programa de Recuperação Socioambiental da Serra do Mar, a companhia afirma que as 5.350 famílias retiradas de áreas de risco ou de preservação irão para conjuntos habitacionais.

Fonte: http://raquelrolnik.wordpress.com e http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano

quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Tráfico, favelas e violência

Praisópolis-SP



Por Luis Carlos Lopes

A política de segurança adotada por sucessivos governos da cidade e do Estado comete equívocos e dialoga com público, através das mídias, de modo ainda mais equivocado. Ao não aceitar ajuda federal, o atual governador situou o problema na esfera local, dizendo que, por ora, tinha como resolvê-lo. As questões de fundo que são as verdadeiras causas de tudo isto foram, mais uma vez, para debaixo do tapete da política e da história.


Os últimos incidentes referentes à luta entre policiais-militares e o tráfico, ocorridos na cidade do Rio de Janeiro ganharam espaço nas grandes mídias do Brasil e de inúmeros países do chamado Primeiro Mundo. Como se sabe, o Brasil não está em guerra interna ou externa. Por aqui, não há motivo aparente, no atual contexto, para espetáculos de ações diretas, registrados e reproduzidos fartamente pelas mídias. É estranho que um helicóptero tripulado por soldados da PM tenha sido abatido em pleno vôo, com duas mortes e dois feridos. A tragédia não foi maior porque foi possível o pouso forçado da aeronave em chamas, em campo aberto. As imagens de sua completa destruição física parecem cenas da Guerra do Iraque, da Colômbia ou do Afeganistão. Mas, não são. Tudo ocorreu em um outrora pacato bairro da Zona Norte – Vila Isabel. Este é ocupado por parcelas das classes médias da cidade, que são vizinhos de muitas comunidades faveladas e foi um dos berços do samba moderno brasileiro. Jamais isto tinha ocorrido antes. Parece, que existiram tentativas, mas esta foi a primeira vez que se conseguiu concretizar a façanha. Acendeu-se uma lâmpada de alerta. O Rio de Janeiro é uma cidade conflagrada.

Talvez, se isto tivesse acontecido antes de sua escolha para sediar as Olimpíadas de 2016, o resultado tivesse sido outro ou a vitória bem mais difícil. A política de segurança adotada por sucessivos governos da cidade e do Estado comete equívocos e dialoga com público, através das mídias, de modo ainda mais equivocado. Ao não aceitar ajuda federal, o atual governador situou o problema na esfera local, dizendo que, por ora, tinha como resolvê-lo. As questões de fundo que são as verdadeiras causas de tudo isto foram, mais uma vez, para debaixo do tapete da política e da história. Os problemas sócio-urbanos do Rio de Janeiro são muito graves e se arrastam desde o fim da escravidão, ou mesmo de antes. Tem-se uma cidade dividida entre uma parcela mais rica que mora no ‘asfalto’ e cerca de 600 ou mais comunidades faveladas construídas, em sua maioria, em morros, muitos deles de difícil acesso. Estas comunidades são, de há muito, usadas pelo crime como local de recrutamento e homiziamento.

Obviamente, que nada disto é exclusivo à esta cidade, mas nela, esta situação ganha características especiais.Mais do que um, em cada três cariocas, mora em uma das favelas da cidade. Diferentemente de outras, a geografia do Rio levou e continua levando os excluídos e os imigrantes para os morros e algumas regiões planas de baixo interesse imobiliário. Estas são, por vezes, distantes e periféricas. A origem destas comunidades remonta à época da escravidão. Nesta, negros fugidos – quilombolas – ou abandonados pelos seus senhores usavam os morros para morar e muitas vezes plantar e criar animais. Quando do fim da Guerra de Canudos (1897), o Morro da Favela, nas proximidades da Central do Brasil, abrigou muitos retirantes do conflito, que vieram para a velha capital. Daí, a origem e a popularização do nome. No local, ainda existe uma impressionante favela, que parece debruçada sobre uma pedreira – o Morro da Providência – que é um dos locais de conflito na cidade. Sua antiguidade e pobreza testemunham anos e anos de descaso público.Estas comunidades cresceram todas as vezes que houve ciclos de prosperidade no país.

Parece paradoxal, mas o que ocorria e ainda ocorre é que imigrantes, vindos para trabalhar na construção civil e outras atividades urbanas, não tinham como morar nos prédios que levantavam e nos bairros onde trabalhavam. A opção era a de construir barracos, se possível, no morro mais próximo de onde labutavam. Hoje, quase não existem mais barracos. A madeira ficou cara. O tijolo e o cimento são abundantes e relativamente mais baratos do que no passado. As habitações são, quase sempre, construídas em tijolos. Como nem sempre há dinheiro para o reboco externo, muitas favelas, vistas de longe, parecem jogos infantis avermelhados e amontoados.

A alvenaria externa é mais facilmente encontrável nas favelas mais antigas e nas mais “ricas”, onde se concentram trabalhadores empregados com carteira assinada ou biscateiros bem-sucedidos. É lógico, que numa mesma favela é possível encontrar as duas situações, bem como se podem ver ainda barracos, agora, construídos com resto do lixo urbano. O mundo favelado é altamente complexo e não cabe neste pequeno artigo. Nele existe uma estrutura social com imensas diferenças internas. A maioria dos seus habitantes são trabalhadores ou desempregados. Um pequeno percentual dedica-se às atividades criminosas. O preconceito do “asfalto” é antigo, até porque grande parte dos seus moradores e negra, quase negra, de origem nordestina, mineira e vindos de outros bolsões da miséria brasileira.

Para as classes médias mais reacionárias, favela é lugar de marginal, de gente que não presta. Esta mesma gente não tem qualquer cerimônia em explorar o trabalho dos que lá vivem.Entre os governos de Carlos Lacerda e de Chagas Freitas prevaleceu a idéia de que a solução para a questão favelada era a remoção para conjuntos habitacionais construídos pelo governo na periferia do Rio de Janeiro. Pouco a pouco, a proposta de remover perdeu terreno pela a da urbanizar. Aliás, o atual prefeito levantou a mesma questão da remoção, sem nada ainda ter feito de concreto nesta direção. Também, junto com o atual governador do Estado foi feita a polêmica proposta de algumas favelas serem ‘separadas’ por muros do resto da cidade. Os atuais PACs têm projetos engajados em algumas obras de urbanização básica dos mesmos locais.Os casos de remoção conhecidos nada mudaram para os favelados, liberando terrenos valiosos para a especulação. Os mesmo problemas que existiam na origem foram remontados nos conjuntos habitacionais, rapidamente favelizados.

Os projetos municipais urbanizadores, tal como o chamado Favela-Bairro, mudaram muito pouco a realidade destas comunidades. A questão central é que em nenhum destes projetos desenvolvidos ou propostos até hoje houve a preocupação com a distribuição de renda entre os habitantes. O problema do desemprego continuou a ser gravíssimo, afetando, com muita força, os jovens. Existem milhares e milhares de jovens favelados sem emprego, escolas decentes, comida em casa, saneamento básico, tratamento médico necessário. Os que conseguem trabalho ganham mal e não raro não têm seus direitos respeitados. Neste quadro, fica fácil ao tráfico e a outras atividades criminosas fazer o recrutamento constante. A cada preso ou morto há uma fila de substitutos, de gente capaz e disposta a arriscar a vida para alguns momentos fugidios de glória e de ascensão.

A política de matar, torturar e prender em massa nada muda. Ao contrário, cria heróis e mártires, estimulando novas adesões. Por isto, é difícil crer que se deseje, de fato, acabar com o problema. De todas as favelas cariocas, em torno de dezoito, teriam bolsões mais nítidos do tráfico. O Rio não é Mendellin, na Colômbia. Por aqui, não existem cartéis e nem máfias muito organizadas. A droga vendida no Rio, como se sabe, ou vem do Nordeste (maconha), do Paraguai, da Bolívia, da Colômbia e do Peru. Logo, ela atravessa, certamente por terra, alguns milhares de quilômetros, até estar disponível em um ponto de revenda local. Como passa desapercebida, é um ‘mistério’ a resolver.

Parte destes carregamentos sai do Rio para a Europa e EUA. Logo, a cidade é também um entreposto. Em parte das favelas, onde não existe tráfico ou ele foi banido, funcionam as famosas milícias – nova versão do crime social local, com a clara participação de pessoas de algum modo ligadas às forças repressivas. Quase em todas comunidades existem pequenos grupos de pessoas que se dedicam a vários tipos de atividades criminosas. É difícil que o número de criminosos em uma favela seja superior a um por cento de seus moradores.

O número de desempregados ou de subempregados pode chegar a mais da metade do conjunto da comunidade.Os grupos de traficantes mais comuns são pequenos bandos de, em torno, vinte pessoas, desarticulados e por vezes inimigos entre si que adotam siglas de organizações que só existem atualmente no universo nebuloso das mídias, sem muito respaldo no real. No Rio, felizmente, não há nada como o PCC paulista. É verdade, que uns atiram nos outros e/ou tentam tomar o território dos rivais. O capo, normalmente é alguém mais velho, com várias passagens policiais e com ligações com o crime mais ou menos organizado existente dentro dos presídios. Os soldados do tráfico são jovens, por vezes bem jovens, que têm uma esperança de vida média de dois anos nesta atividade para lá de perigosa. As armas de guerra que conseguem por efeito da corrupção e do dinheiro acumulado pela venda de drogas, são as mais usadas nas lutas entre as facções. Muitas delas foram produzidas nos EUA, na Inglaterra, em Israel e em países do Leste europeu. Outras, sobretudo munições, se originam também em aquisições feitas no contrabando e as que são oficialmente compradas pelas forças armadas e policiais brasileiras. Sabe-se, que com dinheiro e contatos, não é difícil comprar um fuzil-metralhadora moderno, bem como a munição necessária.

O problema está em se imaginar como circulam estes artefatos no mundo contemporâneo. Certamente, há muitos interesses em jogo. O episódio do helicóptero chama a atenção, porque jamais algo similar havia acontecido. Normalmente, os traficantes atiram na polícia somente quando estão encurralados, que é o que deve ter acontecido. Eles preferem guardar suas balas para seus iguais e para garantir seus reinados nas comunidades onde atuam. Eles evitam um confronto maior com as polícias, porque sabem que serão, no passo seguinte, perseguidos até o destino final.

A atual política de ocupações policiais permanentes de algumas favelas, três até o momento, funciona bem nos locais tomados pela polícia. Mas, tem como efeito colateral estimular os bandos a buscar a quem invadir outras criando guerras, como a que se viu no Morro dos Macacos em Vila Isabel. Trata-se de uma situação complexa que precisa ser analisada a fundo e que sejam tomadas medidas que tenham efetivo poder de desmontar as bombas relógio sociais da atual fase da modernidade.

Uma política de emprego, de divisão de renda, de escolarização real e não formal para todos, de respeito aos direitos humanos e, sobretudo, o exemplo de honestidade pública do poder poderiam fazer a diferença. A exclusão semeia a violência e o caos, levando à uma realidade sem saída.

Fonte: http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=16197&boletim_id=604&componente_id=10148

sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Desocupação no Capão Redondo: violência do estado contra a população trabalhadora

A desocupação no Capão Redondo no início da semana foi uma demonstração clara de que quando se trata da população pobre o Estado age com enorme brutalidade.
A operação brutal que despejou cerca de 800 famílias de suas casas na capital paulista, no início da semana, contou com quase 250 policiais militares. Apesar das tentativas de negociação dos moradores, os policiais garantiram a derrubada dos barracos sem que os moradores conseguissem sequer retirar todos os seus pertences e atiraram balas de borracha e bombas de gás lacrimogêneo contra a população que procurava apenas defender sua própria casa.
O terreno, abandonado há 20 anos e ocupado desde 2007 por mais de duas mil pessoas, pertencia à Viação Campo Limpo, que pediu na Justiça a reintegração de posse. Muitos moradores perderam tudo o que tinham e foram obrigados a dormir ao relento, pois sequer tinham para onde ir. Grande parte ainda continua o local, por não ter outro destino.
Deve chamar a atenção de todos a firmeza do Estado, os juízes, o governo e a polícia, quando se trata da defesa dos interesses de grandes capitalistas, não importando por cima de quem tenham que passar, e nem como.
Sequer hesitaram em desalojar duas mil pessoas, 800 famílias, com mulheres, idosos e crianças, trabalhadores, que não tinham para onde ir. Uma única decisão retirou da noite para o dia tudo que essas pessoas possuíam, em nome de uma suposta “lei” (pois a lei só é cumprida quando serve a determinados interesses). Não foi pensado para onde os moradores poderiam ser transferidos, nem sequer onde poderiam permanecer alojados após a desocupação. Apenas fez-se cumprir a "lei”. Mas que tipo de lei é essa que em nome do interesse de uma única pessoa, destrói a vida de duas mil?
É certamente uma lei que não atende às necessidades da população, daí também o seu caráter desumano, uma vez que beneficia um em detrimento de outros dois mil, sendo que o que está em jogo para os últimos com a desocupação do terreno, ao contrário do proprietário legal, é sua própria sobrevivência, de forma imediata.
A população deve resistir, como o fez em Capão Redondo, contra as investidas da polícia, que age a serviço dos grandes capitalistas e banqueiros e compreender que apenas um governo próprio dos trabalhadores pode atender seus interesses.
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