domingo, 2 de fevereiro de 2020

O SER HUMANO E SEUS DIREITOS


Toda pessoa humana tem direitos. Isso acontece em qualquer parte do mundo. Em grande número de países há pessoas que têm mais direitos do que as outras. Existem diferenças também quanto ao respeito pelos direitos, pois enquanto em certos países os direitos fundamentais da pessoa humana são muito respeitados em outros quase não há respeito.
Por que existem esses direitos? Porque todas as pessoas têm algumas necessidades fundamentais que precisam ser atendidas para que elas possam sobreviver e para que mantenham sua dignidade. Cada pessoa deve ter a possibilidade de exigir que a sociedade e todas as demais pessoas respeitem sua dignidade e garantam os meios de atendimento daquelas necessidades básicas.
Além disso as pessoas humanas são todas iguais por natureza e todas valem a mesma coisa, mas cada uma tem suas preferências, suas particularidades e seu modo próprio de apreciar os acontecimentos. Por causa destas diferenças as pessoas nem sempre estão de acordo e é preciso que existam regras regulando os comportamentos, estabelecendo o que cada um deve ou não deve fazer, o que é permitido e o que é proibido.
O fato de haver divergências e conflitos não é mau, ao contrário disso, onde as pessoas são livres é natural que não concordem em tudo e é bom que possam manifestar suas discordâncias. É desse modo que cada um se sente completo como pessoa e dá sua contribuição para o aperfeiçoamento da vida em sociedade. Não se pode, entretanto, dispensar a existência de regras de convivência, não para sufocar as pessoas e impedir que se manifestem as divergências, mas para regular as manifestações e dar a elas um sentido positivo.
Mas como todos os seres humanos valem a mesma coisa não é justo que só alguns estabeleçam as regras e os outros só fiquem com a obrigação de obedecer. Essas regras é que constituem o direito. E para que o direito seja legítimo e justo é preciso que todas as pessoas do povo possam dar sua opinião no momento em que as regras são escolhidas. E preciso também que todas as pessoas do povo, mesmo aquelas que estão no governo, ou que são poderosas, sejam obrigadas a obedecer e a respeitar o direito. Mas se o direito é necessário e se ele estabelece regras justas para a vida social como se explica a existência de injustiças apoiadas pelo direito? E se o direito é útil ou necessário para os seres humanos como se explica que os direitos não sejam respeitados por todos?
Quando existe um direito injusto é sinal de que o povo não foi ouvido ou de que algumas pessoas usaram a força econômica, militar ou política para impor a todos os outros o direito injusto. Nesse caso o que existe é um direito ilegítimo. É preciso, então, que muitas pessoas denunciem as injustiças e façam pressão para que as regras ilegítimas sejam substituídas por outras aprovadas pelo povo.
Como é evidente, as pessoas e os grupos mais poderosos procuram sempre impor sua vontade, para que o direito atenda antes de tudo aos seus interesses. Isso acontece com mais facilidade onde a maior parte das pessoas não procura saber o que o Legislativo (deputados e senadores, vereadores) o Executivo (presidente, governador e prefeito) estão fazendo e não tem interesse por assuntos políticos. O desinteresse da maioria do povo deixa sem controle e sem fiscalização os que tomam as decisões políticas. E desse modo elas ficam à vontade para decidir a favor dos poderosos, desprezando as necessidades e a vontade do povo. Assim é que se explica a existência de leis, decretos e atos administrativos contrários ao interesse público.
Por aí se percebe também que não basta votar para ter a garantia de uma ordem justa, sendo indispensável procurar conhecer bem o candidato para o qual se vai dar o voto e depois disso acompanhar a vida das instituições políticas. Com essa participação permanente do povo e das organizações de base, como associações, comunidades e sindicatos e movimentos sociais (MST, MTST), será mais fácil impedir que sejam desrespeitados os direitos fundamentais das pessoas humanas.
O que desde logo deve ficar claro é que existem certos direitos que nem as leis nem as autoridades públicas podem contrariar. Esses direitos estão quase todos na Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Organização das Nações Unidas (ONU) em 1948.
DIREITO DE SER PESSOA
Para que um ser humano tenha direitos e para que possa exercer esses direitos, é indispensável que seja reconhecido e tratado como pessoa. Isso deve acontecer com todos os seres humanos. Reconhecer e tratar alguém como pessoa é respeitar sua vida, mas exige que também seja respeitada a dignidade, própria de todos os seres humanos. Nenhuma pessoa deve ser escrava de outra, nenhum homem deve ser humilhado ou agredido por outro, ninguém deve ser obrigado a viver em situação de que se envergonhe perante os demais, ou que os outros considerem indigna ou imoral.
Antes de tudo, como exigência para viver com dignidade, a toda pessoa humana deve ser garantido o direito de ter um nome e de ser conhecida e respeitada por esse nome. O nome identifica a pessoa e faz parte de sua personalidade. Por esses motivos o direito ao nome está contido no direito de ser pessoa.
Todo ser humano tem o direito de não ser agredido ou ferido por outro. Esse é o direito à integridade física. Em qualquer situação, mesmo que esteja preso por ter cometido um crime, o ser humano deve ter respeitada a integridade de seu corpo. Assim como não deve ser tolerado que uma pessoa agrida outra, por qualquer motivo, quando as duas estão livres e podem defender-se, com mais razão não se pode admitir que um policial pratique violência física contra um preso, que não tem como se defender.
Quando se fala em respeito à integridade física de uma pessoa, a primeira ideia que se tem é de que não deve ser tolerada a violência direta e intencional. Mas é preciso ter em conta que há muitas situações em que uma pessoa pode causar prejuízo físico a outra, sem que a agressão cause a revolta de outras pessoas e mesmo sem que muitos percebam que está havendo uma violência.
Aqui também é preciso lembrar as condições de vida e de trabalho. Muitas vezes uma pessoa é obrigada a viver ou trabalhar em condições que acarretam grande prejuízo físico, ou porque a falta de alimentos ou de cuidados de higiene e saúde causam doenças e o enfraquecimento físico, ou porque a falta de segurança sujeita a pessoa a sofrer acidentes e a perder sua capacidade física. Em todas essas situações, não está sendo respeitado o direito à integridade física das pessoas.
Igualmente grave é o sofrimento psíquico ou moral imposto a uma pessoa. Nesses casos, geralmente, poucos percebem que está havendo uma violência e que não se está respeitando a dignidade humana, mas os efeitos da agressão podem ser até mais graves do que aqueles provocados por uma violência física.
Considere-se, por exemplo, a situação de uma criança que é repreendida ou castigada com muito rigor ou injustamente, ou que é ridicularizada perante outras crianças ou na frente de adultos. Mais do que o sofrimento físico, ou independente dele, essa criança sentirá um grande sofrimento espiritual, que poderá durar muito tempo e até pela vida inteira.
Esse mesmo sofrimento psicológico e moral será imposto ao empregado que for tratado de modo grosseiro e desrespeitoso por seu empregador ou por seus superiores. O relacionamento respeitoso deverá ser observado entre professores e alunos, bem como entre qualquer pessoa que presta um serviço e os que recebem o serviço, pois a vítima do desrespeito estará sofrendo uma agressão moral e psicológica.
As agressões dessa espécie são mais comuns nas situações em que alguém ou tem uma posição de autoridade pública ou pode exigir a obediência de outros. O abuso da autoridade, a atitude arrogante de quem manda, a imposição de humilhação aos subordinados, tudo isso caracteriza agressão psicológica ou moral e, portanto, desrespeito ao direito de ser pessoa. Esse mesmo desrespeito está presente em todas as situações sociais em que alguém é obrigado a ficar em posição humilhante ou de inferioridade moral perante outras pessoas. Isso acontece, por exemplo, quando uma pessoa é forçada a viver em tal estado de pobreza que precisa mendigar para obter alimentos e outros bens essenciais para a sobrevivência ou a vida em sociedade.
A mesma coisa se verifica quando pessoas e famílias são obrigadas, por sua pobreza, a morar em favelas ou cortiços, a se vestir com roupas esfarrapadas e a revelar, em cada situação, que são muito mais pobres do que as outras. As pessoas que sofrem essa forma de agressão podem não demonstrar revolta, mas seu sofrimento psicológico e moral existe. Elas sabem que são tratadas como inferiores e sofrem com isso.
Outras formas de ofensa ao direito de ser pessoa são os preconceitos e as discriminações sociais. Essa ofensa ocorre quando alguém é tratado como inferior ou não é admitido em algum lugar por causa de sua raça, sua cor, suas crenças, suas ideias ou sua condição social.
No Brasil, atualmente, há uma ofensa ao direito de ser pessoa que vem sendo praticada em muitos lugares, todos os dias, como se fosse coisa normal. Essa ofensa está no fato de que todas as pessoas são tratadas como suspeitas, como desonestas, como possíveis criminosas, sempre que vão fazer algumas compras e querem pagar com cheque. O comprador é obrigado a exibir documentos de identidade e a provar que não está pretendendo enganar e prejudicar o vendedor. Essa mesma prova é exigida em muitas repartições públicas, em bancos e em grandes empresas. Todos são tratados como suspeitos até que provem o contrário.
Esse procedimento é consequência do fato de que o Brasil teve vários governos militares, que viam em cada brasileiro um provável inimigo. Mas é uma grave ofensa ao direito de ser pessoa.
Não existe respeito à pessoa humana e ao direito de ser pessoa se não for respeitada, em todos os momentos, em todos os lugares e em todas as situações a integridade física, psíquica e moral da pessoa. E não há qualquer justificativa para que umas pessoas sejam mais respeitadas do que outras.
Fonte: Viver em Sociedade - Dalmo de Abreu Dallari. 

Atividades:
1 - Por que existem direitos humanos?
2 – Por que é preciso que existam regras regulando os comportamentos das pessoas em uma sociedade?
3 – Por que o autor diz que “o fato de haver divergências e conflitos não é ruim” na nossa sociedade?
4 – O que é preciso para que o direito, consequentemente suas regras, seja legítimo e justo?
5 – Pode existir um direito injusto? Como isso pode ocorrer, na visão do autor?
6 – O que acontece quando o povo perde o interesse em discutir os direitos e os problemas da política?  
7 - Por que o autor diz que não basta votar para que se tenha a garantia de uma ordem justa e defesa de seus direitos? O que mais devemos fazer para garantir nossos direitos?
8 – O que é o direito de ser pessoa?
9 – O que é o sofrimento psicológico e moral? O que é o sofrimento físico?
10 – Relate alguns tipos de sofrimentos morais /psicológicos e físicos que ocorrem na escola.
11 – Relate outros tipos de sofrimentos que observamos no nosso bairro, cidade e país constantemente.   

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