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Bruxelas,  1º/12: Dezenas de milhares contra "políticas de austeridade". Para  Wallerstein, nova etapa envolverá sindicatos, mas manterá  horizontalidade
Immanuel Wallerstein analisa: primeira fase teve êxito fantástico; diante da surdez do sistema, outra onda está se desenhando
Por Immanuel Wallerstein | Tradução: Daniela Frabasile
Durante os protestos na praça Tahrir em novembro de 2011, Mohamed  Ali, de 20 anos, respondeu a um repórter que lhe perguntou por que  estava ali: “Nós queremos justiça social. Nada mais. É o mínimo que  merecemos”.
A primeira rodada de movimentos tomou múltiplas formas ao redor do  mundo – a chamada Primavera Árabe, os movimentos que se espalharam por  um grande número de países: Oxi, na Grécia, na Grécia; os indignados na  Espanha; os protestos estudantis, no Chile; Occupy nos Estados Unidos e  muitos outros.
Foram um sucesso fantástico. O grau de êxito pode ser medido pelo  artigo extraordinário, escrito pelo ex-secretário do Tesouro dos EUA,  Lawrence Summers no Financial Times em 21 de novembro, com o título  “Desigualdade não pode mais ser mantida à distância com as ideias de  costume”. Esse nunca foi um tema usual dos artigos de Lawrence Summers.
No texto, ele faz duas afirmações notáveis, considerando que foi um  dos arquitetos da política econômica mundial dos últimos vinte anos, que  nos colocou na crise em que o mundo se encontra hoje. A primeira é que  houve mudanças fundamentais nas estruturas econômicas do mundo. Summers  diz que “a mais importante é o forte crescimento nos ganhos de mercado  para uma pequena minoria de cidadãos, em relação ao que pode ganhar a  maioria dos cidadãos.”
A segunda afirmação diz respeito a dois tipos de reações do público a  essa realidade: a dos manifestantes e a de quem é firmemente contra  eles. Summers se diz contrário à “polarização” – que, segundo ele, os  manifestantes estão tentando promover. Mas em seguida, acrescenta: “ao  mesmo tempo, estão ainda mais errados aqueles que rapidamente rotulam  como deslocada, ou produto da luta de classes, qualquer expressão de  crítica à crescente desigualdade”.
O que o artigo de Summers indica não é que ele tenha se tornado um  expoente da mudança social radical – longe disso – mas que está  preocupado com o impacto político dos movimentos de justiça social ao  redor do mundo, especialmente no que ele chama de mundo industrializado.  Eu chamo isso de sucesso dos movimentos globais de justiça social.
A resposta a esse sucesso tem sido algumas pequenas concessões em  alguns lugares mas, ao mesmo tempo, um crescimento de repressão. Nos  Estados Unidos e no Canadá, tem havido um desalojamento sistemático das  “ocupações”. A quase simultaneidade das ações políticas parece indicar  algum nível de coordenação. No Egito, o exército tem resistido a  qualquer diminuição de seu poder. Políticas de austeridade foram  impostas a Grécia e Itália pela Alemanha e França.
A história, no entanto, está longe de seu final. Os movimentos estão  desenvolvendo sua segunda onda. Os manifestantes que reocuparam a praça  Tahrir e estão tratando o marechal Tantawi, chefe da junta militar  provisória egípcia, com o mesmo desprezo que trataram Hosni Mubarak. Em  Portugal, uma greve geral de um dia paralisou todo o sistema de  transportes. Um anúncio de greve na Grã-Bretanha, em protesto contra os  cortes reduziu o tráfego no aeroporto de Heathrow em 50%.
Na Grécia, o governo tentou pressionar aposentados pobres impondo um  novo tributo nas contas de eletricidade dessas pessoas e ameaçando corte  de energia caso as contas não fossem pagas. Há resistência organizada.  Eletricistas locais estão ligando novamente a energia, contando com a  inabilidade das reduzidas equipes municipais do governo em aplicar a  lei. É uma tática que tem sido usada com sucesso no subúrbio de Soweto,  em Johannesburgo, há uma década.
Nos Estados Unidos e no Canadá, o movimento de ocupação se espalhou  dos centros das cidades para os câmpus universitários. E os “ocupantes”  estão discutindo locais alternativos para ocupar, durante os meses de  inverno. A rebelião estudantil no Chile espalhou-se para as escolas  secundárias.
Duas coisas devem ser notadas na presente situação. A primeira é que  os sindicatos – como parte e resultado – tornaram-se bem mais  militantes, e muito mais abertos à ideia de que devem ser participantes  ativos no movimento de justiça social ao redor do mundo. Isso é verdade  no Mundo Árabe, na Europa, na América do Norte, no sul da África e até  na China.
A segunda coisa a notar é o grau em que os movimentos são capazes de  manter, em toda a parte, a ênfase em uma estratégia horizontal. Eles não  são estruturas burocráticas, mas coalizões de vários grupos,  organizações, setores da população. Eles ainda se esforçam para debater  continuamente suas táticas e prioridades, e resistem a se tornar  excludentes. Isso é sempre fácil? É claro que não. Isso funciona melhor  que reconstruir um novo movimento vertical, com clara liderança e  disciplina coletiva? Até agora tem, de fato funcionado melhor.
Temos que pensar na luta mundial como uma longa corrida, na qual os  corredores precisam usar toda a sua energia com sabedoria, a fim de não  se esgotarem, ao mesmo tempo em que mantêm o foco no objetivo: um tipo  diferente de sistema-mundo, muito mais democrático, muito mais  igualitário que qualquer coisa que temos agora.
Fonte: http://www.outraspalavras.net 
 
 
 
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