Vacilante, a democracia faz triste figura e tende a naufragar, contra o pano        de fundo de um bipartidarismo institucionalizado a serviço dos        rentistas. Por toda a Europa, todos se dirigem para uma mesma política        de 'austeridade' desejada pelos tecnocratas do Fundo Monetário        Internacional (FMI) e do Banco Central Europeu. 
A demonstração        faz-se não só pelo exemplo grego (não funciona, com        certeza, para a população grega), mas toma-se também a        precaução, quando alguém se preocupa com        eleições, de entronizar os mesmos políticos, seja o eleito        quem for. O povo já nada escolhe. A política econômica        está prefixada pelos financistas, como na Irlanda ou em Portugal, desde        a véspera das eleições. A troika (Comissão        Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional)        impõe suas políticas. Ao candidato vencedor nas urnas só        cabe aplicá-las, enganando o eleitor sobre alguma inexistente        diferença entre os partidos, em matéria de economia.        
Na Espanha, Mariano Rajoy, herdeiro de Aznar, não se atreveu a divulgar        as futuras medidas de austeridade que o prejudicariam durante a campanha        eleitoral. Nem acabou de ser eleito e já está sendo pressionado        para revelar os membros de seu governo, antes até de tomar posse         [1]        ; e não faz outra coisa além de reunir-se com os grandes        banqueiros espanhóis – Isidro Fainé da Caixa, Francisco        González do segundo banco espanhol, o BBVA, e Rodrigo de Rato,        presidente do Bankia e ex-diretor geral do FMI... Os grandes bancos credores da        dívida espanhola comandam as rédeas, Mariano Rajoy gesticula.        
Ou se trata de uma ditadura que se vai impondo, como na Grécia, ou a        extrema direita fascista (partido Laos) imiscui-se no poder, sem mandato        recebido das urnas. Por toda parte, assiste-se a evicção dos        responsáveis políticos, os quais, em vez de serem julgados por        suas políticas antissociais, as quais jamais mencionaram nos programas        eleitorais, são salvos da vingança do povo, apesar do imundo        trabalho que fizeram. 
Aconteceu com Berlusconi, que achou escapatória        segura, apesar de muitos, com certeza, preferirem vê-lo atrás das        grades pelo muito que fez sofrer o povo, condenado também a reembolsar        todo o dinheiro que desviou e roubou do contribuinte italiano.        
          Banco Central Europeu, Itália, Grécia, a dança das         cadeiras dos 'ex' Goldman Sachs                
Um paladino da privatização, à testa do Banco Central         Europeu                 
Custe e o que custar, ainda que custe sacrifícios humanos inauditos, a        ideologia capitalista ávida de lucros reforça sua        dominação em toda a Europa. Durante o mês de novembro de        2011, muitos responsáveis pela débâcle financeira europeia        foram empossados, mesmo sem terem sido eleitos. Mario Draghi acaba de ser        nomeado para o Banco Central Europeu; Lucas Papadémos caiu de paraquedas        na chefia do Estado grego; e Mario Monti substitui formalmente um Berlusconi        já excessivamente impopular para dirigir a Itália. Nenhum desses        personagens jamais recebeu um voto, nenhum tem qualquer programa que se tenha        comprometido a cumprir, nada de campanha eleitoral que permitisse qualquer        discussão ou debate. Mas sobre cada um desses pesa uma parte da        responsabilidade pela crise que agora se apresentam para resolver, desde quando        viviam sob a atmosfera sulfurosa do conglomerado bancário Goldman Sachs,        norte-americano, rei de burlas astronômicas. Mario Draghi, quando        vice-presidente para a Europa (de Goldman Sachs Internationale); Lucas        Papadémos, quando presidente do Banco Central da Grécia; e Mario        Monti, quando conselheiro internacional de Goldman Sachs; os três        provocaram, em diferentes graus, a crise europeia, ajudando a falsificar as        contas da dívida grega e especulando sobre a dívida (falsificada)         [2]        . Carregam pesadas responsabilidades na criação da crise que        cresce hoje em toda a Europa e, por isso, têm de ser demitidos dos cargos        que ocupam e têm de responder por seus crimes perante a Justiça.        
Na Grécia, o falsificador das contas apresenta-se para saneá-las                 
Apesar de ter tentado a todo custo manter-se no poder e adiar as        eleições gerais, motivo pelo qual propôs um referendo        popular, que levou à sua demissão, Georges Papandreou teve de        curvar-se sob pressões que vinham de todos os lados, até de        dentro de seu próprio governo. Não esqueçamos que um        mês apenas depois de Papandreou ter sido eleito em outubro de 2009, Gary        Cohn, número 2 de Goldman Sachs, desembarcou em Atenas, acompanhado de        investidores, entre os quais John Paulson, que reaparecerá no centro do        que ficou conhecido como "o escândalo Abacus"…         [3]        
Favorito do mundo dos negócios, dos banqueiros e parceiros        internacionais, Lucas Papadémos deixa a vice-presidência do Banco        Central Europeu para tornar-se novo primeiro-ministro da Grécia, sem ter        sido eleito. Foi presidente do Banco Central Grego entre 1994 e 2002 e, nesse        cargo, participou da operação de adulteração das        contas perpetrada por Goldman Sachs. A observar que o gestor da dívida        grega é um tal Petros Christodoulos, ex-corretor de Goldman Sachs.        
Já não cabe duvidar de que a Grécia deixou de ser        nação soberana: seguindo as missões regulares da Troika        (BCE, CE, FMI) que visitam os ministérios na capital, haverá        agora uma missão permanente, domiciliada em Atenas, para implantar,        controlar e supervisionar a política econômica do país. O        governo que se comporte! Para bem firmar o cabresto, a Troika prevê um        novo plano de endividamento, uma vez que o primeiro memorando (cerca de 110 mil        milhões de euros, em maio de 2010), anticonstitucional, pois não        foi aprovado pelo Parlamento, não foi totalmente pago. As garras da        dívida ferram-se inexoravelmente à carne do povo grego.        
Na Itália, depois de uma década de decadência da         democracia, o conselheiro da Coca Cola aplica o golpe de misericórdia                 
Com quase nove anos na presidência do Conselho, o império        Berlusconi, terceira fortuna da Itália         [4]        , marcou profundamente a vida política. Seu reinado marca a        decadência e a agonia de uma democracia que morre sufocada. Tornado        motivo de zombaria da imprensa internacional por seus casos, soterrado sob        histórias infindáveis de corrupção e com a        popularidade em queda livres, Berlusconi renuncia à presidência do        Conselho, dia 12 de novembro de 2011, para não convocar        eleições antecipadas. Dia seguinte, o presidente italiano Giorgio        Napolitano nomeia o ex-comissário europeu Mario Monti para que assuma        imediatamente. Poucos dias antes, dia 9/11, Napolitano já nomeara Monti        senador vitalício. Monti obtém larga maioria na Câmara de        Deputados no dia 18/11 (556 votos a 61, de 617 votantes). Sem se intimidar ante        o acúmulo de funções, já primeiro-ministro, se        autonomeia também ministro da Economia. Mario Monti não tem        qualquer legitimidade para impor qualquer política de 'austeridade' aos        italianos. Houve um putsch!        
Conselheiro para negócios internacionais de Goldman Sachs desde 2005        (na qualidade de membro do Research Advisory Council do Goldman Sachs Global        Market Institute), Mario Monti foi nomeado comissário europeu para o        mercado interno em 1995, depois comissário europeu para a        Concorrência em Bruxelas (1999-2004). É presidente da Universidade        Bocconi em Milan, membro do comitê diretor do poderoso Clube Bilderberg,        do think tank neoliberal Bruegel fundado em 2005, do præsidium Amigos da        Europa, outro influente think tank com sede em Bruxelas... e conselheiro da        Coca Cola. Em maio de 2010, chegou à presidência do departamento        Europa, da Trilateral, um dos mais poderosos cenáculos da elite        oligárquica internacional.        
Como escreveu Giulietto Chiesa no jornal de esquerda                  Il Fatto Quotidiano                         [5]        , veio para "reeducar" os italianos na religião da        dívida. Em seu governo, fez-se cercar de banqueiros e seu ministro de        Assuntos Estrangeiros, Giulio Terzi di Sant'agata, foi conselheiro        político da OTAN, antes de ser embaixador em Washington. Não        bastasse, um novo superministério encarregado do desenvolvimento        econômico, da infraestrutura e dos transportes foi entregue a Corrado        Passera, PDG do banco Intesa Sanpaolo.        
Por todos os lados, os interesses privados da oligarquia financeira        ultraconservadora e amiga de Washington estão postos acima e antes dos        interesses das populações. Esses governos fantoches obedecem aos        diktats da finança, forçando os cidadãos a pagar uma        dívida injusta pela qual não são responsáveis e que        jamais lhes valeu qualquer benefício. A salvação só        poderá vir de baixo. Façamos nossa a palavra de ordem dos gregos:        "Não devemos, não vendemos, não pagaremos!"         [6] 
1/Dezembro/2011        
                                             Notas                  |1| Deve assumir dia 20 de dezembro. Como é uso no reino, o rei deverá ser o primeiro a ser informado sobre o governo.
|2| Goldman Sachs recebe remuneração do governo grego pelo serviço de aconselhamento bancário, ao mesmo tempo em que especula com a dívida do país. O quadro provavelmente é o mesmo, com o banco comercial JP Morgan, que auxilia a Itália a otimizar as contas (Marc Roche, Banque, Comment Goldman Sachs dirige le monde, Albin Michel, 2010, p.19).
|3| Ibid, p.23.
|4| 118ª no mundo, a fortuna da família Berlusconi chega a US$7,8 mil milhões ( Forbes, www.forbes.com/wealth/... ).
|5| Giulietto Chiesa, "E' il governo Napolitano-Monti-Goldman Sachs", 12/11/2011, Il Fatto Cotidiano. Versão francesa, Courrier International, 14/11/2011, "Super Mario, l'homme qui roule pour la BCE", www.courrierinternational.com/... .
|6| Appel Sol – Praça Syntagma, Atenas http://www.cadtm.org/Appel-Sol-Syntagma
O original encontra-se em http://www.cadtm.org/Coup-d-Etat-contre-la-democratie
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
 
 
 
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