Por Jorge Américo,
| Seguranças privados agridem indígenas e apoiadores  para garantir invasão de construtora em terra de  ocupação tradicional - Foto: ABr | 
O  campo de atuação das empresas de segurança privada não está restrito às  cidades. É cada vez mais comum, no meio rural, a presença de grupos  armados contratados por fazendeiros. Em 27 de julho de 2011, foi  realizado em Curitiba (PR) o Tribunal de Júri que puniu pela primeira  vez um caso de milícia privada no campo.
Os  jurados consideraram Jair Firmino Borracha culpado pelo assassinato do  agricultor Eduardo Anghinoni, irmão de uma das principais lideranças do  Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) no Paraná. O réu foi  condenado a 15 anos de prisão. O crime ocorreu em 1999, no município de  Querência do Norte (PR). As provas e os depoimentos apresentados no  julgamento reforçaram a hipótese da existência de uma organização  criminosa que atuava contra militantes de movimentos sociais na região.
Um  caso semelhante permanece sem solução. Após uma ação articulada pela  empresa NF Segurança, o trabalhador rural Valmir Mota de Oliveira, mais  conhecido como Keno, foi morto por um funcionário que prestava serviços  para a transnacional Syngenta. Outros cinco trabalhadores ficaram  gravemente feridos. Ambos participavam do acampamento Terra Livre, em  Santa Tereza do Oeste (PR), área na qual a empresa promovia experimentos  ilegais de sementes de milho transgênico. Embora o crime tenha ocorrido  no final de 2007, o processo se encontra na fase inicial de consulta  das testemunhas.
O advogado da ONG Terra de  Direitos, Fernando Priospe, demonstra preocupação com a atuação de  milícias privadas na região. “Basicamente não houve alteração na  situação no que diz respeito às milícias privadas. Por exemplo, a NF  Segurança continua atuando na região de Cascavel clandestinamente”. A  Syngenta acusa os trabalhadores rurais de serem responsáveis pelo  assassinato de Keno e de um pistoleiro. O Ministério Público do Paraná,  que acatou a denúncia, alega que o fato de ocupar uma propriedade rural  significa assumir o risco de provocar o assassinato das próprias pessoas  que ocuparam a área.
Indígenas, ditadura e escravidão
A  privatização do setor de segurança tem mais implicações negativas do  que se supõe, segundo o presidente do Conselho Estadual da Defesa da  Pessoa Humana de São Paulo (Condepe), Ivan Seixas. “Elas [empresas de  segurança], além dos serviços tradicionais, fazem arapongagem  particular, espionagem eletrônica, industrial, militar, política. Isso  tudo faz com que o Estado brasileiro esteja refém dessa gente”.
Nem  mesmo os povos indígenas escaparam desse aparelho repressivo descrito  por Ivan, que é ex-preso político da ditadura civil-militar (1964-1985).  Em outubro, um grupo de homens armados – contratados por donos de  construtoras – avançaram contra as comunidades instaladas no local  conhecido como Santuário dos Pajés, no Setor Noroeste, em Brasília (DF).  Estavam em disputa 50 hectares de terras tradicionais, onde vivem cerca  de 30 pessoas das etnias tuxá, fulniô, kariri xocó e tupinambá. Na  ação, foram registrados espancamentos, uso de spray de pimenta e arma de  choque elétrico.
A consolidação do setor da  segurança privada nos últimos anos e a exacerbação de seu poder deve-se  muito à presença de militares ainda em atividade ou aposentados. A  conduta repressiva contra cidadãos, de acordo com Ivan, é sintoma do  autoritarismo herdado do período ditatorial. Para ele, “há uma ligação  direta entre ditadura e empresas de segurança porque vários  torturadores, civis e militares, são donos dessas empresas”.
Racismo
O  professor de história e integrante da UNEafro-Brasil Douglas Belchior  vê na escravidão as raízes dos excessos que são cometidos hoje. Para  ele, as empresas de segurança não substituem as forças militares do  Estado, mas atuam de forma complementar. “Os capitães do mato foram a  primeira polícia da história. Eles tinham a função de correr atrás dos  negros rebelados. Essa lógica se repetiu ao longo dos anos e, quando os  policiais migraram para a segurança privada, levaram consigo essas  práticas abomináveis. Daí a razão de os negros serem as principais  vítimas da truculência, ao lado dos camponeses e indígenas.”
Para  Marcelo Braga Edmundo, coordenador da Central de Movimentos Populares e  do Comitê Social da Copa 2014 e dos Jogos Olímpicos, a segurança  privada está tão estruturada que consegue obter vantagens de todos os  lados. Isso se dá ou por meio da repressão ou por meio da extorsão.  “Recentemente, isso aconteceu no Jardim Botânico [no Rio de Janeiro].  Algumas pessoas se recusaram a pagar os seguranças e de repente começou a  ter assaltos na rua, o que claramente se configurou como uma forma de  pressão”. Braga afirma que o processo de coação é parecido.  “Estigmatizam a população mais pobre da zona oeste, dominada pela  milícia, enquanto a classe média que vive nas áreas mais abastadas há  muito tempo aceita a ação delas passivamente, as paga e fica por isso  mesmo”.
Fonte: http://www.brasildefato.com.br/ 
 
 
 
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