por Robert Bibeau [*]
Escândalo fiscal mundial
É sempre surpreendente ver um cidadão espantar-se com um escândalo amplamente ventilado e divulgado nas redes sociais e há muito revelado, apesar de toda a gente julgar estar imunizado contra esses crimes de iniciados. [1]
Em contrapartida, nunca nos admiramos de ver os meios de comunicação, a soldo, fazer troça, "envergonhados por descobrir" os segredos de Polichinelo que os seus patrões-proprietários-multimilionários escondem há decénios. O escândalo da evasão fiscal e dos paraísos "offshore" que o investigador Alain Deneault denunciou em 2010 no seu livro "Offshore. Paradis fiscaux et souveraineté criminelle" [Offshore. Paraísos fiscais e soberania criminosa] passa subitamente a vedeta nos pequenos ecrãs. [2] No Quebec, a emissão televisiva – 24 horas em sessenta minutos – fez-se eco deste escândalo. [3]
Em França, os senhores Arnault, Depardieu, Cahuzac, Augier e outros defensores da liberdade democrática de esconder a sua "massa" ilícita, indignam-se por serem assim denunciados perante as vaias dos enganados. Na Bélgica, a pátria do rei Balduíno, em tempos proprietário pessoal do Congo, o jornal do PTB também identificou alguns vigaristas riquíssimos. [4]
Este súbito despertar de interesse provém das revelações do ICIJ (International Consortium of Investigative Journalists), agrupamento internacional de jornalistas de investigação, que transmitiu a diversos meios de comunicação, entre os quais Le Monde e Radio-Canada , 200 gigabits de dados sobre as contas ou interesses offshore de empresas e de particulares [ http://www.icij.org/ ].
Qual é o efeito da evasão fiscal na economia mundial? As aproximações são numerosas mas todas elas astronómicas e quanto maiores são os negócios que o corsário maneja, mais imponentes são os montantes ocultos. Para o Fundo Monetário Internacional, as somas em questão são calculadas em 5,5 milhões de milhões de euros, ou seja quase o triplo do PIB da França. Segundo o FMI, metade das transacções financeiras mundiais transitam pelos paraísos fiscais, que devem incluir 4 mil bancos e 2 milhões de sociedades de fachada.
A ONG Tax Justice Network afirma que as somas em jogo são ainda mais importantes, atingindo 16 a 25 milhões de milhões de euros, ou seja, o PIB conjunto dos Estados Unidos e do Japão. Isso representaria cerca de um terço das transacções financeiras mundiais. Segundo a TJN, esta soma podia gerar entre 150 e 200 mil milhões de euros de receitas fiscais por ano nas caixas dos estados do mundo inteiro. Em 2012, o economista James Henry, autor de um estudo sobre a economia subterrânea offshore apresentado no site do quotidiano The Guardian , calculou que os 10 bancos monopolistas mais procurados em matéria de gestão do "património privado" – especialistas da fraude fiscal como a Goldman Sachs, o Crédit suíço e o UBS – passaram de 1,8 milhões de milhões de euros em 2005 para 4,8 milhões de milhões em 2010, período que coincide com o vazio da crise económica mais grave depois do colapso de 1929 [Heater Stewart (21.07.2012) 13tn hoard hidden from taxman by global elite. www.guardian.co.uk/business/2012/jul/21/global-elite-tax-offshore-economy ].
James Henry calculou ainda que, se no total uma dezena de milhões de pessoas colocaram os seus haveres nos paraísos fiscais, metade das somas, ou seja, cerca de 8 milhões de milhões de euros, estaria entre as mãos de uns 92 mil super-ricos, ou seja, 0,001% da população mundial; estatísticas corroboradas pelas coligidas sobre a concentração de imensas fortunas familiares [Hunrun (2013) Les 1431 plus grandes fortunes du monde. www.hurun.net/usen/NewsShow.aspx?nid=418 ]. Entretanto, os cidadãos comuns dos países endividados têm que pagar rigorosamente os seus impostos, vítimas das políticas de austeridade dos governos dos ricos em situação de falência. No que se refere à França, o jornalista Antoine Peillon calcula que os valores ocultos no estrangeiro atingem os 600 mil milhões de euros, no seu livro Ces 600 milliards qui manquent à la France (Seuil, 2012) [Fonte : L'Expansion.com, 4/04/2013].
A comissão de inquérito do Senado francês sobre a evasão fiscal avaliou o custo anual que os ricos subtraem ao fisco entre 30 e 60 mil milhões de euros. Mas, para o sindicato Solidaire-Finances Publiques, que apresentou um relatório no início de 2013, a fraude espolia as caixas do estado por volta de 60 a 80 mil milhões de euros por ano [Fonte: L'Expansion.com, 4/04/2013].
Os documentos piratas transmitidos pelo consórcio ICIJ referem-se a 122 mil empresas clandestinas trazidas à luz do dia para um pecúlio oculto calculado entre 20 e 30 milhões de milhões de euros: trata-se em parte de capital-dinheiro arrebanhado nas fábricas e nos comércios, que é misturado com dinheiro sujo do mundo ilegal e que em seguida é reinjectado na economia imperialista. Incidentalmente, outro dia na rádio, um animador paranóico pedia à senhora que estava ao microfone que identificasse o vígaro que havia arranjado o seu lavatório sem facturar – vejam lá, 10 euros escondidos aos impostos… Ah, o mal que nos podem fazer…
Os paraísos dos traficantes de dinheiro
Contam-se entre cinquenta e cem casinos de negócios, situados em países soberanos, à margem da lei e à margem do direito, e que todos os governantes da Terra conhecem melhor do que nós. Alguns desses Estados criminosos têm a classificação triplo AAA das agências de avaliação americanas! [Liste des États voyous du fisc fr.wikipedia.org/wiki/Paradis_fiscal#Liste_grise ].
Campos de golfe perfeitamente mantidos, que o primeiro secretário da ONU, os presidentes do Banco Mundial e da OCDE, assim como a presidente do FMI, evitam cuidadosamente criticar, a não ser para se queixarem, na esperança secreta de que nada será feito que possa prejudicar os seus investimentos. [5]
Os animadores ruidosos nos altifalantes dos meios mediáticos "preponderantes" têm a audácia de baptizar esta evasão fiscal: "Um delito de investimentos". Basta ler: "Efectuam-se no mundo diariamente milhares de milhões de transacções financeiras. Metade delas realiza-se nos paraísos fiscais ao abrigo de quase toda a tributação. A fuga de documentos relativos a esses países e a essas ilhas impermeáveis aos impostos fez ondas em todos os continentes. O governo canadiano exige a lista dos cerca de 450 canadianos tributáveis que terão investido nesses paraísos fiscais (sic). O montante a recuperar atinge milhares de milhões de dólares". [6]
Gostaríamos de acrescentar aquilo a que o investigador Alain Deneaulr chama "as dificuldades do fisco" – impostos e decrescimento – "em marcha para a decadência" – [ www.nousautres.org/aporie-du-fisc-impot-et-decroissance/ ], colocando assim a tónica onde deve ser posta… É a crise económica sistémica que obriga os esbirros do fisco a essas decisões arbitrárias contra os seus patrões que não apreciam minimamente ver assim usurpado o seu anonimato de opacidade "de investidores traficantes" nem ficarem expostos daqui em diante à vingança popular. Felizmente para esses multimilionários, todo este tumulto publicitário se acalmará dentro de meses numa orgia de comissões de investigação, de cimeiras sobre a fiscalidade e sob uma chuva de declarações por parte dos fala-baratos políticos, tão tonitruantes como fúteis e desopilantes. Sarkozy comprometeu-se a isso há dois anos e meio – Fim aos Paraísos, disse – sabemos o que se passa actualmente! E actualmente é a vez de a corte que rodeia François Hollande passar às confissões envergonhadas. [7]
Um especialista entrevistado na TV5 declarou recentemente que nenhum plenipotenciário da África negra deixa de subscrever a sua conta anónima na Suíça… Má língua, diríamos. Seria melhor que o homem se virasse para os políticos europeus, canadianos e americanos (o candidato às presidenciais americanas, M. Romney, não foi apanhado nesses locais mal afamados?). No Canadá, o "muito respeitável" senhor Paul Martin, em tempos primeiro-ministro da federação (2003-2006) era um praticante fervoroso desse tipo de evasão. O marido de Pauline Marois, homem de negócios cripto-federalista, também seria!?... (Os dados publicitados pelo ICIJ identificam 450 capitalistas canadianos, entre os quais uns cinquenta de Quebec [ www.lapresse.ca/... ].
Todos os que rasgam as roupas na praça pública sabiam – sabem – saberão tudo quanto a essas práticas satânicas – muitos deles a isso se dedicam há muito tempo escondendo o conteúdo dos envelopes com dinheiro que receberam na altura da adjudicação dos tentadores contratos públicos. [8]
Onde ir buscar o dinheiro para transferir para os ricos?
Os factos falam por si e constituem prova. Os estados capitalistas em crise económica em todo o mundo ocidental e oriental andam à procura de novas fontes de receitas – de novas entradas de capital-dinheiro para o transferir para os capitalistas. Como era de esperar, viraram-se primeiro contra os contribuintes – os assalariados pagos à semana, os ganha-pouco habituados a saldos – os pobres das sopas populares e os desapossados que foram submetidos à investigação da sua gestapo fiscal para lhes roerem as prestações e lhes roerem o seu poder de compra.
Como tudo isso não chegasse para tapar os défices faraónicos provocados pelos presentes fiscais consentidos à banca, às multinacionais riquíssimas e aos mendigos multimilionários; os fiscalistas e os administradores do Estado burguês, muito bem dispostos, lembraram-se de voltar a tributar os "burgueses-bobos-boémios" satisfeitos – que nunca deixam em paz – obrigados como são, esses capitães da administração, a rebuscar o dinheiro onde ele ainda pode ser surripiado, já que as algibeiras dos pobres e dos operários estão vazias.
Sempre que o Estado dos ricos ataca a pequena burguesia e a média burguesia, deixando os prevaricadores e os seus lacaios políticos, os apparatchiks, esconder-se nos "paraísos", fiquem descansados que uma indiscrição enviará esses fraudulentos para o inferno mediático. De resto, são esses comprometidos que manipulam as contas anónimas dos ricos na Suíça.
Não só não são declarados a mais-valia e os lucros espoliados aos trabalhadores, com medo de serem tributados; se por acaso não é possível subtrair ao olhar do fisco qualquer receita, a taxa de imposto que, no Canadá, se situa entre 31% e 53%, para o cidadão comum, não passa de 19% a 27% para a empresa dos bandidos – evidentemente depois de deduzidas todas as isenções e isso, desde que o monopólio multinacional aceite pagar o que deve, o que nem sempre acontece (Rio-Tinto-Alcan recusa-se há três anos a pagar mil milhões de dólares de dívida). [9]
Um subalterno mediático obsequioso acha que a evasão fiscal e os paraísos "offshore" são incontornáveis e inevitáveis tal como a prostituição, a mafia e os carteiristas. Muito lúcido, ele sabe como conservar o seu emprego. No entanto, este poltrão tem razão: a prevaricação, a exploração e a malandragem são os companheiros da cama do lucro. [10]
Oposição ao fisco e outras formas de arrebanhar massa
Os operários e os empregados são tributados até à morte, pagam impostos depois da morte – até na campa – onde o fisco se serve antes dos herdeiros do cadáver (os ricos beneficiam de toda uma série de escapatórias e isenções). Assim, os truques utilizados pelos operários, pelos empregados, pelos camponeses e pelos artesãos podem variar de uma época para outra, mas o objectivo da manobra mantém-se o mesmo qualquer que seja o sistema económico: reduzir as punções que o Estado efectua nas receitas dos trabalhadores que já estão de tal forma tributados, no trabalho e no mercado, que a reprodução ampliada das classes trabalhadoras está ameaçada. Nos países árabes, por exemplo, em toda a África e na América os jovens trabalhadores já não têm meios financeiros para se casar e ter filhos. Para esses trabalhadores, esconder do fisco as receitas é uma questão de sobrevivência e um dever para com as famílias.
O capitalista, pelo seu lado, confisca a mais-valia – lucros, dividendos, benefícios, juros e rendas – produzida pelos empregados. Acumula assim somas enormes sobre as quais paga poucos impostos e poucas taxas como acabamos de demonstrar. Mais ainda, o capitalista exige dinheiro ao governo para encorajar os investimentos de que será o único beneficiário – benefícios imensos que coloca nos paraísos fiscais a fim de contribuir o menos possível para o ciclo de reprodução ampliado dos trabalhadores que ele abandona à sua desgraça. O trabalhador aldraba o imposto para a sobrevivência da sua família, o capitalista aldraba o imposto para aumentar os seus lucros.
Bem entendido, todo o cidadão honesto, todo o operário empobrecido, todo o trabalhador com dificuldades de crédito, o que foi expulso do seu lar ou da sua casa arrendada, deve indignar-se com esta aldrabice; com este roubo de alto coturno por parte dos que possuem tudo em privado. O trabalhador deve enfurecer-se contra esses malfeitores insolentes e contra os ladrões instalados em cadeiras presidenciais, senatoriais e ministeriais. Mas todos têm que saber que amanhã, dentro de um mês, dentro de um ano, tudo isso se manterá na mesma porque os tubarões da finança, os "banqueiros-gangsters" e o peixe miúdo dos políticos larápios, que hoje são acusados, são também os donos dos advogados, dos procuradores, dos juízes, todos eles coligados. Nada resultará desta miscelânea mediática senão mais inquisição da polícia fiscal contra os trabalhadores e os mal-pagos.
O proletariado chocado não se revoltará ainda desta vez. Esperará pela sua hora e nessa altura ajustará estas contas, e todas as outras, ao mesmo tempo.
É sempre surpreendente ver um cidadão espantar-se com um escândalo amplamente ventilado e divulgado nas redes sociais e há muito revelado, apesar de toda a gente julgar estar imunizado contra esses crimes de iniciados. [1]
Em contrapartida, nunca nos admiramos de ver os meios de comunicação, a soldo, fazer troça, "envergonhados por descobrir" os segredos de Polichinelo que os seus patrões-proprietários-multimilionários escondem há decénios. O escândalo da evasão fiscal e dos paraísos "offshore" que o investigador Alain Deneault denunciou em 2010 no seu livro "Offshore. Paradis fiscaux et souveraineté criminelle" [Offshore. Paraísos fiscais e soberania criminosa] passa subitamente a vedeta nos pequenos ecrãs. [2] No Quebec, a emissão televisiva – 24 horas em sessenta minutos – fez-se eco deste escândalo. [3]
Em França, os senhores Arnault, Depardieu, Cahuzac, Augier e outros defensores da liberdade democrática de esconder a sua "massa" ilícita, indignam-se por serem assim denunciados perante as vaias dos enganados. Na Bélgica, a pátria do rei Balduíno, em tempos proprietário pessoal do Congo, o jornal do PTB também identificou alguns vigaristas riquíssimos. [4]
Este súbito despertar de interesse provém das revelações do ICIJ (International Consortium of Investigative Journalists), agrupamento internacional de jornalistas de investigação, que transmitiu a diversos meios de comunicação, entre os quais Le Monde e Radio-Canada , 200 gigabits de dados sobre as contas ou interesses offshore de empresas e de particulares [ http://www.icij.org/ ].
Qual é o efeito da evasão fiscal na economia mundial? As aproximações são numerosas mas todas elas astronómicas e quanto maiores são os negócios que o corsário maneja, mais imponentes são os montantes ocultos. Para o Fundo Monetário Internacional, as somas em questão são calculadas em 5,5 milhões de milhões de euros, ou seja quase o triplo do PIB da França. Segundo o FMI, metade das transacções financeiras mundiais transitam pelos paraísos fiscais, que devem incluir 4 mil bancos e 2 milhões de sociedades de fachada.
A ONG Tax Justice Network afirma que as somas em jogo são ainda mais importantes, atingindo 16 a 25 milhões de milhões de euros, ou seja, o PIB conjunto dos Estados Unidos e do Japão. Isso representaria cerca de um terço das transacções financeiras mundiais. Segundo a TJN, esta soma podia gerar entre 150 e 200 mil milhões de euros de receitas fiscais por ano nas caixas dos estados do mundo inteiro. Em 2012, o economista James Henry, autor de um estudo sobre a economia subterrânea offshore apresentado no site do quotidiano The Guardian , calculou que os 10 bancos monopolistas mais procurados em matéria de gestão do "património privado" – especialistas da fraude fiscal como a Goldman Sachs, o Crédit suíço e o UBS – passaram de 1,8 milhões de milhões de euros em 2005 para 4,8 milhões de milhões em 2010, período que coincide com o vazio da crise económica mais grave depois do colapso de 1929 [Heater Stewart (21.07.2012) 13tn hoard hidden from taxman by global elite. www.guardian.co.uk/business/2012/jul/21/global-elite-tax-offshore-economy ].
James Henry calculou ainda que, se no total uma dezena de milhões de pessoas colocaram os seus haveres nos paraísos fiscais, metade das somas, ou seja, cerca de 8 milhões de milhões de euros, estaria entre as mãos de uns 92 mil super-ricos, ou seja, 0,001% da população mundial; estatísticas corroboradas pelas coligidas sobre a concentração de imensas fortunas familiares [Hunrun (2013) Les 1431 plus grandes fortunes du monde. www.hurun.net/usen/NewsShow.aspx?nid=418 ]. Entretanto, os cidadãos comuns dos países endividados têm que pagar rigorosamente os seus impostos, vítimas das políticas de austeridade dos governos dos ricos em situação de falência. No que se refere à França, o jornalista Antoine Peillon calcula que os valores ocultos no estrangeiro atingem os 600 mil milhões de euros, no seu livro Ces 600 milliards qui manquent à la France (Seuil, 2012) [Fonte : L'Expansion.com, 4/04/2013].
A comissão de inquérito do Senado francês sobre a evasão fiscal avaliou o custo anual que os ricos subtraem ao fisco entre 30 e 60 mil milhões de euros. Mas, para o sindicato Solidaire-Finances Publiques, que apresentou um relatório no início de 2013, a fraude espolia as caixas do estado por volta de 60 a 80 mil milhões de euros por ano [Fonte: L'Expansion.com, 4/04/2013].
Os documentos piratas transmitidos pelo consórcio ICIJ referem-se a 122 mil empresas clandestinas trazidas à luz do dia para um pecúlio oculto calculado entre 20 e 30 milhões de milhões de euros: trata-se em parte de capital-dinheiro arrebanhado nas fábricas e nos comércios, que é misturado com dinheiro sujo do mundo ilegal e que em seguida é reinjectado na economia imperialista. Incidentalmente, outro dia na rádio, um animador paranóico pedia à senhora que estava ao microfone que identificasse o vígaro que havia arranjado o seu lavatório sem facturar – vejam lá, 10 euros escondidos aos impostos… Ah, o mal que nos podem fazer…
Os paraísos dos traficantes de dinheiro
Contam-se entre cinquenta e cem casinos de negócios, situados em países soberanos, à margem da lei e à margem do direito, e que todos os governantes da Terra conhecem melhor do que nós. Alguns desses Estados criminosos têm a classificação triplo AAA das agências de avaliação americanas! [Liste des États voyous du fisc fr.wikipedia.org/wiki/Paradis_fiscal#Liste_grise ].
Campos de golfe perfeitamente mantidos, que o primeiro secretário da ONU, os presidentes do Banco Mundial e da OCDE, assim como a presidente do FMI, evitam cuidadosamente criticar, a não ser para se queixarem, na esperança secreta de que nada será feito que possa prejudicar os seus investimentos. [5]
Os animadores ruidosos nos altifalantes dos meios mediáticos "preponderantes" têm a audácia de baptizar esta evasão fiscal: "Um delito de investimentos". Basta ler: "Efectuam-se no mundo diariamente milhares de milhões de transacções financeiras. Metade delas realiza-se nos paraísos fiscais ao abrigo de quase toda a tributação. A fuga de documentos relativos a esses países e a essas ilhas impermeáveis aos impostos fez ondas em todos os continentes. O governo canadiano exige a lista dos cerca de 450 canadianos tributáveis que terão investido nesses paraísos fiscais (sic). O montante a recuperar atinge milhares de milhões de dólares". [6]
Gostaríamos de acrescentar aquilo a que o investigador Alain Deneaulr chama "as dificuldades do fisco" – impostos e decrescimento – "em marcha para a decadência" – [ www.nousautres.org/aporie-du-fisc-impot-et-decroissance/ ], colocando assim a tónica onde deve ser posta… É a crise económica sistémica que obriga os esbirros do fisco a essas decisões arbitrárias contra os seus patrões que não apreciam minimamente ver assim usurpado o seu anonimato de opacidade "de investidores traficantes" nem ficarem expostos daqui em diante à vingança popular. Felizmente para esses multimilionários, todo este tumulto publicitário se acalmará dentro de meses numa orgia de comissões de investigação, de cimeiras sobre a fiscalidade e sob uma chuva de declarações por parte dos fala-baratos políticos, tão tonitruantes como fúteis e desopilantes. Sarkozy comprometeu-se a isso há dois anos e meio – Fim aos Paraísos, disse – sabemos o que se passa actualmente! E actualmente é a vez de a corte que rodeia François Hollande passar às confissões envergonhadas. [7]
Um especialista entrevistado na TV5 declarou recentemente que nenhum plenipotenciário da África negra deixa de subscrever a sua conta anónima na Suíça… Má língua, diríamos. Seria melhor que o homem se virasse para os políticos europeus, canadianos e americanos (o candidato às presidenciais americanas, M. Romney, não foi apanhado nesses locais mal afamados?). No Canadá, o "muito respeitável" senhor Paul Martin, em tempos primeiro-ministro da federação (2003-2006) era um praticante fervoroso desse tipo de evasão. O marido de Pauline Marois, homem de negócios cripto-federalista, também seria!?... (Os dados publicitados pelo ICIJ identificam 450 capitalistas canadianos, entre os quais uns cinquenta de Quebec [ www.lapresse.ca/... ].
Todos os que rasgam as roupas na praça pública sabiam – sabem – saberão tudo quanto a essas práticas satânicas – muitos deles a isso se dedicam há muito tempo escondendo o conteúdo dos envelopes com dinheiro que receberam na altura da adjudicação dos tentadores contratos públicos. [8]
Onde ir buscar o dinheiro para transferir para os ricos?
Os factos falam por si e constituem prova. Os estados capitalistas em crise económica em todo o mundo ocidental e oriental andam à procura de novas fontes de receitas – de novas entradas de capital-dinheiro para o transferir para os capitalistas. Como era de esperar, viraram-se primeiro contra os contribuintes – os assalariados pagos à semana, os ganha-pouco habituados a saldos – os pobres das sopas populares e os desapossados que foram submetidos à investigação da sua gestapo fiscal para lhes roerem as prestações e lhes roerem o seu poder de compra.
Como tudo isso não chegasse para tapar os défices faraónicos provocados pelos presentes fiscais consentidos à banca, às multinacionais riquíssimas e aos mendigos multimilionários; os fiscalistas e os administradores do Estado burguês, muito bem dispostos, lembraram-se de voltar a tributar os "burgueses-bobos-boémios" satisfeitos – que nunca deixam em paz – obrigados como são, esses capitães da administração, a rebuscar o dinheiro onde ele ainda pode ser surripiado, já que as algibeiras dos pobres e dos operários estão vazias.
Sempre que o Estado dos ricos ataca a pequena burguesia e a média burguesia, deixando os prevaricadores e os seus lacaios políticos, os apparatchiks, esconder-se nos "paraísos", fiquem descansados que uma indiscrição enviará esses fraudulentos para o inferno mediático. De resto, são esses comprometidos que manipulam as contas anónimas dos ricos na Suíça.
Não só não são declarados a mais-valia e os lucros espoliados aos trabalhadores, com medo de serem tributados; se por acaso não é possível subtrair ao olhar do fisco qualquer receita, a taxa de imposto que, no Canadá, se situa entre 31% e 53%, para o cidadão comum, não passa de 19% a 27% para a empresa dos bandidos – evidentemente depois de deduzidas todas as isenções e isso, desde que o monopólio multinacional aceite pagar o que deve, o que nem sempre acontece (Rio-Tinto-Alcan recusa-se há três anos a pagar mil milhões de dólares de dívida). [9]
Um subalterno mediático obsequioso acha que a evasão fiscal e os paraísos "offshore" são incontornáveis e inevitáveis tal como a prostituição, a mafia e os carteiristas. Muito lúcido, ele sabe como conservar o seu emprego. No entanto, este poltrão tem razão: a prevaricação, a exploração e a malandragem são os companheiros da cama do lucro. [10]
Oposição ao fisco e outras formas de arrebanhar massa
Os operários e os empregados são tributados até à morte, pagam impostos depois da morte – até na campa – onde o fisco se serve antes dos herdeiros do cadáver (os ricos beneficiam de toda uma série de escapatórias e isenções). Assim, os truques utilizados pelos operários, pelos empregados, pelos camponeses e pelos artesãos podem variar de uma época para outra, mas o objectivo da manobra mantém-se o mesmo qualquer que seja o sistema económico: reduzir as punções que o Estado efectua nas receitas dos trabalhadores que já estão de tal forma tributados, no trabalho e no mercado, que a reprodução ampliada das classes trabalhadoras está ameaçada. Nos países árabes, por exemplo, em toda a África e na América os jovens trabalhadores já não têm meios financeiros para se casar e ter filhos. Para esses trabalhadores, esconder do fisco as receitas é uma questão de sobrevivência e um dever para com as famílias.
O capitalista, pelo seu lado, confisca a mais-valia – lucros, dividendos, benefícios, juros e rendas – produzida pelos empregados. Acumula assim somas enormes sobre as quais paga poucos impostos e poucas taxas como acabamos de demonstrar. Mais ainda, o capitalista exige dinheiro ao governo para encorajar os investimentos de que será o único beneficiário – benefícios imensos que coloca nos paraísos fiscais a fim de contribuir o menos possível para o ciclo de reprodução ampliado dos trabalhadores que ele abandona à sua desgraça. O trabalhador aldraba o imposto para a sobrevivência da sua família, o capitalista aldraba o imposto para aumentar os seus lucros.
Bem entendido, todo o cidadão honesto, todo o operário empobrecido, todo o trabalhador com dificuldades de crédito, o que foi expulso do seu lar ou da sua casa arrendada, deve indignar-se com esta aldrabice; com este roubo de alto coturno por parte dos que possuem tudo em privado. O trabalhador deve enfurecer-se contra esses malfeitores insolentes e contra os ladrões instalados em cadeiras presidenciais, senatoriais e ministeriais. Mas todos têm que saber que amanhã, dentro de um mês, dentro de um ano, tudo isso se manterá na mesma porque os tubarões da finança, os "banqueiros-gangsters" e o peixe miúdo dos políticos larápios, que hoje são acusados, são também os donos dos advogados, dos procuradores, dos juízes, todos eles coligados. Nada resultará desta miscelânea mediática senão mais inquisição da polícia fiscal contra os trabalhadores e os mal-pagos.
O proletariado chocado não se revoltará ainda desta vez. Esperará pela sua hora e nessa altura ajustará estas contas, e todas as outras, ao mesmo tempo.
12/Abril/2013
1. Le Devoir (5.04.2013) Pleins feux sur l'évasion fiscale. www.ledevoir.com/international/actualites-internationales/37... =infolettre-quotidienne.
2. Alain Deneault (2010) Off-Shore. Paradis fiscaux et souveraineté crimminelle . Écosociété. Montréal. http://www.ecosociete.org/t137.
3. Radio-Canada (5.04.2013) 24 heures en soixante minutes. Offshore. http://www.radio-canada.ca/emissions/24_heures_en_60_minutes... 284479&autoPlay=http://www.radio-canada.ca/Medianet/2013/RDI/2013-04-05_19_0... 001_1200.asx
4. RTBF. Mise au point (30.10.2011) Quand le PTB dénonce la fraude fiscale. http://www.youtube.com/watch?v=oql0C1_pg6Q et http://science21.blogs.courrierinternational.com/archive/201.... L'express (5.04.2013) L'Affaire Augier, Qu'est-ce que l'Offshore-leaks ? http://www.lexpress.fr/actualite/ politique/comprendre-l-affaire-offshore-leaks_1237385.html
5. Le Monde (4.04.2013) Les pays suspectés de pratique fiscales douteuses. http://www.lemonde.fr/economie/infographie/2013/04/04/les-pa... que-fiscale-douteuse_3154297_3234.html.
6. Le Devoir (5.04.2013) Pleins feux sur l'évasion fiscale. www.ledevoir.com/international/actualites-internationales/37... =infolettre-quotidienne.
7. http://www.rue89.com/2009/09/23/sarkozy-magie-magie-les-para... et Le Monde (2013) http://www.lemonde.fr/offshore-leaks/
8. http://voir.ca/josee-legault/2012/04/12/enveloppes-brunes-et...
9. "Para entender as taxas de tributação das empresas, à semelhança do regime fiscal dos particulares, devemos ter em conta ao mesmo tempo o patamar federal e provincial. Por consequência, uma empresa no Quebec paga, em 2013, um máximo de 26,90%, ou seja, 15% ao federal e 11,90% ao provincial. Em contrapartida, é de notar que essa taxa não inclui nem as subvenções, nem as deduções; é assim a taxa a pagar sobre a receita colectável, e nãp sobre o conjunto da receita duma empresa (…) Além disso, essa taxa não é universal: para as duas ordens de governo, existe uma taxa diferente para as PME elegíveis. No Canadá, essa taxa é de 11%, enquanto que é de 8% no Quebec, para uma taxa máxima de 19%". http://www.iris-recherche.qc.ca/blogue/les-taux-dimposition-...
10. http://www.bfmtv.com/economie/paradis-fiscaux-sont-incontour...
[*] Professor, canadiano, http://www.robertbibeau.ca/
O original encontra-se em www.legrandsoir.info/... . Tradução de Margarida Ferreira.
Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .
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