O significado da guerra da imprensa contra o PT
por Márcio Palmares
Mesmo após o julgamento e a condenação dos réus do mensalão, a imprensa não cansa de pisar sobre a cabeça dos antigos dirigentes do Partido dos Trabalhadores. Para citar apenas dois exemplos, Genoíno e Zé Dirceu, dirigentes que ocuparam os mais altos cargos dentro do partido que governa o país há dez anos, estão agora reduzidos a “políticos comuns”: corruptos oportunistas execrados pela opinião pública.
Há três aspectos ocultos em toda a imensa campanha feita pela imprensa contra o PT. É importante refletir sobre eles.
O primeiro: quem comanda o país, na verdade, não é exatamente o PT. O Brasil é comandado por bancos, multinacionais, empreiteiras, latifundiários e especuladores do mercado financeiro. Para eles, a cor da marionete não importa: vermelha (PT) ou azul (PSDB), tanto faz. O importante é que toda a economia do país esteja voltada aos seus interesses. Ao observar os balancetes no final do ano, a série histórica dos lucros, se os sinais forem positivos, o banqueiro vai brindar ao PT ou ao PSDB, indistintamente.
Por isso, a polarização que se cria na imprensa em torno do PT e da oposição burguesa (PSDB e DEM, principalmente) é artificial: esses três partidos defendem o mesmo modelo econômico. Mas, mesmo assim, os capitalistas preferem ver no governo os seus próprios partidos, e não partidos que nasceram no seio da classe trabalhadora e que posteriormente se venderam aos capitalistas.
O segundo aspecto oculto: a enxurrada de matérias sobre o mensalão procura esconder o fato de que os partidos políticos burgueses, como PSDB, PDT, PMDB ou DEM, são tão corruptos quanto o PT, não há nenhuma diferença. Também houve mensalão do DEM e do PMDB. E os autores dos esquemas de corrupção, nesses casos, não serão presos. Permanecerão impunes. Demóstenes Torres, por exemplo, que era senador pelo DEM, e que fora eleito “Paladino da ética” pela revista Veja, apesar de cassado, e apesar de ser tão corrupto quanto Zé Dirceu, não será preso.
Terceiro aspecto oculto: ao atacar o PT a serviço dos capitalistas, a imprensa procura erradicar para sempre do imaginário popular a ideia de que um partido político da classe trabalhadora possa ser de algum modo bem sucedido, como se toda e qualquer experiência política fosse invariavelmente terminar em degeneração e corrupção. É por isso que o enterro do PT, se promovido pelos próprios capitalistas, vem acompanhado da ressurreição de figuras como FHC, José Serra, Geraldo Alckmin, etc. Moral da história: o cadáver do PT e da CUT deve ser enterrado pela própria classe trabalhadora, através da construção de novas organizações políticas e sindicais, que resgatem as bandeiras ou reivindicações históricas da nossa classe, que o PT jogou na lama.
Apesar do bombardeio de notícias sobre o mensalão, o PT sai vitorioso das eleições municipais
E apesar de tudo, mesmo com o mensalão, o PT saiu fortalecido das eleições municipais. O DEM e o PSDB sofreram uma grave derrota. Em Curitiba, por exemplo, o PSDB perdeu o comando da prefeitura, depois de 24 anos de domínio absoluto. É verdade que isto só foi possível graças ao papel desempenhado pelo ex-tucano Gustavo Fruet, que, para receber o apoio do PT, trocou de legenda como quem troca de roupa. Para os grandes empresários, financiadores das campanhas dos candidatos favoritos, Gustavo Fruet é uma figura confiável e respeitável, de DNA tucano. Com ele, seus negócios estarão em boas mãos. Ratinho Jr., por outro lado, expressão da direita tradicional e conservadora, apesar de se situar na base de apoio do governo federal, não parecia tão confiável aos olhos dos capitalistas. Isto explica por que não foi capaz de vencer no segundo turno. Os capitalistas e a classe média, juntamente com a parcela mais pobre da população, que ainda vê no PT uma esperança, votaram em Gustavo Fruet.
As medidas voltadas ao reaquecimento da economia criam a ilusão de estabilidade
Como explicar esta façanha eleitoral? Simples: desde o início do ano, o governo federal lançou um pacote de medidas destinadas a frear a desaceleração da economia. Devido à crise da economia mundial, cujo aspecto mais visível é a recessão na Europa, a economia brasileira vem desacelerando, ao menos desde 2010. Naquele ano, registramos crescimento de 7,5%. Em 2011, o crescimento caiu para 2,7%, e, para 2012, muitos analistas preveem um crescimento abaixo de 2%. Ou seja, a economia brasileira caminha para a estagnação (crescimento zero). Quando a economia para de crescer, a oferta de vagas no mercado de trabalho diminui, e mais pessoas ficam sem emprego. Surge um clima de pessimismo, os capitalistas, receosos, deixam de fazer novos investimentos, há uma queda constante na produção industrial e nas vendas no comércio, o que acarreta mais demissões. Cria-se assim uma bola de neve cujo resultado no médio prazo é a explosão de uma grave crise social e política: exatamente o que está acontecendo agora na Europa.
Para evitar este cenário, o governo Dilma lançou um extraordinário pacote de ajuda às grandes empresas (e nenhum pacote de ajuda aos trabalhadores): o chamado Plano Brasil Maior. Com esse plano, as empresas economizarão dinheiro, principalmente sob a forma de isenções fiscais (redução do IPI, desoneração da folha de pagamento, etc.). Os patrões estão agora de barriga bem cheia, não precisam demitir ninguém. Além disso, o governo também diminuiu a taxa básica de juros da economia, o que tornou o dinheiro mais barato, isto é, o crédito se tornou mais acessível. Houve, principalmente, do ponto de vista dos trabalhadores, uma diminuição significativa dos juros do cheque especial e também dos juros para o crédito consignado. Com isso, os trabalhadores já podem refinanciar suas dívidas e fazer mais empréstimos (aumentando o endividamento recorde). Além disso, com a diminuição dos juros do cheque especial, sobra um pouquinho mais de dinheiro no fim do mês, o que aumenta o consumo, aquecendo um pouco o comércio.
Essas medidas, embora não ataquem as razões de fundo, estruturais, que geram a crise e a recessão, criam a ilusão de estabilidade. Aparentemente, enquanto a Europa afunda na tormenta da recessão, o Brasil transpõe tranquilo a chamada “marolinha”. Foi esta ilusão momentânea o que permitiu que a maioria dos trabalhadores continuasse acreditando e votando no PT, mesmo com a campanha da imprensa contra o mensalão.
Desfazendo a ilusão
Mas essa estabilidade da economia brasileira, infelizmente, é momentânea e ilusória. O Brasil é profundamente dependente da economia mundial. A dependência é, aliás, o motivo pelo qual temos uma das mais altas taxas de juros do mundo: é o único meio de atrair os especuladores do mercado financeiro. Eles compram os títulos da nossa dívida pública, e seus capitais são remunerados com taxas astronômicas. Por outro lado, como somos uma nação semicolonial, cuja economia é basicamente voltada à exportação de matérias primas, os efeitos da recessão na Europa (ou no Japão ou mesmo nos EUA) demoram mais para chegar aqui. O Brasil exporta matérias primas para a China, que vende produtos industrializados para a Europa. Assim, se a Europa quebrar, os primeiros a pagar o pato serão os trabalhadores europeus (é o que está acontecendo agora). Depois, a outra parte da conta será paga pelos trabalhadores chineses. Nós, trabalhadores brasileiros, seremos os últimos a ser afetados, mas a nossa parcela da conta chegará aqui, não há dúvida. Aliás, já chegou.
A reforma trabalhista e a quarta reforma da previdência
Quando o capitalista está em crise, sua primeira reação é demitir. Se a demissão não for conveniente ou não for possível, o capitalista procura (através do Estado e do governo de plantão) reduzir os salários ou as conquistas sociais, o chamado “salário indireto”. É o que vai acontecer conosco (se não reagirmos).
Em 2011, atendendo aos interesses do mercado financeiro e dos empresários da saúde privada, o governo Dilma atacou as aposentadorias dos servidores públicos, criando o Funpresp, um fundo privado de previdência complementar, e iniciou a privatização dos Hospitais Universitários, por meio da EBSERH.
Os próximos passos do governo, visando atacar as conquistas sociais dos trabalhadores em benefício dos capitalistas, serão:
1) O fim do direito de greve no serviço público, através da “regulamentação do direito de greve”;
2) O fim da estabilidade, com a criação da “demissão por insuficiência de desempenho”;
3) A quarta reforma da previdência, que trocará o famigerado “fator previdenciário” pela “fórmula 85/95”, que vai piorar a situação, aumentando a idade mínima para a aposentadoria; e
4) A ressurreição da reforma trabalhista de FHC, através do chamado Acordo Coletivo Especial (para o patrão). Através do ACE, os patrões poderão incluir nos acordos coletivos cláusulas que contrariam as leis trabalhistas, “flexibilizando a CLT” e atacando os direitos dos trabalhadores. Prevalecerá “o negociado” sobre “o legislado”. Assim, se um sindicato pelego e patronal como o Sindicato dos Metalúrgicos do ABC (base da CUT e do lulismo), que, aliás, é o autor do Projeto de Lei do ACE, negociar com a Volks um acordo coletivo em que os operários devam trabalhar 60 horas por semana sem receber hora-extra, o que é ilegal segundo a CLT, a partir do ACE, essa “negociação” terá força de lei, para a alegria das multinacionais!
O exemplo da Europa
No entanto, apesar de o governo contar com a CUT na implementação dessas “reformas”, se nós, trabalhadores brasileiros, seguirmos o exemplo dos trabalhadores europeus, o confronto não será nada fácil para o governo.
Neste ano, ocorreram as maiores manifestações de rua na Europa, combinadas com greves gerais simultâneas em distintos países, desde o fim da Segunda Guerra Mundial. Países como Espanha, Grécia e Portugal, os mais afetados pela recessão e pelos “planos de austeridade”, vivem em um regime de crise política e social permanente, que ameaça derrubar todo o edifício da União Europeia. E isso acontece porque os trabalhadores resistem. A classe trabalhadora se recusa a entregar seus direitos e conquistas em benefício dos bancos e grandes empresas, que são os responsáveis pela crise. As mobilizações atingem diretamente o governo de cada um desses países, a Troika (Comissão Europeia, Banco Central Europeu e FMI) e o próprio capitalismo, identificado corretamente como a raiz de todos os males.
A tendência do Brasil é seguir pelo mesmo caminho. Em 2012, realizamos a maior greve coordenada do serviço público federal dos últimos 20 anos. Mais de 30 categorias entraram em greve. A julgar pelos ventos que sopram da Europa e pela disposição de luta que têm os trabalhadores brasileiros, podemos afirmar que a vida da senhora Dilma Rousseff não será nada fácil daqui para frente. Resistiremos até o fim. Nenhuma conquista social, nenhum direito trabalhista será perdido sem um luta duríssima, em que nossa classe combaterá de cabeça erguida, confiante em suas próprias forças e em seu futuro.
Fonte:http://www.sinditest.org.br/
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