Alienação, fenómeno transversal e intrínseco a todas as sociedades
humanas constituídas sob uma relação de poderes, destronador da essência
humana, desvirtuando-a pelos caminhos tortuosos da ignorância. Pode a
alienação ser voluntária ou forçada, ou ambas simultaneamente? É
plausível a admissão de uma auto-alienação? A nossa perspetiva leva-nos a
abdicar de uma posição idealista, assente num carácter individualista e
reducionista, procurando uma resposta assente sob uma análise sistémica
e societária, gerada por uma correlação de forças.
A dialéctica heraclitiana e hegeliana, materializada em Marx, contêm
em si os alicerces explicativos de tal fenómeno. No século XVI, Étienne
La Boétie, autor menosprezado por diversas comunidades científicas,
surge como um dos primeiros estudiosos do comportamento das massas, em
que a servidão voluntarista dos súbditos determina o comportamento
arbitrário dos tiranos. Para o autor, todas as civilizações humanas
consubstanciadas por relações de poder evidenciam a submissão e a
passividade das massas.
Marx, nunca esquecendo as influências transatas, identificaria
múltiplas formas de alienação, essencialmente a interação que o operário
estabelece na estrutura de produção das sociedades capitalistas. Toda
esta perspetivação e identificação do presente fenómeno apetrecha-nos de
um manancial de ferramentas, no sentido de lidarmos com este cancro
social e das vísceras que compõem o totalitarismo racionalista,
fundamentado por uma lógica que tem vindo a dar mostras de irromper no
espectro sócio-político, como é identificável no vocabulário de
Zamiatine.
A realidade distópica que brota deste liberalismo que visa preencher a
nossas vidas e as nossas sociedades, abraça a alienação como a sua
grande arma. Desde a massificação dos costumes, passando pela formatação
ideológica ou padronização dos hábitos, culminando numa arregimentação
das massas humanas constitui a oferta política da reação dos nossos
dias. Apregoam por uma transparência democrática, mas na realidade esta
Democracia de classe, burguesa, nada mais é do que uma cartelização da
vida partidária que brota num controlo estatal e toda a vida pública.
A comunicação social, controlada pelas forças do poder vigente, é uma
máquina de processamento da alienação, afastando a essência do
pluralismo, de que eles se vangloriam como sendo os arautos.
Passividade, o homem passivo é aquele que garante o aprazimento dos
interesses plutocratas e partidocratas (entenda-se a forças que
constitui a cartelização partidária, Partido Cartel), sendo que essa
passividade é cultivada pelas sementes do hábito, como defendia o
francês La Boétie, na constituição da servidão pelas massas acríticas.
O grande ponto de viragem consiste na reabilitação das nossas
capacidades: Serão os nossos órgãos de informação veículos de debate,
pluralismo, reflexão e garantes de uma igualdade de acesso de todos os
cidadãos a esses devidos meios de comunicação? As nossas Universidades,
detêm nos dias de hoje, uma função de cultivação da fruição intelectual,
reflexão e aprendizagem ou por sua vez, perfazem-se no sistema
mercantil, apresentando-se como estruturas organizadas para sustarem
interesses classistas?
Perante submissões ilegítimas, devemos afastar-nos do covil
perpetrado pelas forças usurpadoras, tal como a raposa recusa aceder ao
convite envenenado do leão para entrar no seu covil. A palavra de ordem,
a emancipação das sociedades humanas perante esta tremenda
"desnaturalização do homem", deve passar por uma Sociedade Civil
fortalecida, incremento da Democracia Local, Democracia de Proximidade,
valorização das comunidades locais e da sua participação nos afazeres da
coisa pública, enfim, utilizar a arma do inimigo contra ele mesmo, o
hábito. O instinto social e organizacional do ser humano é um princípio
ordenador, já cultivado, baste reerguê-lo e completá-lo na sua
plenitude, desfazendo este individualismo grosseiro, selvagem e ignóbil
que pretendem impingir-nos.
Tiago Ramalho
Fonte: http://acomuna.net
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