segunda-feira, 23 de agosto de 2010

Procuradora conclui que Marinho comprou TV GLOBO com documento falso.Parecer mostra que houve até estelionato.

Ao analisar os autos do processo movido contra Roberto Marinho e seus filhos pelos herdeiros dos antigos proprietários da Rádio Televisão Paulista S/A (hoje, TV Globo de São Paulo Ltda.), a procuradora da República Melissa Garcia Lagitz de Abreu e Silva emitiu parecer comprovando as falsificações de documentos e outras irregularidades cometidas pelo empresário para assumir, na década de 60, o controle da emissora, que hoje responde por mais de 50% do faturamento da Rede Globo.
Após descrever, com pormenores, os atos societários e administrativos consumados por Marinho e seus representantes (Armando Piovesan, Luiz Eduardo Borgerth e Carlos Eduardo de Camargo Aranha), a procuradora conclui que “tudo indica que houve vários fatos ensejadores de ilegalidades cometidas por Roberto (Marinho)”.

Falsificações
Com base na perícia documental promovida pelo Instituto Del Picchia, a representante do Ministério Público Federal afirma que “há indícios de que as procurações e substabelecimentos utilizados nos atos de transferência oficial do controle acionário da Rádio Televisão Paulista S/A para Roberto (Marinho) foram falsificados”.
“Por outro lado, tanto a Armando (Piovesan) como a Roberto (Marinho), por terem representado Hernani (Junqueira Ortiz Monteiro, um dos maiores acionistas), através de procuração que não mais surtia efeitos, poderia ser imputado o crime de estelionato (artigo 171 do Código Penal), por omitirem o falecimento do outorgante da procuração à época dos fatos, conforme Certidão de Óbito juntada às fls. 44, mantendo em erros os demais acionistas e as autoridades federais. Este crime se consumou em 05/12/64 e 10/02/65″, acrescenta a procuradora Melissa Abreu e Silva.

Perícia
Mais adiante, a representante do Ministério Público Federal em São Paulo cita a perícia realizada nos documentos apresentados por Roberto Marinho para justificar a transferência das ações para seu nome: “Por conseguinte, diante dos fatos técnicos expostos e demonstrados, sem embargo de eventuais exames dos originais das peças xerocopiadas poderem trazer novos e mais abundantes, porém despiciendos elementos demonstrativos da falsidade, justifica-se a inicialmente sintetizada e ora repetida conclusão pericial: São falsas as datas de 1953 e 1964, consignadas na procuração e substabelecimentos questionados”.
“É certo que cinco documentos ofertaram provas materiais de produção concomitante, de lavra conjunta e que os documentos em tela foram produzidos em 1974 e 1975″, conclui a procuradora, que aponta, com riqueza de detalhes, as ilegalidades cometidas por Roberto Marinho e seus representantes para justificar a transferência das ações, nas duas contraditórias versões apresentadas pelos atuais advogados do empresário – através de procurações e recibos falsificados, ou através de Assembléias Gerais Extraordinárias, também eivadas de irregularidades.

Crimes
Em seu parecer, a procuradora da República Melissa Garcia Lagitz de Abreu e Silva reconheceu que, no âmbito da Justiça Federal, os múltiplos crimes consumados já estão prescritos, mas fez questão de ressalvar que, no que se refere ao uso dos documentos falsificados perante a Justiça do Estado do Rio de Janeiro, agora cabe ao Ministério Público Estadual a apuração dos fatos. Ou seja, não há mais prescrição, devido à recente reutilização dos papéis falsos, e o empresário Roberto Marinho e seus filhos podem ser condenados por esse crime.
Além disso, a representante do Ministério Público Federal destacou que, para análise de possíveis punições administrativas, foram extraídas cópias dos autos e remetidas ao setor de Tutela Coletiva da Procuradoria da República em São Paulo.

Parecer mostra que houve até estelionato
O parecer da procuradora da República Melissa Garcia Lagitz de Abreu e Silva sobre o processo movido contra Roberto Marinho para anular a transferência do controle acionário da TV Globo de São Paulo, na íntegra, é do seguinte teor, respeitadas as palavras escritas em letras maiúsculas:
1 – Trata-se de peça de informação encaminhada pela Procuradoria da República do Estado do Rio de Janeiro noticiando a prática, em tese, de crimes consistentes na falsificação de documentos, envolvendo a antiga RÁDIO TELEVISÃO PAULISTA S/A, depois transformada em TV GLOBO DE SÃO PAULO S/A, atual TV GLOBO LTDA., concessionárias dos serviços de radiotelevisão, e o jornalista ROBERTO MARINHO.
2 – Consta da inclusa peça de informação que os herdeiros da RÁDIO TELEVISÃO PAULISTA S/A ingressaram com a Ação Declaratória de Inexistência de Ato Jurídico em face de Roberto Marinho, de seus filhos, Roberto Irineu Marinho e José Roberto Marinho e da TV GLOBO LTDA., autuada sob nº 2001.001.124133-1. atualmente em trâmite na 42ª Vara Cível da Comarca da Capital do Rio de Janeiro, alegando que a transferência do controle acionário da RÁDIO foi realizada de modo fraudulento, mediante a utilização de documentos tidos como falsificados pelo laudo pericial doInstituto Del Picchia, confeccionado mediante solicitação dos autores (fls. 150/180).
3 – Narram os referidos autos da Ação Declaratória que, em 5 de dezembro de 1964, Roberto Marinho teria adquirido por Cr$ 60.396,00 (sessenta mil, trezentos e noventa e seis cruzeiros) as 15.099 (quinze mil e noventa e nove) ações ordinárias e preferenciais, o equivalente a 52% (cinqüenta e dois por cento) do capital social, que pertenciam aos sócios fundadores da RÁDIO, Oswaldo Junqueira Ortiz Monteiro, Hernani Junqueira Ortiz Monteiro, Manoel Vicente da Costa e Manoel Bento da Costa.
4 – A referida transação teria sido efetuada para cumprimento da Promessa de Venda de Ações e de Cessão de Cotas com Victor Costa Petraglia Geraldine ou sucessores (fls. 349/356), com base nos seguintes documentos (fls. 71/73):
a) recibo subscrito por Oswaldo, referente ao pagamento das 15.099 (quinze mil e noventa e nove) ações, das quais 5.399 (cinco mil, trezentos e noventa e nove) eram de sua titularidade e o restante, cerca de 5.000 (cinco mil) pertenciam a Hernani, 2.700 (duas mil e setecentas) ações eram de Manoel Vicente e 2.000 (duas mil) ações de Manoel Bento. Relativamente aos três últimos acionistas, o recibo menciona que a prática do ato por Oswaldo estava relacionada à procuração outorgada por Hernani, datada de 10.06.62, e às procurações, datadas de 05.12.64, outorgadas por Manoel Vicente e Manoel Bento;
b) procuração outorgada por Oswaldo, por instrumento particular, a Roberto Marinho, conferindo poderes a ele de transferência para si ou para quem indicasse as suas 5.399 (cinco mil, trezentos e noventa e nove) ações;
c) substabelecimento, sem reservas, de Oswaldo para Roberto Marinho das procurações que teria de Manoel Vicente e Manoel Bento, também o autorizando a transferir para si ou a quem indicasse as ações pertencentes aos supostos outorgantes das procurações substabelecidas.
5 – Nota-se, também, que a transação não foi levada a registro por 12 (doze) anos e a emissora funcionou durante todo esse período sem a autorização dada pelas autoridades federais, contrariando as exigências determinadas pelos artigos 90 e 98 do Dec. 52.797/63, que institui normas para a exploração de concessão de serviço público de televisão.
6 – Há, ainda, notícia, nos referidos autos, da realização de uma Assembléia Geral Extraordinária, em 10 de fevereiro de 1965, para deliberação de aumento de capital. Consta da referida Ata da Assembléia (fls. 31/33 dos autos principais) que Roberto Marinho (que ainda não era acionista oficialmente) subscreveu o referido aumento, havendo registro de que ninguém mais se interessou em fazê-lo.
Consta do documento, também, que o Dr. Armando Piovesan teria procuração para representar Oswaldo Junqueira Ortiz Monteiro, Hernani Junqueira Ortiz Monteiro, Clélio Marmo e Manoel Bento da Costa. Para os demais acionistas minoritários possuidores de 48% (quarenta e oito por cento) do capital social, não há registro de que teriam participado da Assembléia ou de que foram representados.
7 – Ocorre que Armando não poderia ter representado Hernani, porque este, à época dos fatos (10.02.65), já havia falecido (23.06.62), conforme Certidão de Óbito juntada às fls 11. Este fato, também, faz com que a procuração outorgada a Oswaldo tivesse perdido a validade.
8 – Há que se ressaltar que, se o ato de transferência das ações, datado de 05 de dezembro de 1964, tivesse realmente ocorrido, Armando não precisaria agir em nome dos acionistas primitivos, porque as ações já pertenceriam a Roberto Marinho.
9 – De qualquer forma, o aumento de capital (omitindo-se a transação anteriormente efetuada em 05 de dezembro de 1964) foi submetido ao Conselho Nacional de Telecomunicações – CONTEL, que editou a Portaria 163/65 (fls. 86/87), que condicionou a aprovação do aumento de capital social à regularização do quadro social, dentro de 6 (seis) meses. Nos autos há informação de que essa regularização ainda não havia sido feita em 17 de junho de 1975, sendo que funcionário do Departamento Nacional de Telecomunicações – DENTEL – proferiu parecer reiterando a exigência (fls. 95).
10 – Publicou-se um edital em 09 de setembro de 1975 convocando os acionistas para comparecerem na sede da emissora para suprirem as exigências do DENTEL. Em 30 de junho de 1976 foi realizada a Assembléia Geral Extraordinária para regularização do quadro social (fls. 112/113), na qual consta que foram representados, mas sem identificação de um documento em específico, os acionistas Oswaldo Junqueira Ortiz Monteiro, Hernani Junqueira Ortiz Monteiro (falecido em 23/06/62), Manoel Vicente da Costa (falecido em 15/12/64) e Manoel Bento da Costa, entre outros.
Também há registros de que as ações dos 650 acionistas minoritários, proprietários de 5.693 ações ordinárias e 8.592 preferenciais, poderiam ser adquiridas pelos demais acionistas (remanescentes) na proporção das ações que possuíam, direito este que deveria ser exercido no prazo de trinta dias.
11 – Há registro também de que, em 23 de julho de 1975, foi realizada nova transação envolvendo a venda das mesmas ações relacionadas na alínea “a” do item 4 relacionado acima (fls. 74), conforme recibo idêntico àquele subscrito por Oswaldo.
12 – Em 03 de agosto de 1976, Roberto Marinho, então presidente da TV GLOBO DE SÃO PAULO S/A., apresentou a relação atualizada do quadro de acionistas ao Diretor Geral do DENTEL. Neste documento Roberto Marinho solicitou para si a transferência das ações pertencentes a Oswaldo Junqueira Ortiz Monteiro, Hernani Junqueira Ortiz Monteiro, Manoel Vicente da Costa e Manoel Bento da Costa e a diversos acionistas, na forma da AGE de 30/06/76, por subscrição (fls. 114/120).
A Portaria 430 de 27/01/77 acabou por autorizar as referidas transferências (fls. 121/124). Em anexo a esta Portaria estão juntados os “Termos de Transferências de Ações Preferenciais” de Oswaldo Junqueira Ortiz Monteiro e Manoel Bento da Costa, sem as respectivas datas das transações (fls. 125).
13 – Consta dos autos, também, que peritos do Instituto Del Picchia, mediante solicitação dos autores da Ação Declaratória, examinaram os seguintes documentos e confeccionaram um laudo, juntado às fls. 150/180:
a) Recibo com data datilografada (“23 de julho de 1975″), registrando como beneficiário Dr. Roberto Marinho, correspondente a 15.099 ações da Rádio Televisão Paulista (fls. 156);
b) Procuração consignando como outorgados o Dr. Luiz Eduardo Borgerth e o Dr. Carlos Eduardo de Camargo Aranha, com data manuscrita de “5 de dezembro de 1964″, relativa a 5.399 ações da Rádio Televisão Paulista (fls. 157);
c) Substabelecimento dos poderes conferidos por Hernani Junqueira Ortiz Monteiro, aos mesmos outorgados da procuração supra, referente a 5.000 ações da Rádio Televisão Paulista, com data manuscrita de “5 de outubro de 1958″ (fls. 158).
d) Substabelecimento nos moldes do item anterior dos poderes conferidos por Manoel Bento da Costa, com data manuscrita de “5 de dezembro de 1964″, relativa a 2.000 mil ações da referida empresa (fls. 159);
e) Substabelecimento nos moldes do item anterior dos poderes conferidos por Manoel Vicente da Costa sobre 2.700 ações (fls. 160).
14 – O perito concluiu: “Por conseguinte, diante dos fatos técnicos expostos e demonstrados, sem embargo de eventuais exames dos originais das peças xerocopiadas poderem trazer novos e mais abundantes, porém despiciendos elementos demonstrativos da falsidade, justifica-se a inicialmente sintetizada e ora repetida conclusão pericial: São falsas as datas de 1953 e 1964, consignadas na procuração e substabelecimentos questionados”. É certo que cinco documentos ofertaram provas materiais de produção concomitante, de lavra conjunta e que os documentos em tela foram produzidos em 1974 e 1975.
15 – Diante do relatado, tudo indica que houve vários fatos ensejadores de ilegalidades cometidas por Roberto.
16 – Há indícios de que as procurações e substabelecimentos utilizados nos atos de transferência oficial do controle acionário da RÁDIO TELEVISÃO PAULISTA S/A para Roberto foram falsificados, com base, entre outros fatos, no citado laudo (fls. 150/180).
17 – Neste caso, a consumação da falsidade deu-se na data que os documentos provavelmente foram falsificados, ou seja, entre 1974 e 1975. Assim sendo, mais de 28 (vinte e oito) anos já se passaram desde a data da sua confecção, completando-se o lapso temporal, cerca de 12 (doze) anos, previsto no artigo 109, inciso III, do Código Penal, extinguindo a pretensão punitiva estatal.
18 – Por outro lado, tanto a Armando como a Roberto, por terem representado Hernani, através de procuração que não mais surtia efeitos, poderia ser imputado o crime de estelionato (art. 171 do Código Penal) por omitirem o falecimento do outorgante da procuração à época dos fatos, conforme Certidão de Óbito juntada às fls. 44, mantendo em erro os demais acionistas e as autoridades federais.
Este crime se consumou em 05/12/64 e 10/02/65, que consoante o referido artigo tem pena máxima de cinco anos, que prescreve em doze anos, conforme previsão do artigo 109, inciso III, do Código Penal, impedindo a pretensão punitiva estatal, uma vez que já decorreram 38 (trinta e oito) anos desde a época dos fatos.
19 – Quanto ao uso dos documentos falsificados perante a Justiça do Estado do Rio de Janeiro, conforme esclarecido pelo Procurador da República oficiante naquela Capital, já foi comunicado o Ministério Público Estadual, com atribuição para apuração dos fatos.
20 – Pelo exposto, requer o Ministério Público Federal, pela Procuradora subscritora, o ARQUIVAMENTO da presente, nos termos do art. 18 do Código de Processo Penal.
21 – Para análise de possíveis punições administrativas, foram extraídas cópias dos autos e remetidas aos Setores de Tutela Coletiva desta Procuradoria.
Fonte: http://ideiaeopiniao.blogspot.com/2010/08/procuradora-conclui-que-marinho-comprou.html

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