Em homenagem a István Mészáros que teve por essas bandas quinta-feira passada, publicamos hoje um trecho de “Desemprego e precaarização: Um grande desafio para a esquerda”, curto mas importante texto em forma de palestra do filósofo húngaro. Abaixo publicamos a parte III. O texto ainda é composto de “A globalização do desemprego” Parte I, e “O mito da flexibilidade: equalização declinante da taxa de exploração diferencial” Parte II.
Como afirma Mészáros “A questão não é se o desemprego ou a “precarização flexível” vai ameaçar as pessoas ainda empregadas mas sim quando elas irão partilhar as agruras da precarização forçada. A segunda razão principal para nos preocuparmos com esta questão é porque ela representa um inultrapassável problema estrutural para o capital. Assim, é impensável que a esquerda possa desenvolver uma estratégia viável para o futuro sem dar um lugar central à questão vital do desemprego e da precarização.Tenciono hoje considerar três aspectos principais daquilo que está em jogo.
1- A “globalização” do desemprego e da precarização, afectando mesmo as partes do mundo capitalisticamente mais desenvolvidas.
2- O mito da “flexibilidade” com o qual a pílula amarga é coberta de açúcar. Pois do que estamos a falar é de facto a grave tendência socioeconómica da equalização descendente (downward equalisation) da taxa de exploração diferencial.
3- A única solução factível para os problemas que enfrentamos é abandonar as trocas socioeconómicas reguladas pela submissão à tirania do “tempo de trabalho necessário” para a emancipação através do “tempo disponível” como a alternativa positiva ao modo de reprodução social metabólica do capital.
Parte III ─ Da tirania do “tempo de trabalho necessário” à emancipação através do “tempo disponível”.
Como pode o trabalho – o antagonista estrutural do capital – reagir à tendência de deterioração inseparável do estreitamento da margem de viabilidade do capital produtivo?
Esta pergunta conduz-nos de volta ao terceiro elemento do pedido da Rifondazione para assegurar a semana de trabalho de 35 horas citada no princípio desta palestra: “mudar a sociedade” (”per cambiare la società”) . Pois hoje – em resultado da necessidade do capital de arrancar sem cerimonias[29] mesmo as suas concessões passadas, ao invés de aceder a novas – é totalmente impossível realizar mesmo os objectivos mais imediatos e limitados do sindicalismo tradicional sem tomar a rota que conduz a uma transformação social fundamental. A reconstituição radical do movimento socialista é uma parte vitalmente importante deste processo.[30]
Alguns dos mais inteligentes representantes do capital, como Dean Witter – o economista chefe e diretor de economia global do Morgan Stanley – estão prontos a confessar que a tendências em andamento são mais problemáticas do que habitualmente pintadas nos órgãos de propaganda do neoliberalismo. Num artigo publicado no Sunday New York Times, intitulado “The Worker Backlash”, ele rejeita a explicação de que os êxitos recentes resultaram da “desregulamentação e do aumento de produtividade”. A sua própria explicação, de longe mais consciente do conflito e menos reconfortante, é que foi “um realinhamento dramático do bolo económico do país, com uma fatia muito maior indo para o capital e uma mais pequena indo para o trabalho. Chamo a isto uma recuperação do trabalho triturado, que floresceu só porque a América empresarial aplicou uma pressão implacável sobre a sua força de trabalho”.[31]
Na verdade, não só a América empresarial aplica pressão implacável sobre a sua força de trabalho como também as personificações do capital fazem-no por toda a parte. Pois as conquistas reformistas do passado foram precedidas pelo crescimento contínuo do bolo – as quais surgiram sob condições econômicas favoráveis como concessões do capital, ainda que nunca pudessem ser uma questão de “realinhamento do bolo em favor do trabalho” uma vez que o capital deve sempre apropriar-se da fatia do leão. Agora, devido à crise estrutural do capital e do estreitamento da margem de viabilidade do sistema produtivo, torna-se absolutamente necessário “realinhar o bolo econômico do país”, mais do que nunca, em favor do capital, de modo a assegurar uma “recuperação do trabalho triturado”, graças à passividade e resignação da força de trabalho. Mas o que acontece quando o trabalho recusa-se a acompanhar o brutal realinhamento do bolo económico, porque não pode mais permitir-se isso devido à crescente dureza imposta pelas tradicionais e recém-inventadas formas de “economia do trabalho triturado”? As possibilidades de “realinhar” um bolo estacionário, para não falar em um processo de encolhimento, tem os seus limites bem definíveis. Não esquecer o fato de que a inatividade contemplativa (”resignatory”) do movimento dos trabalhadores não pode ser tomada simplesmente como garantida para sempre em qualquer país, como uma matéria de necessidade natural. Nem mesmo nos países capitalistas mais avançados. Não é de admirar, portanto, que hoje mesmo o economista chefe do Morgan Stanley tenha de falar acerca da “Revanche dos trabalhadores” (”The Worker Backlash”) nos EUA, dando voz às suas preocupações acerca de uma possível “luta pelo poder primário entre o capital e o trabalho” e acrescentando que “longe estão os dias de uma força de trabalho dócil que outrora concordou com as reestruturações empresariais de retalhamento e queima (slash-and-burn) “.[32]
Naturalmente, do ponto de vista do capital não pode haver respostas para a pergunta: que espécie de alternativa à “economia do trabalho triturado” deveria ser perseguida a fim de evitar “a luta pelo poder primário entre o capital e o trabalho”. Quaisquer que sejam os seus temores e preocupações, o economista chefe do Morgan Stanley deve continuar a aconselhar a sua firma acerca dos melhores meios de explorar as oportunidades da especulação financeira “globalizada”, ou ele será rapidamente despachado para pastagens mais tranquilas com um poderoso aperto de mão dourado. Do ponto de vista do capital realmente “não há alternativa” ao “trabalho triturado” tanto quanto possível – e mais ainda em situações de emergência -, mesmo que alguém perceba os perigos implícitos de perseverar nesse caminho socio-econômico. Pois no fim há sempre a sedução de soluções autoritárias, não só no país do General Suharto, cliente dos EUA, como também nas “democracia capitalistas avançadas” do Ocidente que ajudaram a colocar Suharto no poder, apoiando-o de todas as formas possíveis durante 32 anos, incluindo sua selvagem repressão militar do povo, e tentando salvar o seu miserável regime com fundos maciços do FMI até no último minuto antes da sua morte.
A promessa geral de resolver as gritantes iniquidades e contradições do sistema foi durante muito tempo – e ainda hoje continua – que através dos benefícios do sempre crescente e globalmente integrado “livre comércio” as condições dos trabalhadores melhorariam muito em todo o mundo, graças ao retorno da economia a uma situação de expansão não perturbada do capital, livre dos defeitos das décadas do pós-guerra que acabaram em inflação e estagnação. Os sinais reais e os indicadores econômicos, contudo, apontam na direcção oposta, um fato por vezes reconhecido mesmo por economistas da “corrente predominante” (mainstream) que mantêm a sua crença nas virtudes insuperáveis do sistema do capital. Assim, para citar um artigo que resenha um livro recente de um tal economista:
“Rodrick argumenta que o comércio em geral, não apenas as importações de baixos salários, piora a distribuição do rendimento. A competição internacional acrescida, escreve ele, traduz-se numa maior “elasticidade” da procura interna por trabalho. Em termos simples, isto significa que um trabalhador está agora a competir com uma oferta de trabalho muito mais vasta. Em resultado disso, uma pequena mudança nos salários de trabalhadores estrangeiros ou na procura global por um produto ou serviço pode causar grandes mudanças na procura interna de trabalhadores. A maior vulnerabilidade do trabalho a flutuações do mercado enfraquece a sua posição negocial em relação ao capital. Portanto, conclui Rodrick, “O efeito de primeira ordem do comércio parece ter sido uma redistribuição do excedente da empresa em benefício do patronato e não a ampliação do excedente”. A evidência, portanto, diz-nos que os críticos do livre comércio estavam certos; o comércio não está a ampliar a riqueza e sim a redistribuí-la para um nível mais alto”. [33]
Mas, ainda assim, quando chega à questão das alternativas, obtemos de Rodrick apenas piedosas pregações. Assim, para continuar nossa citação:
“As políticas de Rodrick são na melhor das hipóteses ingénuas. Ele aconselha o trabalho e o governo a serem mais responsáveis, mas nada tem a dizer às corporações de negócios multinacionais. … “O trabalho deveria advogar uma economia global que tivesse uma face mais humana”, escreve Rodrick, mas silencia acerca dos ferozes esforços organizados pelos negócios multinacionais e pelas finanças para impedir que políticas humanas sejam sequer consideradas pelo Fundo Monetário Internacional, pelo Banco Mundial, pela Organização Mundial de Comércio, e por outros que estabelecem as regras para o mercado global. Isto sugere um ponto de vista que está, para dizer a coisa suavemente, desligado das realidades da economia política global”. [34]
Na verdade, adoptar o ponto de vista do capital – não só na sua forma neoliberal cegamente acrítica e mais agressiva, mas também nas suas ilusórias variedades liberal-reformistas – significa desde há muito “desligar-se das realidades da economia política global”.
A novidade radical do nosso tempo é que o sistema do capital já não está em posição de conceder ao trabalho seja o que for, em contraste com as aquisições reformistas do passado. A acomodação deprimente, e mesmo a capitulação total, de alguns dos antigos partidos da classe trabalhadora às exigências dos interesses dos grandes negócios – como na Grã-Bretanha e em vários países europeus, mas de modo nenhum apenas na Europa -, uma capitulação que chega não só a manter a autoritária legislação anti-trabalhista das últimas poucas décadas como também a dar postos ministeriais chave nos governos do “New Labour”, da “Esquerda Democrática” italiana e alhures a proeminentes representantes do capital corporativo, fala inequivocamente acerca desta postura. (Lord Simon, Lord Sainsbury, Geoffrey Robinson, etc na Grã-Bretanha e figuras semelhantes na Alemanha, França e Itália). Eis porque no actual período histórico mesmo os objetivos limitados e modestos do trabalho – como a semana de 35 horas – só podem ser realizados através da “mudança de sociedade”, uma vez que objetivamente contestam a ordem socio-econômica e política estabelecidas (por outras palavras: todo o sistema de tomada de decisão) sob a qual “o bolo econômico do país” é produzido e distribuído. Nas condições da crise estrutural do capital esta é a natureza objectivamente inevitável da contestação socio-económica, mesmo que no momento muitos representantes do trabalho não conceptualizem ou articulem isto nestes termos. E esta é também a razão porque o reformismo liberal e social-democrata, o qual em outros tempos tinha um poderoso aliado no dinamismo expansionário do capital, está agora condenado à futilidade das pregações piedosas – desde os sermões do professor John Kenneth Galbraith acerca da “Cultura do contentamento” (rapidamente reflectidos, sem os mais ligeiros efeitos curativos, por Bispos e Arcebispos na Igreja da Inglaterra) à noção do “trabalho e governo inspirados pela economia global com uma face humana” citada atrás. Uma pregação que as personificações do capital provavelmente não podem ouvir.
A exigência de uma redução significativa da semana de trabalho tem uma importância estratégica fundamental. Não só porque a questão subjacente afecta profundamente e portanto preocupa directamente cada trabalhador, manual e intelectual afim, qualquer que seja a cor dos seus colarinhos. Igualmente porque a questão do enfrentamento deste desafio não está a desvanecer-se. Ao contrário, cresce em importância a cada dia que passa, e o imperativo de fazer algo significativo em relação a isto não pode ser decretado como inexistente pelas personificações parlamentares do capital nos países capitalistas avançados, nem na verdade reprimidos pelas forças nuas na “periferia” da ordem global do capital. Por outras palavras, trata-se de uma exigência estratégica vital para o trabalho porque ela é “não negociável”: isto é, não pode ser integrada nas pseudo-concessões manipuladas da ordem existente. Pois refere-se directamente à questão do controle – um sistema alternativo de controle social metabólico – ao qual o capital opõe-se frontalmente.
Naturalmente, as 35 horas de trabalho semanal – mesmo que pudessem ser genuinamente concedidas e não anuladas tortuosamente de muitas maneiras, como é cinicamente planeado ou já praticado – não poderiam resolver o monumental e sempre crescente, bem como socio-economicamente grave, problema do desemprego. Assim, a questão que legitimamente se levanta é: porque 35 e não 25 ou 20 horas por semana, que faria uma maior diferença em relação a isso? Esta é a questão que nos transporta ao coração do assunto.
As incompatibilidades radicais entre a ordem social existente e uma na qual seres humanos estejam no controle da sua actividade vital, incluindo o seu “tempo livre”, a ser posto livre por uma redução significativa da semana de trabalho, foi gráfica e penosamente ilustrado na Grã-Bretanha através da destruição da indústria mineira. Em 1984 os mineiros de carvão travaram uma luta heróica, não por dinheiro mas em defesa do seus empregos: uma longa greve de um ano que foi derrotada através dos esforços combinados do governo da sra. Thatcher – a qual chamou os mineiros de “o inimigo interno” – e o Partido Trabalhista de Neal Kinnock o qual apunhalou-os pelas costas. Como resultado, a força de trabalho dos mineiros, que na época era de mais de 150 mil, foi dizimada, caindo para o número actual de menos de 10 mil, e as cidades e aldeias de muitas comunidades mineiras foram transformadas num deserto de desemprego desumanisado. No tempo da greve dos mineiros as minas de carvão estavam ainda “nacionalizadas”, o que significa que eram administradas com os mais brutais critérios capitalistas de “eficiência” de controle autoritário pelo National Coal Board, tornando-se em seguida “privatizadas” numa fracção da sua dimensão original. O que foi altamente característico do modo como o Coal Board tratava do problema da “maior eficiência”, enquanto falava acerca da absoluta necessidade de “racionalizar” as exigências do trabalho na indústria do carvão, foi o facto de que Board dirigido pelo Estado impôs aos mineiros uma quase insano cronograma de sete dias de trabalho ao mesmo tempo em que cortava de forma selvagem a força de trabalho sob o seu controle. Pois o capital é absolutamente incapaz de considerações humanas. Ele conhece só uma maneira de administrar o tempo de trabalho: pela maximização da exploração do “tempo de trabalho necessário” da força de trabalho empregada, ignorando totalmente o “tempo descartável” disponível na sociedade de forma geral, pois não pode extrair lucro do mesmo.
Isto é o que impõe limites inultrapassáveis ao capital no seu modo de tratar o problema do desemprego. Há algo paradoxal, na verdade profundamente contraditório em relação a isto. Pois o sistema produtivo do capital de facto cria “tempo supérfluo” na sociedade como um todo, numa escala cada vez maior. Ainda assim ele não pode concebivelmente reconhecer a existência de juro (i.e., a legitimidade) deste tempo excedente socialmente produzido como o potencialmente mais criativo tempo descartável que todos nós temos, o qual poderia ser utilizado na nossa sociedade para a satisfação de muitas das necessidades humanas que agora são cruelmente negadas, desde exigências de educação e serviços de saúde até à eliminação da fome e desnutrição em todo o mundo. Ao contrário, o capital deve assumir uma atitude negativa/destrutiva/desumanisante em relação a isto. Na verdade, o capital deve ser rigidamente indiferente ao facto de que o conceito de “trabalho supérfluo”, com o seu “tempo supérfluo”, refere-se na realidade a seres humanos vivos e possuidores de capacidades produtivas socialmente utilizáveis – ainda que capitalisticamente redundantes ou inaplicáveis.
O conceito de tempo disponível, tomado no seu sentido positivo e libertador, como uma aspiração de socialistas, surgiu bem antes de Marx, num panfleto anónimo intitulado “A fonte e o remédio das dificuldades nacionais” (”The Source and Remedy of the National Difficulties”) , publicado em Londres quase 50 anos antes de O Capital de Marx, em 1821. Em algumas passagens citadas por Marx este panfleto oferecia uma notável compressão dialéctica tanto da natureza capitalística do processo produtivo e – ao focar a sua atenção sobre as categorias vitalmente importante do “tempo disponível”, “trabalho excedente”, “dia de trabalho abreviado” – como das possibilidades de escapar às suas contradições. Cito:
“Riqueza é tempo disponível e nada mais. … Se todo o trabalho de um país fosse suficiente somente para obter o sustento de toda a população, não haveria trabalho excedente, consequentemente nada que pudesse ser permitido acumular como capital. … Uma nação será verdadeiramente rica se não houver qualquer interesse ou se o dia de trabalho for de 6 horas ao invés de 12″. [35]
Estamos vagarosamente a alcançar a exigência, tal como nossos ancestrais o fizeram em 1821, das 6 horas de trabalho diárias, mas ainda estamos muito longe de organizar a sociedade com base no imensamente maior potencial de produção de produção de riqueza do tempo disponível. Sem este último, não pode colocar-se a questão da emancipar os indivíduos trabalhadores da tirania de determinações fetichísticas e de iniquidades gritantes. A realização de mesmo alguns dos nossos limitados objectivos exigirá mobilização em massa [36] das pessoas empregadas e desempregadas , guiadas pela solidariedade para com os problemas que todos nós somos obrigados a partilhar, hoje ou amanhã. A perspectiva estratégica num prazo mais longo, que torna factível também a realização das exigências imediatas, é inseparável da nossa consciência da viabilidade e na verdade da necessidade fundamental de adoptar o modo de controlar a nossa reprodução social metabólica com base no tempo descartável. Este é o objectivo a que precisamos dedicar recursos se nos importamos com o problema do desemprego. Só um movimento de massa socialista radical pode adoptar a alternativa estratégica de regular a reprodução social metabólica – um dever absoluto no futuro – com base no tempo descartável . Pois devido aos constrangimentos inultrapassáveis e às contradições do sistema do capital, qualquer tentativa de introduzir o tempo descartável como o regulador dos intercâmbios sociais e económicos – o que teria de significar colocar à disposição das pessoas individuais grandes quantidades de tempo livre , libertados através da redução do tempo de trabalho bem além dos limites de mesmo umas 20 horas de trabalho por semana – actuaria como dinamite social , explodindo o alto firmamento da ordem reprodutiva estabelecida. Pois o capital é totalmente incompatível com o tempo livre utilizado autonomamente e de forma significativa por indivíduos sociais livremente associados.
Notas.29 Tal como Marshall Berman afirmou no seu artigo citado na nota 10, “a crueldade estúpida autodenomina-se liberalismo (estamos a massacrá-lo e aos seus filhos ao eliminar o bem estar social para o seu próprio bem)” e vocês são “afastados ou despedidos — ou desqualificados, terciarizados (outsourced) , reduzidos (downsized) . (É fascinante verificar como muitas destas palavras trituradoras são absolutamente novas).” The Nation , 11 May 1998, p. 16.
30 Ver um poderoso capítulo acerca dos desafios enfrentados pelo movimento dos trabalhadores; “Beyond Labour and Leisure”, in Daniel Singer’s book, Whose Millennium?, publicado pela Monthly Review Press, New York, Spring 1999.
31 Dean Witter, “The Worker Backlash”, Sunday New York Times, citado numa carta enviada aos leitores e apoiantes da Monthly Review pelos seus Editores em Outubro de 1997.
32 Ibid.
33 Jeff Faux, “Hedging the neoliberal bet”, (a review of Dani Rodrick’s book, Has Globalization Gone Too Far?, Institute for International Economics, Washington D.C., 1997), in Dissent , Fall 1997, p. 120.
34 Ibid.
35 Citado no Grundrisse de Marx, Penguin Books, Harmondsworth, 1973, p. 397.
36 O Apelo citado na Nota 27 refere-se certamente à necessidade de “promover uma mobilização de massa em favor das 35 horas semanais, para afectar tanto o mundo do trabalho como da política e da cultura assim como o mundo das associações”. (”promuovere una mobilitazione di massa a favore delle 35 ore che tocchi il mondo del lavoro cosi come quello della politica, quello della cultura come quello delle associazioni.”)
*Professor Emérito de Filosofia e Teoria Política, Universidade de Sussex (Reino Unido) e autor de vários livros incluindo Beyond Capital; Marxist Theory of Alienation; Works of Sartre; Search for Freedom; Philosophy, Ideology and Social Science; The Power of Ideology .
Tradução de Jorge Figueiredo – 27-06-2003O
Como afirma Mészáros “A questão não é se o desemprego ou a “precarização flexível” vai ameaçar as pessoas ainda empregadas mas sim quando elas irão partilhar as agruras da precarização forçada. A segunda razão principal para nos preocuparmos com esta questão é porque ela representa um inultrapassável problema estrutural para o capital. Assim, é impensável que a esquerda possa desenvolver uma estratégia viável para o futuro sem dar um lugar central à questão vital do desemprego e da precarização.Tenciono hoje considerar três aspectos principais daquilo que está em jogo.
1- A “globalização” do desemprego e da precarização, afectando mesmo as partes do mundo capitalisticamente mais desenvolvidas.
2- O mito da “flexibilidade” com o qual a pílula amarga é coberta de açúcar. Pois do que estamos a falar é de facto a grave tendência socioeconómica da equalização descendente (downward equalisation) da taxa de exploração diferencial.
3- A única solução factível para os problemas que enfrentamos é abandonar as trocas socioeconómicas reguladas pela submissão à tirania do “tempo de trabalho necessário” para a emancipação através do “tempo disponível” como a alternativa positiva ao modo de reprodução social metabólica do capital.
Parte III ─ Da tirania do “tempo de trabalho necessário” à emancipação através do “tempo disponível”.
Como pode o trabalho – o antagonista estrutural do capital – reagir à tendência de deterioração inseparável do estreitamento da margem de viabilidade do capital produtivo?
Esta pergunta conduz-nos de volta ao terceiro elemento do pedido da Rifondazione para assegurar a semana de trabalho de 35 horas citada no princípio desta palestra: “mudar a sociedade” (”per cambiare la società”) . Pois hoje – em resultado da necessidade do capital de arrancar sem cerimonias[29] mesmo as suas concessões passadas, ao invés de aceder a novas – é totalmente impossível realizar mesmo os objectivos mais imediatos e limitados do sindicalismo tradicional sem tomar a rota que conduz a uma transformação social fundamental. A reconstituição radical do movimento socialista é uma parte vitalmente importante deste processo.[30]
Alguns dos mais inteligentes representantes do capital, como Dean Witter – o economista chefe e diretor de economia global do Morgan Stanley – estão prontos a confessar que a tendências em andamento são mais problemáticas do que habitualmente pintadas nos órgãos de propaganda do neoliberalismo. Num artigo publicado no Sunday New York Times, intitulado “The Worker Backlash”, ele rejeita a explicação de que os êxitos recentes resultaram da “desregulamentação e do aumento de produtividade”. A sua própria explicação, de longe mais consciente do conflito e menos reconfortante, é que foi “um realinhamento dramático do bolo económico do país, com uma fatia muito maior indo para o capital e uma mais pequena indo para o trabalho. Chamo a isto uma recuperação do trabalho triturado, que floresceu só porque a América empresarial aplicou uma pressão implacável sobre a sua força de trabalho”.[31]
Na verdade, não só a América empresarial aplica pressão implacável sobre a sua força de trabalho como também as personificações do capital fazem-no por toda a parte. Pois as conquistas reformistas do passado foram precedidas pelo crescimento contínuo do bolo – as quais surgiram sob condições econômicas favoráveis como concessões do capital, ainda que nunca pudessem ser uma questão de “realinhamento do bolo em favor do trabalho” uma vez que o capital deve sempre apropriar-se da fatia do leão. Agora, devido à crise estrutural do capital e do estreitamento da margem de viabilidade do sistema produtivo, torna-se absolutamente necessário “realinhar o bolo econômico do país”, mais do que nunca, em favor do capital, de modo a assegurar uma “recuperação do trabalho triturado”, graças à passividade e resignação da força de trabalho. Mas o que acontece quando o trabalho recusa-se a acompanhar o brutal realinhamento do bolo económico, porque não pode mais permitir-se isso devido à crescente dureza imposta pelas tradicionais e recém-inventadas formas de “economia do trabalho triturado”? As possibilidades de “realinhar” um bolo estacionário, para não falar em um processo de encolhimento, tem os seus limites bem definíveis. Não esquecer o fato de que a inatividade contemplativa (”resignatory”) do movimento dos trabalhadores não pode ser tomada simplesmente como garantida para sempre em qualquer país, como uma matéria de necessidade natural. Nem mesmo nos países capitalistas mais avançados. Não é de admirar, portanto, que hoje mesmo o economista chefe do Morgan Stanley tenha de falar acerca da “Revanche dos trabalhadores” (”The Worker Backlash”) nos EUA, dando voz às suas preocupações acerca de uma possível “luta pelo poder primário entre o capital e o trabalho” e acrescentando que “longe estão os dias de uma força de trabalho dócil que outrora concordou com as reestruturações empresariais de retalhamento e queima (slash-and-burn) “.[32]
Naturalmente, do ponto de vista do capital não pode haver respostas para a pergunta: que espécie de alternativa à “economia do trabalho triturado” deveria ser perseguida a fim de evitar “a luta pelo poder primário entre o capital e o trabalho”. Quaisquer que sejam os seus temores e preocupações, o economista chefe do Morgan Stanley deve continuar a aconselhar a sua firma acerca dos melhores meios de explorar as oportunidades da especulação financeira “globalizada”, ou ele será rapidamente despachado para pastagens mais tranquilas com um poderoso aperto de mão dourado. Do ponto de vista do capital realmente “não há alternativa” ao “trabalho triturado” tanto quanto possível – e mais ainda em situações de emergência -, mesmo que alguém perceba os perigos implícitos de perseverar nesse caminho socio-econômico. Pois no fim há sempre a sedução de soluções autoritárias, não só no país do General Suharto, cliente dos EUA, como também nas “democracia capitalistas avançadas” do Ocidente que ajudaram a colocar Suharto no poder, apoiando-o de todas as formas possíveis durante 32 anos, incluindo sua selvagem repressão militar do povo, e tentando salvar o seu miserável regime com fundos maciços do FMI até no último minuto antes da sua morte.
A promessa geral de resolver as gritantes iniquidades e contradições do sistema foi durante muito tempo – e ainda hoje continua – que através dos benefícios do sempre crescente e globalmente integrado “livre comércio” as condições dos trabalhadores melhorariam muito em todo o mundo, graças ao retorno da economia a uma situação de expansão não perturbada do capital, livre dos defeitos das décadas do pós-guerra que acabaram em inflação e estagnação. Os sinais reais e os indicadores econômicos, contudo, apontam na direcção oposta, um fato por vezes reconhecido mesmo por economistas da “corrente predominante” (mainstream) que mantêm a sua crença nas virtudes insuperáveis do sistema do capital. Assim, para citar um artigo que resenha um livro recente de um tal economista:
“Rodrick argumenta que o comércio em geral, não apenas as importações de baixos salários, piora a distribuição do rendimento. A competição internacional acrescida, escreve ele, traduz-se numa maior “elasticidade” da procura interna por trabalho. Em termos simples, isto significa que um trabalhador está agora a competir com uma oferta de trabalho muito mais vasta. Em resultado disso, uma pequena mudança nos salários de trabalhadores estrangeiros ou na procura global por um produto ou serviço pode causar grandes mudanças na procura interna de trabalhadores. A maior vulnerabilidade do trabalho a flutuações do mercado enfraquece a sua posição negocial em relação ao capital. Portanto, conclui Rodrick, “O efeito de primeira ordem do comércio parece ter sido uma redistribuição do excedente da empresa em benefício do patronato e não a ampliação do excedente”. A evidência, portanto, diz-nos que os críticos do livre comércio estavam certos; o comércio não está a ampliar a riqueza e sim a redistribuí-la para um nível mais alto”. [33]
Mas, ainda assim, quando chega à questão das alternativas, obtemos de Rodrick apenas piedosas pregações. Assim, para continuar nossa citação:
“As políticas de Rodrick são na melhor das hipóteses ingénuas. Ele aconselha o trabalho e o governo a serem mais responsáveis, mas nada tem a dizer às corporações de negócios multinacionais. … “O trabalho deveria advogar uma economia global que tivesse uma face mais humana”, escreve Rodrick, mas silencia acerca dos ferozes esforços organizados pelos negócios multinacionais e pelas finanças para impedir que políticas humanas sejam sequer consideradas pelo Fundo Monetário Internacional, pelo Banco Mundial, pela Organização Mundial de Comércio, e por outros que estabelecem as regras para o mercado global. Isto sugere um ponto de vista que está, para dizer a coisa suavemente, desligado das realidades da economia política global”. [34]
Na verdade, adoptar o ponto de vista do capital – não só na sua forma neoliberal cegamente acrítica e mais agressiva, mas também nas suas ilusórias variedades liberal-reformistas – significa desde há muito “desligar-se das realidades da economia política global”.
A novidade radical do nosso tempo é que o sistema do capital já não está em posição de conceder ao trabalho seja o que for, em contraste com as aquisições reformistas do passado. A acomodação deprimente, e mesmo a capitulação total, de alguns dos antigos partidos da classe trabalhadora às exigências dos interesses dos grandes negócios – como na Grã-Bretanha e em vários países europeus, mas de modo nenhum apenas na Europa -, uma capitulação que chega não só a manter a autoritária legislação anti-trabalhista das últimas poucas décadas como também a dar postos ministeriais chave nos governos do “New Labour”, da “Esquerda Democrática” italiana e alhures a proeminentes representantes do capital corporativo, fala inequivocamente acerca desta postura. (Lord Simon, Lord Sainsbury, Geoffrey Robinson, etc na Grã-Bretanha e figuras semelhantes na Alemanha, França e Itália). Eis porque no actual período histórico mesmo os objetivos limitados e modestos do trabalho – como a semana de 35 horas – só podem ser realizados através da “mudança de sociedade”, uma vez que objetivamente contestam a ordem socio-econômica e política estabelecidas (por outras palavras: todo o sistema de tomada de decisão) sob a qual “o bolo econômico do país” é produzido e distribuído. Nas condições da crise estrutural do capital esta é a natureza objectivamente inevitável da contestação socio-económica, mesmo que no momento muitos representantes do trabalho não conceptualizem ou articulem isto nestes termos. E esta é também a razão porque o reformismo liberal e social-democrata, o qual em outros tempos tinha um poderoso aliado no dinamismo expansionário do capital, está agora condenado à futilidade das pregações piedosas – desde os sermões do professor John Kenneth Galbraith acerca da “Cultura do contentamento” (rapidamente reflectidos, sem os mais ligeiros efeitos curativos, por Bispos e Arcebispos na Igreja da Inglaterra) à noção do “trabalho e governo inspirados pela economia global com uma face humana” citada atrás. Uma pregação que as personificações do capital provavelmente não podem ouvir.
A exigência de uma redução significativa da semana de trabalho tem uma importância estratégica fundamental. Não só porque a questão subjacente afecta profundamente e portanto preocupa directamente cada trabalhador, manual e intelectual afim, qualquer que seja a cor dos seus colarinhos. Igualmente porque a questão do enfrentamento deste desafio não está a desvanecer-se. Ao contrário, cresce em importância a cada dia que passa, e o imperativo de fazer algo significativo em relação a isto não pode ser decretado como inexistente pelas personificações parlamentares do capital nos países capitalistas avançados, nem na verdade reprimidos pelas forças nuas na “periferia” da ordem global do capital. Por outras palavras, trata-se de uma exigência estratégica vital para o trabalho porque ela é “não negociável”: isto é, não pode ser integrada nas pseudo-concessões manipuladas da ordem existente. Pois refere-se directamente à questão do controle – um sistema alternativo de controle social metabólico – ao qual o capital opõe-se frontalmente.
Naturalmente, as 35 horas de trabalho semanal – mesmo que pudessem ser genuinamente concedidas e não anuladas tortuosamente de muitas maneiras, como é cinicamente planeado ou já praticado – não poderiam resolver o monumental e sempre crescente, bem como socio-economicamente grave, problema do desemprego. Assim, a questão que legitimamente se levanta é: porque 35 e não 25 ou 20 horas por semana, que faria uma maior diferença em relação a isso? Esta é a questão que nos transporta ao coração do assunto.
As incompatibilidades radicais entre a ordem social existente e uma na qual seres humanos estejam no controle da sua actividade vital, incluindo o seu “tempo livre”, a ser posto livre por uma redução significativa da semana de trabalho, foi gráfica e penosamente ilustrado na Grã-Bretanha através da destruição da indústria mineira. Em 1984 os mineiros de carvão travaram uma luta heróica, não por dinheiro mas em defesa do seus empregos: uma longa greve de um ano que foi derrotada através dos esforços combinados do governo da sra. Thatcher – a qual chamou os mineiros de “o inimigo interno” – e o Partido Trabalhista de Neal Kinnock o qual apunhalou-os pelas costas. Como resultado, a força de trabalho dos mineiros, que na época era de mais de 150 mil, foi dizimada, caindo para o número actual de menos de 10 mil, e as cidades e aldeias de muitas comunidades mineiras foram transformadas num deserto de desemprego desumanisado. No tempo da greve dos mineiros as minas de carvão estavam ainda “nacionalizadas”, o que significa que eram administradas com os mais brutais critérios capitalistas de “eficiência” de controle autoritário pelo National Coal Board, tornando-se em seguida “privatizadas” numa fracção da sua dimensão original. O que foi altamente característico do modo como o Coal Board tratava do problema da “maior eficiência”, enquanto falava acerca da absoluta necessidade de “racionalizar” as exigências do trabalho na indústria do carvão, foi o facto de que Board dirigido pelo Estado impôs aos mineiros uma quase insano cronograma de sete dias de trabalho ao mesmo tempo em que cortava de forma selvagem a força de trabalho sob o seu controle. Pois o capital é absolutamente incapaz de considerações humanas. Ele conhece só uma maneira de administrar o tempo de trabalho: pela maximização da exploração do “tempo de trabalho necessário” da força de trabalho empregada, ignorando totalmente o “tempo descartável” disponível na sociedade de forma geral, pois não pode extrair lucro do mesmo.
Isto é o que impõe limites inultrapassáveis ao capital no seu modo de tratar o problema do desemprego. Há algo paradoxal, na verdade profundamente contraditório em relação a isto. Pois o sistema produtivo do capital de facto cria “tempo supérfluo” na sociedade como um todo, numa escala cada vez maior. Ainda assim ele não pode concebivelmente reconhecer a existência de juro (i.e., a legitimidade) deste tempo excedente socialmente produzido como o potencialmente mais criativo tempo descartável que todos nós temos, o qual poderia ser utilizado na nossa sociedade para a satisfação de muitas das necessidades humanas que agora são cruelmente negadas, desde exigências de educação e serviços de saúde até à eliminação da fome e desnutrição em todo o mundo. Ao contrário, o capital deve assumir uma atitude negativa/destrutiva/desumanisante em relação a isto. Na verdade, o capital deve ser rigidamente indiferente ao facto de que o conceito de “trabalho supérfluo”, com o seu “tempo supérfluo”, refere-se na realidade a seres humanos vivos e possuidores de capacidades produtivas socialmente utilizáveis – ainda que capitalisticamente redundantes ou inaplicáveis.
O conceito de tempo disponível, tomado no seu sentido positivo e libertador, como uma aspiração de socialistas, surgiu bem antes de Marx, num panfleto anónimo intitulado “A fonte e o remédio das dificuldades nacionais” (”The Source and Remedy of the National Difficulties”) , publicado em Londres quase 50 anos antes de O Capital de Marx, em 1821. Em algumas passagens citadas por Marx este panfleto oferecia uma notável compressão dialéctica tanto da natureza capitalística do processo produtivo e – ao focar a sua atenção sobre as categorias vitalmente importante do “tempo disponível”, “trabalho excedente”, “dia de trabalho abreviado” – como das possibilidades de escapar às suas contradições. Cito:
“Riqueza é tempo disponível e nada mais. … Se todo o trabalho de um país fosse suficiente somente para obter o sustento de toda a população, não haveria trabalho excedente, consequentemente nada que pudesse ser permitido acumular como capital. … Uma nação será verdadeiramente rica se não houver qualquer interesse ou se o dia de trabalho for de 6 horas ao invés de 12″. [35]
Estamos vagarosamente a alcançar a exigência, tal como nossos ancestrais o fizeram em 1821, das 6 horas de trabalho diárias, mas ainda estamos muito longe de organizar a sociedade com base no imensamente maior potencial de produção de produção de riqueza do tempo disponível. Sem este último, não pode colocar-se a questão da emancipar os indivíduos trabalhadores da tirania de determinações fetichísticas e de iniquidades gritantes. A realização de mesmo alguns dos nossos limitados objectivos exigirá mobilização em massa [36] das pessoas empregadas e desempregadas , guiadas pela solidariedade para com os problemas que todos nós somos obrigados a partilhar, hoje ou amanhã. A perspectiva estratégica num prazo mais longo, que torna factível também a realização das exigências imediatas, é inseparável da nossa consciência da viabilidade e na verdade da necessidade fundamental de adoptar o modo de controlar a nossa reprodução social metabólica com base no tempo descartável. Este é o objectivo a que precisamos dedicar recursos se nos importamos com o problema do desemprego. Só um movimento de massa socialista radical pode adoptar a alternativa estratégica de regular a reprodução social metabólica – um dever absoluto no futuro – com base no tempo descartável . Pois devido aos constrangimentos inultrapassáveis e às contradições do sistema do capital, qualquer tentativa de introduzir o tempo descartável como o regulador dos intercâmbios sociais e económicos – o que teria de significar colocar à disposição das pessoas individuais grandes quantidades de tempo livre , libertados através da redução do tempo de trabalho bem além dos limites de mesmo umas 20 horas de trabalho por semana – actuaria como dinamite social , explodindo o alto firmamento da ordem reprodutiva estabelecida. Pois o capital é totalmente incompatível com o tempo livre utilizado autonomamente e de forma significativa por indivíduos sociais livremente associados.
Notas.29 Tal como Marshall Berman afirmou no seu artigo citado na nota 10, “a crueldade estúpida autodenomina-se liberalismo (estamos a massacrá-lo e aos seus filhos ao eliminar o bem estar social para o seu próprio bem)” e vocês são “afastados ou despedidos — ou desqualificados, terciarizados (outsourced) , reduzidos (downsized) . (É fascinante verificar como muitas destas palavras trituradoras são absolutamente novas).” The Nation , 11 May 1998, p. 16.
30 Ver um poderoso capítulo acerca dos desafios enfrentados pelo movimento dos trabalhadores; “Beyond Labour and Leisure”, in Daniel Singer’s book, Whose Millennium?, publicado pela Monthly Review Press, New York, Spring 1999.
31 Dean Witter, “The Worker Backlash”, Sunday New York Times, citado numa carta enviada aos leitores e apoiantes da Monthly Review pelos seus Editores em Outubro de 1997.
32 Ibid.
33 Jeff Faux, “Hedging the neoliberal bet”, (a review of Dani Rodrick’s book, Has Globalization Gone Too Far?, Institute for International Economics, Washington D.C., 1997), in Dissent , Fall 1997, p. 120.
34 Ibid.
35 Citado no Grundrisse de Marx, Penguin Books, Harmondsworth, 1973, p. 397.
36 O Apelo citado na Nota 27 refere-se certamente à necessidade de “promover uma mobilização de massa em favor das 35 horas semanais, para afectar tanto o mundo do trabalho como da política e da cultura assim como o mundo das associações”. (”promuovere una mobilitazione di massa a favore delle 35 ore che tocchi il mondo del lavoro cosi come quello della politica, quello della cultura come quello delle associazioni.”)
*Professor Emérito de Filosofia e Teoria Política, Universidade de Sussex (Reino Unido) e autor de vários livros incluindo Beyond Capital; Marxist Theory of Alienation; Works of Sartre; Search for Freedom; Philosophy, Ideology and Social Science; The Power of Ideology .
Tradução de Jorge Figueiredo – 27-06-2003O
original encontra-se em: www.iran-bulletin.org/mezaros27Ib.html e www.iran-bulletin.org/mezaros28_2.html
Esse texto foi reproduzido de:
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