terça-feira, 29 de setembro de 2009

O monopólio é a causa da fome no mundo

Por Archibaldo Figueira
Bastou Luiz Inácio anunciar que pretendia fazer do Brasil "a Arábia Saudita do Biocombustível" e informar que os pobres do mundo estão comendo mais, para o imperialismo, representado por Robert Zoellick, presidente do Banco Mundial, pedir um esforço global contra o flagelo da fome, que seguirá em escalada até 2015 devido à alta dos preços dos alimentos.
Responsabilizando os biocombustíveis pela disparada dos preços alimentícios, Zoellick, como Luiz Inácio, finge não saber que apenas 50 transnacionais controlam a produção agrícola mundial, detendo a terra, os cultivos, a industrialização e a comercialização.
Voracidade
A escandalosa alta de preços do arroz, feijão, milho, soja e outras commodities vai matar 100 milhões de pessoas, sendo 10 milhões na América Latina, segundo cálculos da CEPAL, visto que a irracionalidade da chamada "globalização neoliberal" atingiu grau tão elevado, que as leis de mercado funcionam ao contrário do que apregoam os economistas de aluguel: a maior oferta, junto com a menor capacidade de compra, não resulta em queda de preços, mas no contrário.
O mito do "livre mercado" produziu concentração e centralização de capitais e recursos em poucas mãos, ou seja, fortaleceram aqueles poucos donos do mundo que intensificam a exploração e impõem os preços que bem entendem para obter o lucro máximo. Na verdade, a "globalização" não intensificou a concorrência, mas facilitou a tomada de controle do mundo por meia dúzia de potências que dão as cartas no FMI e Banco Mundial e OMC.
Sem a menor preocupação em alimentar a humanidade, os Monos-pólios condicionam diariamente a vida de todos, criando guerras reais e de mercado, infiltrando-se nos governos e meios de comunicação, concentrando enorme poder de propaganda, comprando políticos e tribunais inteiros, e se apropriando dos mercados, desde a produção até a compra direta do consumidor.
Se é assim, em âmbito doméstico, pior ainda no plano internacional, no qual o preço de cada mercadoria internacionalizada é objeto de especulação. Não há mais uma relação direta do preço com o custo de produção, que é apenas uma referência. A manipulação maior dessas empresas sobre a produção nacional e comércio internacional é um instrumento para alcançar seus lucros.
A influência desse setor sobre a política econômica da gerência Luiz Inácio é por meio do Banco Central, que monitora as taxas de juros e câmbio. Numerosos especialistas estabelecem uma correlação direta entre o aumento do preço do arroz e outros gêneros e a desvalorização do dólar. Para eles, governos (como o chinês) e os fundos de risco, que representam capitais especulativos, estão aplicando grandes somas de seus dólares, antes que se depreciem, em terras e bolsas de artigos agrícolas, como o arroz.

Supermercado
O bicho-papão dos supermercados é o Wal-Mart, com 4.500 lojas em 14 países e faturamento maior do que o produto interno bruto da Arábia Saudita e da Áustria. Em seguida, vêm Carrefour, Home Depot, Metro e Royal Ahold, segundo pesquisas do Grupo ETC, Oligopoly Inc 2005, que monitora as atividades das corporações globais, especialmente na agricultura, alimentação e farmácia.
Maior rede varejista do mundo — tem quase 1,7 milhão de funcionários —, maior companhia ianque, mais poderosa cliente das indústrias de bens de consumo, o Wal-Mart passou de um empório a uma potência cujas vendas alcançam inacreditáveis 300 bilhões de dólares ao ano. Muitos dos grandes movimentos do capitalismo americano — como a recente fusão da Procter & Gamble com a Gillette — foram resultados da enorme pressão exercida pela rede.
As prateleiras do Wal-Mart e de todos os outros supermercados do Brasil estão abarrotadas de produtos da Bunge, como as margarinas Delícia, Primor, Soya, Cyclus; os óleos Soya, Primor, Salada e Cyclus; as maioneses Primor e Soya; e azeites Delícia e Andorinha. Muitos desses óleos são transgênicos e, por determinação judicial, deveriam ter um rótulo especial para alertar o consumidor. Nunca respeitaram esse dispositivo legal. A gerência Luíz Inácio prometeu quebrar este monopólio, mas até agora não adotou nenhuma providência.
Com a Cargill e a ADM, a Bunge controla 60% da produção de soja no Brasil, para alimentar o gado na Europa. O preço e o comércio das commodities, em geral, são manipulados ainda pela Dreyfus, Syngenta e Monsanto.
Para colocar cada vez mais produtos no mercado mundial, esse grupo promove o desmatamento ilegal, inclusive com trabalho escravo, grilagem de terras públicas e violência contra comunidades locais.
A especulação desses grupos é responsável pela elevação dos preços dos cereais, principalmente o arroz, artigo que não é utilizado na produção de biocombustíveis e cuja safra atingiu o recorde de 423 milhões de toneladas. Seu preço, entretanto, mais que duplicou em um ano, passando a tonelada de 360 para 760 dólares.
Laticínios
Na área de laticínios, o mercado é manipulado por apenas três: a Nestlé, a Parmalat e a Danone. A Nestlé domina também o setor de processamento de alimentos e vende o dobro ou o triplo dos demais componentes do monopólio: Archer Daniel Midlands, Altria, PepsiCo, Unilever, Tyson Foods, Cargill, Coca-Cola, Mars e Danone.
Há décadas a Nestlé é responsabilizada pela desnutrição e morte de crianças de idade tenra, devido à suspensão precoce das campanhas em prejuízo do aleitamento materno, para expandir as vendas dos seus produtos, principalmente o leite em pó, as sopinhas e papinhas que, muitas vezes, contém até alimentos transgênicos.

Há décadas a Nestlé é responsabilizada pela desnutrição e morte de crianças devido à suspensão das campanhas do aleitamento materno, para expandir (suas) vendas principalmente do leite em pó, das sopinhas e papinhas que até contém transgênicos
Cerca de 46 milhões de crianças frequentam as 170 mil escolas fundamentais mantidas pelo poder público no Brasil. Pelo menos 30% dessas crianças só podem frequentar os bancos escolares porque é servida uma refeição na escola. E a merenda escolar também é campo para toda sorte de corrupção por parte dos monopólios.
Recentemente, o Tribunal de Contas de São Paulo descobriu uma fraude na Prefeitura de São Paulo que promoveu uma licitação para a merenda escolar.
Examinando o processo, o Tribunal de Contas percebeu que o edital fora preparado para beneficiar a Nestlé-Maggi, corporação transnacional que se comprometia a atender todas as exigências dos nutricionistas, compreendendo 7 kg de carne, 2 kg de cenoura e 3 kg de "outras" hortaliças (por 100 kg de sopa desidratada a ser distribuída). Logo após a contratação, Kassab autorizou a Nestlé-Maggi a mudar a receita da sopa, que passou a ter apenas 0,5 kg de carne, 0,8 kg de cenoura e 1 kg de "outras" hortaliças. O preço do contrato, todavia, permaneceu o mesmo.
Constatou-se que a Nutri Plus, empresa terceirizada responsável pelo fornecimento da merenda escolar, oferece um bônus mensal de R$ 40 reais às merendeiras que reduzirem a quantidade do ali-mento dos estudantes das escolas municipais, entregando maçã aos alunos pela metade; misturando pedaços de frango a legumes não previstos no cardápio ou acrescentando bastante água ao molho de tomate para a refeição render mais.
Este crime foi denunciado por nove cozinheiros de escolas municipais, que, indignados com a medida, se recusaram a receber o abono. Nem a Câmara Municipal conseguiu instalar uma comissão parlamentar de inquérito para comprovar a fraude.

Sementes e Fertilizantes
Entre 2005 e 2007, as 10 maiores indústrias de sementes, que detinham um terço comércio global, passaram a controlar a metade, e a Monsanto, após a compra da empresa mexicana Seminis, passou a controlar 90% da venda, inclusive das transgênicas, seguida pela Dupont, Syngenta, Groupe Limagrain, KWS Ag, Land O'Lakes, Sakata, Bayer Crop Sciences, Taikii, DLF Trifolium e Delta and Pine Land.
Em agrotóxicos, as 10 principais concentram 84% das vendas globais e são: Bayer, Syngenta, BASF, Dow, Monsanto, Dupont, Koor, Sumitomo, Nufarm e Arista. Os analistas dizem que, com tal nível de concentração, em breve serão apenas três: Bayer, Syngenta e BASF.
No Brasil, as lavouras de soja (33%), de milho (17%), de cana-de-açúcar (15%), café (8%) e algodão herbáceo (5%) são as maiores consumidoras de fertilizantes, respondendo por 78% do consumo nacional. Esse mercado movimenta mundialmente cerca de US$ 60 bilhões anuais. O grupo Bunge, com sede no USA, faturou R$ 18,2 bilhões em 2006 no Brasil. Só a Bunge fertilizantes tem aqui 3.000 funcionários e 60 mil clientes.

Criança implora por comida
Ao atribuir a escalada mundial dos preços dos alimentos ao aumento de consumo das massas empobrecidas, o Califa do Etanol, Luiz Inácio varreu da memória a pesquisa realizada pelos Correios no último Natal, comprovando que as crianças pediam a Papai Noel uma cesta básica digna do nome, e não os tradicionais brinquedos.
O jornal francês Le Figaro analisou a pesquisa, batizada de "Operação Papai Noel", destacando que em Pernambuco, 60% das 11 mil cartas revelavam que as crianças pobres pediam geralmente uma cesta básica, mesmo que suas famílias fossem atingidas por um dos programas caritativos e compensatórios da gerência FMI-PT.
Para o jornal francês, as cartas "têm um efeito ainda mais chocante porque as lojas experimentaram a maior explosão de consumo nos últimos 11 anos no Brasil, onde se verifica um dos mais elevados índices de desigualdade do mundo. A Operação Papai Noel demonstra que o programa de subsídios sociais instaurado pelo governo Lula não é suficiente nem para reduzir os desvios estruturais, nem para erradicar a fome.

A escassez dos alimentos
Analisando os custos da alimentação, em 2007, todos os institutos de pesquisa constataram que o preço dos artigos básicos superou de longe o reajuste de 8,57% fixado para o salário mínimo em abril, com aumentos da cesta básica variando de 11,46% em Curitiba, 24,38% em Aracaju e 29,79% em Belo Horizonte. É preciso afirmar que entre os setores mais empobrecidos da população esses índices são consideravelmente ampliados.
Os repetidos discursos de todos os integrantes da gerência FMI-PT, estimulando cultivos vinculados à monocultura latifundiária para exportação e destinados à produção de biodiesel, como soja, cana, milho e outros artigos, provocou o abandono da produção de alimentos como o feijão, que registrou um aumento de preço de 200%, em média. O desvio de finalidade de alimentos para os biocombustíveis causou também o aumento dos preços nos supermercados, como o milho em grão (50,7%), e óleos combustíveis (33,27%).
A plantação total ocupou em 2007 uma área de 46,4 milhões de hectares, 0,3% maior que a do período anterior. Os produtos que mais apresentaram incremento na produção foram: o trigo com 71,5% (1.597,7 mil toneladas); o milho 1ª e 2ª safra com 3,9% (1.999,3 mil toneladas) e o arroz com 5,5% (625,7 mil toneladas). Porém isto não acompanha as reais necessidades da população.
Como consequência, o salário mínimo necessário para suprir as despesas (alimentação, moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, transporte, lazer e previdência) de uma família de quatro pessoas seria, em dezembro, de R$ 1.803,11, de acordo com o calculo do Dieese. Isto representa 4,75 vezes o valor do salário mínimo fixado pela gerência Luiz Inácio.
O economista Heron do Carmo, da Faculdade de Economia e Administração da USP, explica que o padrão de inflação registrado em 2007 foi mais intenso para os pobres, que, segundo ele, gastam mais da metade do que ganham com comida.
Ele diz que foi um padrão diferente do que acontecia em anos anteriores, em que a alta de preços era sentida pelas pessoas com renda maior.

Agora, o domínio da terra
Com a intensificação das grandes jogadas no mercado de alimentos e produção de biocombustíveis, bancos e especuladores estrangeiros passaram a comprar maciçamente terras no Brasil, único país a dispor de campos com área e clima favoráveis à expansão da agricultura para atender às exigências das grandes potências. Esse movimento tem provocado alta no preço das propriedades rurais. Entre 2001 e 2007, o valor médio subiu 131% em reais e 219% em dólar.
AIG Capital, fundo de investimentos que já teve participação na Gol Linhas Aéreas, no Frigorífico Mercosul e na Fertilizantes Heringer, está investindo US$ 65 milhões na compra de ações da Calix Agro, subsidiária da Louis Dreyfus Commodities, criada para adquirir terras e plantar no Brasil.
A Cargill construiu ilegalmente um porto às margens do Rio Tapajós, em Santarém, no Pará, de onde exporta soja para seu terminal em Liverpool, na Inglaterra. De lá, a soja vai até a produtora Sun Valley, também de propriedade da Cargill que, por sua vez, a utiliza para alimentar frangos para produzir os nuggets, distribuídos para as lanchonetes do Mcdonalds em toda a Europa.
Texto Original Postado em:
http://www.anovademocracia.com.br/content/view/1694/105/

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