Revolução. Essa palavra que parecia haver sumido do vocabulário, depois de muitos anos em que seu uso se restringiu aos pequenos círculos de esquerda, tomou a mídia de massas em todo o mundo a partir do processo revolucionário no Egito. Trata-se de apenas uma de inúmeras expressões que anunciam novos tempos. É a realidade saldando debates que tomaram conta dos meios universitários, jogando na lata de lixo da história intelectuais pretensamente visionários que, com rios de tinta e vozes pomposas, prognosticaram o “fim da história”, o “fim da luta de classes”, o “fim da classe operária” ou a “vitória final” do capitalismo com a restauração capitalista nos ex-estados operários. Abram caminho para o movimento de massa, para a luta de classes e para a juventude que anunciam o fim da etapa que ficou conhecida como neoliberalismo, em que a juventude, os trabalhadores e o povo pobre sofreram ataques de magnitude histórica, não somente às suas condições materiais de vida, mas à sua subjetividade e anseios de transformar as condições de vida.
Vivemos a aurora de novos tempos, catalizados por uma crise econômica que estourou a quase três anos, que teve como resposta da burguesia e seus Estados com resgates bilionários aos capitalistas – socialização das perdas, privatização dos lucros – e que já vinha, particularmente na Europa, apresentando uma resistência de massas aos “planos de ajuste”, ou seja, aos ataques aos trabalhadores, ao povo pobre e a juventude. Os meios de comunicação também não puderam ocultar as manifestações de massa e greves gerais na Grécia e França. Ali, assim como na Inglaterra e outros países, a juventude colocava sua marca. Não faltaram greves estudantis, piquetes, enfrentamentos contra a polícia, luta contra os ataques à educação e manifestações em aliança com os trabalhadores para barrar os ataques. Não é por menos que voltaram aos jornais, no “Outubro Francês”, comparações com 1968. O mesmo “fantasma” que agora atinge o coração do sistema capitalista mundial, no estado de Wisconsin (e agora se estende a Indiana e Ohio), nos EUA, onde o funcionalismo público, junto aos estudantes, vem lutando contra os ataques aos seus direitos e sua liberdade de organização sindical e protagonizaram as maiores mobilizações desde 68. Na cidade de Oaxaca, no México, os professores, que em 2006 protagonizaram a histórica “Comuna de Oaxaca” estão impulsionando mobilizações intensas e mostram que o “ar fresco” da luta de classes também vai chegando à América Latina. Poderíamos continuar citando países, como Portugal, Croácia e outros, onde a luta de classes e a juventude entram na cena política.
Foi neste marco internacional que floresceu a “primavera árabe”, que representa um salto político, ainda que não está claro o resultado que terá o processo que está plenamente em curso, numa situação convulsiva, onde o movimento de massas terá que seguir se enfrentando não somente as burguesias locais mas o imperialismo, que tentam conter o impulso revolucionário das massas e canalizá-lo para as vias institucionais, com desvios eleitorais ou alimentando ilusões de que é possível conciliar os interesses da juventude precarizada, dos trabalhadores e do povo pobre com os setores burgueses dos mesmos regimes que estão caindo, concedendo uma ou outra reforma parcial, para que de conjunto seus objetivos, e do imperialismo, na região e no mundo não sejam afetados.
O presente e o futuro do Brasil
Os corações e mentes de milhares de jovens brasileiros que estão se mobilizando contra o aumento das passagens do transporte público em São Paulo e outras cidades do país, que estão entrando nas universidades e buscando conhecer o movimento estudantil e a esquerda, que estão seguindo os processos da luta de classes internacional e se estimulam a ser parte dessa juventude que levanta a cabeça internacionalmente, são um pequeno anúncio no Brasil de que este futuro que está sendo construído nas ruas, universidades, escolas e fábricas de todo o mundo, também será construído aqui, e que a juventude brasileira também começa a assumir a tarefa de enfrentar-se com a decadência do sistema capitalista e suas mazelas. Trata-se de um verdadeiro alento numa situação nacional marcada pela passividade, construída nos últimos anos de lulismo, onde o que se propaga por todos os lados é que o Brasil está rumando para ser uma potência, o “país do futuro”, como se estivéssemos numa bolha inabalável frente aos desequilíbrios e impactos da economia e da luta de classes internacional. Nada mais falso.
Olhemos primeiro para o presente. Depois de alguns anos de crescimento recorde, o Brasil continua sendo um país onde as pessoas morrem anualmente nas enchentes que escancaram o problema crônico da habitação, onde a polícia é das mais assassinas do mundo e agora ocupa militarmente as favelas junto ao exército que Lula treinou na ocupação militar do Haiti, onde milhares de mulheres morrem por aborto clandestino, onde os torturadores da ditadura seguem impunes, onde as pessoas não heterossexuais não tem nenhum direito e são atacados por grupos fascistas, onde os índices de trabalho precário é dos maiores do mundo, onde a universidade pública é profundamente elitista e racista e deixa pra fora dela a enorme maioria da juventude, e um longo etc. Podemos dizer que “nunca antes na história deste país”, ficou tão claro que o crescimento econômico não é para melhorar as condições de trabalho e de vida da maioria da população, mas sim para criar no Brasil mais alguns bilionários para entrarem no ranking da Revista Forbes. Mais do que um “país de todos”, trata-se do país dos monopólios, dos políticos corruptos e da submissão ao imperialismo, como mostra a viagem que Obama fará ao Brasil pra tentar se legitimar (com direito a discurso na Cinelândia e tudo mais) justamente quando em poucos lugares do mundo ele poderia ir sem enfrentar protestos.
Mas o futuro que nos espera é melhor? É o que todos dizem, mas vejamos se o crescimento “nunca antes visto na história deste país” é capaz de sustentar-se frente à crise econômica internacional que segue persistente apesar de todas as medidas tomadas para salvar os capitalistas. As principais bases de sustentação do crescimento foram o boom de exportação de commodities para a China e a transformação do Brasil num paraíso para o capital especulativo que migrou dos países centrais em crise para se multiplicar num dos países com os juros mais altos do mundo, elementos que motorizaram o crédito e a ampliação do consumo da população. Ou seja, nosso crescimento econômico, como não poderia deixar de ser, é profundamente vinculado e dependente da economia internacional e do imperialismo e, portanto, tendem à decadência apesar de que em ritmos distintos do resto do mundo. Os anúncios de cortes no orçamento do governo Dilma é só uma das expressões de que o governo sabe bem disso. Se o “Brasil do presente” não é capaz de convencer estes ideólogos (alguns sabem que estão errados, mas vendem suas idéias por interesses materiais) que o Brasil não pode ser o “país do futuro” nas mãos dos monopólios e dos políticos burgueses, o Brasil do futuro (verdadeiro e não fictício) vai saldar estes debates. Aqui também veremos rios de tinta e vozes pomposas mostrarem sua fragilidade frente à realidade.
Fonte: http://www.ler-qi.org
Vozes e ações deverão ser mobilizadas para que a esquerda se manifeste. Será que será preciso alguém atirar fogo no próprio corpo como um estupim que desencadeie essas reivindicalões em forma de protexto? Maura
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