Por Claudemir Mazucheli Canhin*
“Se, na verdade, não estou no mundo para simplesmente a ele me adaptar, mas para transformá-lo; se não é possível mudá-lo sem um certo sonho ou projeto de mundo, devo usar toda possibilidade que tenha para não apenas falar de minha utopia, mas participar de práticas com ela coerentes”. (Paulo Freire)
Nos últimos anos, nós professores temos sofrido ataques crescentes tanto do governo do Serra (Maria Helena/Paulo Renato) como do governo Lula (Hadad). Esses “ataques” vieram travestidos de avanços nas políticas educacionais (legislação e currículo). Podemos citar como exemplo a lógica da flexibilização e retirada de direitos, preconizadas no PDE de Lula, que estabelece um plano de carreira cargos e salários para os profissionais da educação, cujo princípio é a “meritocracia”, a formação e a avaliação do desempenho”, medidas também previstas nas 10 metas de Serra aprovadas pela Lei 1097/09.
O processo de precarização da educação pública não é novo. A vinculação de verbas para a educação foi burlada por FHC através da DRU, mantida por Lula, acarretando uma perda de quase 33 bilhões. FHC normatizou o financiamento da educação fundamental com o FUNDEF, causando também danos à organização dos demais níveis de ensino. Acelerou a municipalização, gerou distorções nas matriculas, sem contar os desvios de verbas. Lula, não rompeu com o financiamento por fundos, e com o FUNDEB aprofundou os problemas. O CONAE está organizado para validar as políticas de educação do Banco Mundial patrocinadas por Lula, como no caso da Reforma do Ensino Médio. Em São Paulo, desde Covas assistimos a ataques com a desestruturação da carreira via LC 836/97, a tentativa de transferência dos OFAs para o INSS, a municipalização, a superlotação de salas e o fechamento de outras, a desestruturação do EJA, etc.
Essas políticas educacionais têm, ao mesmo tempo, confundido, encurralado e desarticulado a classe docente além de provocar um desânimo generalizado nessa categoria que há muito tempo sofre com as péssimas condições de trabalho.
A “tropa de choque” de Lula/Serra, sistematicamente soube aproveitar essa situação e arquitetaram estratégias para “empurrar goela abaixo” dos profissionais da educação mudanças na legislação e no currículo que têm caminhado no sentido contrário à uma escola essencialmente pública e de qualidade.
Diante dessa situação o professor encontra-se encurralado nas escolas, que a cada dia se parecem mais com “depósitos de gente” onde imperam a violência, a intolerância e a reprodução dos mecanismos de desagregação social.
E a aprendizagem? Aqui em São Paulo estamos aplicando os currículos apostilados, ou seja, estão nos transformando em meros aplicadores conteúdos! E a liberdade de cátedra está sendo jogada “na lata do lixo”.
E não é só isso! Nós não estamos conseguindo “fagocitar” toda essa miscelânea legal criada “a toque de caixa” por nossos “representantes” (tanto nas esferas estaduais como federais). Resultado: a desinformação, a enganação, a confusão têm povoado a cabeça de muitos professores e professoras. Esse é um caldo atraente para produção de injustiças.
A direção majoritária da APEOESP se alinha a Lula e defende políticas que contribuem com os ataques à educação pública-estatal. (Não se pode confundir o papel do sindicato com o dos governos).
Um leitor-telespectador-ouvinte desavisado pode “comprar” esse discurso midiático, simplesmente, por desconhecer o dia-a-dia de um profissional da educação. Desconhecem os meandros da “vida atribulada” de um(a) professor(a), com dupla ou tripla jornada (no caso das professoras), com uma carga de trabalho estafante, que em alguns casos pode chegar ás 80h/aula por semana (necessária para manter o mínimo de conforto para família), que diariamente perde preciosas horas de sono ou de convívio familiar para apresentar em tempo hábil: seus projetos didáticos, sua planilhas de notas e faltas, suas devolutivas aos discentes, suas orientações aos pais, seu trabalho sindical, etc
Esse leitor desavisado não desconfia que muitas unidades escolares são verdadeiros “feudos” controlados por déspotas esclarecidos (supervisores, diretores, vice-diretores, coordenadores etc.) que oprimem os profissionais que ali trabalham negando-lhes informações preciosíssimas à sua ascensão funcional (sindical,pedagógica,trabalhista,etc) ou até superresplorando os servidores que não estão ligado diretamente a orientação pedagógica.
Será que realmente o principal culpado por esse estado de coisas é o professor? Acredito que não.
Diante desse oceano de desestímulo muitas vozes se levantam, indignadas e passam a denunciar tais mazelas. Mesmo sendo taxados de subversivos, comunistas, esquerdistas, sectários, dinossauros, baderneiros, radicais, etc, não se calam! Seguem os mesmos ideais de Paulo Freire, não aceitando e não se adaptando ao atual sistema de coisas, lutando diuturnamente para transformar o mundo a sua volta.
Não somos incompetentes! Somos verdadeiros heróis, pois apesar das mazelas que nos assola não deixamos de acreditar em nossas utopias. Muito pelo contrario, estamos sempre busca de uma prática coerente a tais utopias. Pois, acreditamos que "O mundo não é, o mundo está sendo".(Freire).
Os professores e as professoras devem ser os protagonistas desse processo, não somente meros observadores. Para tanto é necessário construir um projeto estratégico de resistência ao liberalismo, retomando amplas mobilizações e discutindo o papel da escola para combater seu caráter elitista e de instrumento de controle social. Por onde começar? Nas HTPCs, é claro! Pois esse é espaço de excelência para o trabalho. É o espaço ideal para reflexões tanto dos processos de ensino aprendizagem como também para traçar estratégias para a melhoria da escola pública.
Nesse sentido é importante trazer para o centro do debate os pontos centrais, que ao meu ver, podem revolucionar a educação brasileira. È importante, portanto, lutar por:
Concepção de escola: Defendemos a escola em tempo integral, a combinação entre o ensino propedêutico e o ensino prático. Que o princípio educativo seja o trabalho (principal relação entre a sociedade e a natureza). E que sua principal função seja a construção da consciência de classe, e sua conclusão mais importante seja a constatação dos interesses irreconciliáveis entre a classe dominante (burguesia) e a classe dominada (trabalhadores). Educar para a cidadania é um engodo, pois ela desde os tempos da antiguidade é um conceito excludente (na Grécia antiga- Atenas, o cidadão era apenas o homem grego: escravos, mulheres e estrangeiros não eram cidadãos). Portanto, para a burguesia, cidadania significa consumidor. Para tanto essa escola deve ser pública-estatal laica, propiciadora da construção/apropriação do conhecimento e um dos instrumentos de construção do socialismo. A luta por ela implica na unidade das lutas sindical e educacional; é impossível que ela tenha qualidade sem o atendimento das nossas reivindicações salariais e funcionais; é uma utopia reacionária pensar em melhorar o ensino sem melhorar as condições de trabalho;
Remuneração Justa: Nossas reivindicações salariais e funcionais são educacionais e vice-versa. Exigimos piso do DIEESE por 20 h/aula, incorporação dos abonos e gratificações com extensão aos aposentados, reposição das perdas salariais, fim da promoção automática e redução do número de alunos por sala, 1/3 de hora-atividade rumo aos 50%, reequipamento de todas as escolas e melhoria da infra-estrutura didático pedagógica, etc.
Plano de Carreira Digno: Defendemos um sistema de carreira única e aberta, com reajustes lineares e evolução funcional por tempo de serviço e titulação, sem prazo de interstício Escala de vencimento único para os trabalhadores em educação e sem limite de evolução dentro da escala, evolução funcional baseada no tempo de serviço e formação profissional, contra a avaliação de desempenho. Estabilidade para todos os OFA's (Ocupantes de Função Atividade) e concurso público classificatório para os novos ingressantes. Defendemos jornada de 20h/aula de 45min sendo 5h de HTPC's e 5h em local de livre escolha Número máximo de alunos por sala de aula de 15 para E.F. Ciclo I, 20 para o Ciclo 11 e 25 para E.M., contra a LC 1094/2009, que impõe as jornadas de 12h e 40h, com salário proporcional. Exigência de imediata implementação da jornada com 1/3 de hora atividade (lei do piso nacional), rumo aos 50% de hora atividade. Reajustes lineares para a categoria, incorporação e extensão aos aposentados de todas as gratificações, pagamento automático de todos os beneficios e progressões. Contra a polltica de gratificaçoes e bonificações, inclusive as oriundas de avaliaçóes de desempenho de professores e alunos.
Avaliação Global do processo ensino-aprendizagem: Deve ser diagnostica, do processo ensino-aprendizagem e não dos agentes (professores e alunos) e estar a serviço de uma política educacional de total autonomia escolar, em função da classe trabalhadora A avaliação educacional e da aprendizagem deve ser um processo de ruptura e continuidade feita pelo conjunto da comunidade escolar. Pelo fim das Diretorias de Ensino Pelo fim dos órgãos de supervisão escolar. Somos contra a inspeção escolar, defendemos a autonomia didática, pedagógica e administrativa Currículo: Para nós, os programas e as grades curriculares devem ser abertos, elaborados democraticamente e com ampla liberdade de cátedra. Defendemos também a obrigatoriedade de todos os níveis da educação básica, do ensino infantil ao ensino médio. Defendemos o fim do vestibular e o livre acesso a todos os que queiram entrar nas universidades públicas
Mais Financiamento público para a Educação: Queremos também uma pretensa melhoria das verbas para a educação com recursos do pré-sal é pura demagogia. A proposta de marco regulatório feita por Lula permite que 70% do petróleo vá para as multinacionais; e a burguesia reclama por achar pouco. Exigimos uma Petrobrás 100% estatal, com toda sua arrecadação voltada para as áreas sociais, garantindo 15% do PIB para a educação. Defendemos a imediata aplicação de 10% do PIS rumo aos 15% Contra a polltica de fundos, portanto contra o Fundeb. Verbas públicas apenas para as escolas públicas e diretamente para a Unidade Escolar.
Formação permanente dos professores: Formação permanente nas universidades públicas, afastamento remunerado durante três meses a cada dois anos para cursos (atualização, aperfeiçoamento e especialização) e com vencimentos integrais para mestrado e doutorado.
Gestão escolar democrática : A direção de escola deve ser eleita pelo voto direto e secreto, com mandato de dois anos, revogável. Defendemos a eleição dos coordenadores pelos Conselhos de Escolas. Conselhos de Escola paritários e deliberativos em conjunto com a organização de grêmios livres, que teriam assento nesses Conselho de Escolas;
"Educação não transforma o mundo.
Educação muda pessoas.
Pessoas transformam o mundo".
*Professor de Geografia da Rede de Ensino do Estado de São Paulo.
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