terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Direitos trabalhistas: fogo amigo?


“Se você pensa que nós fomos embora,
nós enganemos vocês,
fingimos que fomos e voltemos
Ó nós aqui outra vez.”
Adorinan Barbosa

A genial música de Adorinan remete à idéia da volta de algo bom, da alegria, da picardia. No entanto, neste momento é possível associá-la a algo contrário, a uma matéria publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo. Diz o seguinte o artigo do Estadão: “A flexibilização da Consolidação das Leis o Trabalho (CLT) está sendo reintroduzida na agenda política do País. Só que, desta vez, por iniciativa do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC e da Central Única dos Trabalhadores (CUT) - justamente as entidades que, até há pouco tempo, mais resistiam à adoção do princípio de que o negociado entre patrões e empregados deve prevalecer sobre o que está previsto na legislação.”
Como é sabido, essa fórmula - o negociado prevalece sobre o legislado - alteraria o artigo 618 da CLT, cujo conceito é exatamente o oposto: o legislado deve prevalecer sobre o negociado. O texto da CLT simplesmente garante que nenhum acordo coletivo assinado entre entidades sindicais e patronais pode ser inferior ao que esteja regulamentado em lei. Os acordos podem ser superiores ao que está regido ali, mas nunca inferiores. Portanto 13º terceiro, férias, além de outros direitos seriam “imexíveis”(parodiando um antigo e malandro ex-ministro do trabalho). Com a simples inversão da ordem da frase, estes e outros direitos poderiam ser “negociados” pelas direções sindicais e patronais.
Segue Informando o Estadão: “A primeira proposta com esse objetivo foi apresentada há 12 anos, durante o governo Fernando Henrique. No último ano de seu governo, ele anunciou um projeto de lei que alterava o artigo 618 da CLT, permitindo que os acordos coletivos tivessem força de lei. Por causa das críticas dos sindicatos trabalhistas e do PT, a proposta acabou sendo engavetada.”
E ainda corretamente o jornal acrescenta: “cinco anos depois, o presidente Lula retomou a discussão, lançando dois projetos articulados - o da reforma sindical e o da reforma trabalhista - com o objetivo de flexibilizar a CLT.” À época o próprio Lula tratou de não deixar dúvidas. Declarou publicamente que o governo estava firmemente convencido de que seria necessária uma ampla flexibilização dos direitos dos trabalhadores. O argumento era a mesma e surrada conversa dos empresários e governos anteriores, de que a flexibilização facilitaria a geração de empregos. Mais tarde, devido a reações e mobilizações contrárias e para evitar desgastes políticos que prejudicassem a reeleição de Lula, o governo engavetou os dois projetos.
O artigo do Estadão, como seria de se esperar, elogia a possível iniciativa do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC apoiada pela CUT. Afirma que “felizmente” há dirigentes sindicais que mudaram e se modernizaram. É natural essa opinião do jornal à medida que sua linha editorial é favorável ao neoliberalismo. Obviamente nossas posições vão em sentido oposto.
São muitas as citações que poderíamos buscar nos textos dos acordos feitos pelo Brasil com os chamados “organismos multilaterais”, como o FMI, o Banco Mundial, que demonstram o interesse do capital financeiro internacional e das grandes corporações econômicas na realização de uma reforma dessa natureza em nosso país, já há algum tempo. Ficamos aqui apenas com uma, presente no contrato referente a empréstimo feito pelo Banco Mundial ao nosso país. Este documento, “Primeiro empréstimo programático para um crescimento sustentável e equitativo, na quantia de US$505,5 milhões para o Brasil”, foi assinado pelo governo brasileiro em 29 de fevereiro de 2004 (primeiro governo Lula) e sua íntegra encontra-se no site do Banco Mundial. No item 217, fala o seguinte: “Análise recente das regulamentações do mercado de trabalho, instituições e resultados no Brasil, nos levaram a fazer fortes recome ndações: eliminar os subsídios para demissões, tais como o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), deslocar as negociações dos Tribunais Trabalhistas para os locais de trabalho, reduzir os benefícios não vinculados aos salários.....Estas políticas iriam alinhar os incentivos aos trabalhadores com o aumento da produtividade...”.
Não é de hoje que o capital busca retirar direitos da nossa classe, como também não é novidade o fato de diferentes governos se alinharem ao capital e apresentarem projetos neste sentido. Qual é a novidade então? Caso se confirme a notícia do Estadão, seria “a primeira vez na história desse país” – como gosta de afirmar o ex-presidente Lula – que um Sindicato de Trabalhadores, apoiado por uma Central, toma tamanha iniciativa. Isso simbolizaria um salto de qualidade no papel que a CUT e parte de sindicatos a ela filiados vêm cumprido ao longo dos oito anos de governo do PT. Significaria saltar da posição de apoiadores e ferrenhos defensores das políticas do governo no seio do movimento sindical e popular, para o de encabeçadores de ataques aos direitos trabalhistas. O artigo foi publicado dia 02 de janeiro. Até agora não houve nenhum desmentido, nem de dirigentes do Sindicato, muito menos de dir igentes da CUT. Algo grave assim mereceria nota, tanto do presidente dos Metalúrgicos do ABC, como do Artur Henrique - presidente da CUT.
De nossa parte, não só nos opomos a qualquer retirada dos pouquíssimos direitos que existem, como defendemos a sua ampliação. Por isso a CSP-Conlutas está na primeira fila, junto com várias entidades do movimento sindical e popular, na construção de uma ampla unidade entre diferentes setores. Essa unidade é fundamental para defender os pequenos direitos atuais e conquistar outros tão necessários à nossa classe. Portanto o grande capital e seus aliados saibam: resgataremos a música de Adorinan e faremos dela o nosso hino, colocando milhares na rua em defesa dos direitos dos trabalhadores.
Mauro Puerro (Diretor do SINPRO de Guarulhos e membro da Secretaria Executiva Nacional da CSP-Conlutas/Central Sindical e Popular)
Fonte: http://www.sinproguarulhos.org.br/mauro_puerro_texto.asp

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