domingo, 21 de abril de 2013

CAPITALISMO DEPENDENTE E TRANSIÇÃO AO SOCIALISMO NO BRASIL



A crise do sistema capitalista tem colocado na ordem do dia a questão da transição ao socialismo. No Brasil, várias teorias têm apontado caminhos distintos (nem sempre revolucionários) para a classe trabalhadora, porém, o nosso próprio processo histórico, marcado pela dependência externa e por uma série de transições mal resolvidas, nos dá clara noção sobre a necessidade de uma ruptura profunda (e ainda inédita) com as classes dominantes nacionais e internacionais. 

O elemento forasteiro como fator determinante nas transiçõesO desenvolvimento histórico brasileiro é marcado por uma série de rupturas políticas e econômicas limitadas no que concerne às transformações realizadas, no geral lentas e graduais. Uma característica em comum é a não participação efetiva das massas e a consequente falta de conquistas para as mesmas.
Nestes momentos de extrema contradição entre o velho e o novo as elites conseguem garantir os seus interesses, permitindo apenas que mudanças historicamente inevitáveis aconteçam e mantendo sua hegemonia de classe num processo lento de modernizações (inclusive de si mesmas).
Estas rupturas, em que os melhores exemplos são a construção de um Estado politicamente independente (cujo auge se dá no rompimento com Portugal em 1822) e a instituição da república burguesa em 1889/1891, encaixam-se no que Gramsci classificou como “revolução-restauração” ou “revolução passiva” quando analisou a história italiana. Sendo importante notar que esse problema não é uma exclusividade brasileira e muito menos fruto da apatia ou da cordialidade do nosso povo, como prega o senso comum.
Aparentemente fruto da ignorância, essas distorções cumprem uma função conservadora, fazendo com que as massas aceitem para si o papel de espectadoras, prejudicando a construção da própria consciência de classe dos trabalhadores. É um “fantasma” que deve ser devidamente exorcizado pelo método científico de análise histórica.
Ao observarmos os processos de transição nacionais percebemos que a causa do caráter conservador destes está na infiltração de interesses estrangeiros, conseqüência do papel auxiliar e dependente desempenhado pelo Brasil após a conquista portuguesa. Esses interesses alienígenas apresentam-se até mesmo como elementos importantes e causadores das rupturas, que acabam culminando pela combinação de uma série de contradições internas e externas.
A presença do elemento forasteiro age como o “fiel da balança” nos momentos de aguçamento político, seja para brecar ou para alavancar determinadas transformações, mas sem nunca romper com os interesses próprios e de seus aliados internos da classe dominante.

O desenvolvimento desigual e combinado entre o Brasil e o “centro” do mundo
Uma das grandes contribuições de Lênin às ciências sociais foi analisar e compreender o desenvolvimento desigual do capitalismo entre as nações. Trotsky (apesar de todos os problemas conhecidos por todos) vai além e sistematiza algumas características do desenvolvimento histórico dos povos, não apenas como desigual, mas também como combinado.
No Brasil diversos autores buscaram compreender o papel do elemento estrangeiro no processo histórico nacional (tanto no geral quanto em momentos específicos), como Caio Prado Júnior, Nelson Werneck Sodré, Florestan Fernandes, Theotônio dos Santos, etc.
Caio Prado Júnior, através do que chamou de “Sentido da Colonização”, foi o primeiro autor de destaque a generalizar o desenvolvimento histórico brasileiro como subserviente aos interesses externos, mas foi na chamada “Teoria da Dependência” que, através de autores como Theotônio dos Santos, a análise dessa relação atingiu uma formulação mais madura.
Na justa compreensão da relação de dependência entre o Brasil e os centros econômicos mundiais está a chave para o entendimento das insuficiências nas rupturas de nossa história.

A origem da dependência
A primeira superestrutura política formada no território onde hoje existe o Brasil não foi nada mais do que um apêndice do Estado português. Sua função era garantir a exploração da região para abastecer a Europa. Esse Estado colonial, montado inicialmente de fora para dentro, se desenvolveu junto das demais atividades da colônia, também voltadas para a sustentação da metrópole. Neste processo, surgiu uma elite latifundiária, responsável por exercer o domínio de classe do Estado colonial, cumprindo a função de “capataz” da metrópole e compartilhando com a mesma os ganhos da espoliação colonial, numa relação nem sempre harmônica.
Esse caráter alienígena da infraestrutura e da superestrutura, forjado durante os três séculos de exploração colonial, moldou em todos os aspectos a sociedade brasileira, estabelecendo uma função muito bem definida no mundo globalizado, possível apenas por causa da discrepância entre o desenvolvimento das forças produtivas internas e externas.
Graças ao enraizamento desse caráter auxiliar na sociedade colonial e a continuidade (e por vezes aprofundamento) da desigualdade entre as nações, o papel do Brasil continuou a ser suplementar aos países mais desenvolvidos, inclusive após o rompimento entre o Estado brasileiro e a metrópole portuguesa. Na construção da sociedade burguesa merece destaque o papel que a Inglaterra jogou, permitindo uma abolição real da escravidão de forma gradual, paralela à modernização da própria elite latifundiária (ou pelo menos grande parte desta) e sua adaptação ao capitalismo global/ imperialismo.
No século 20 o dilema entre uma nação soberana ou dependente tornou-se mais agudo e as disputas entre aqueles que representavam ambos os caminhos estiveram no centro das contradições durante os momentos mais determinantes da república, como na Era Vargas ou no Golpe de 1964. Até hoje esse problema é presente, principalmente na luta contra o neoliberalismo. Porém, mesmo com os avanços conquistados através dos governos Lula e Dilma, tem ficado cada vez mais claro que só o socialismo poderá dar um fim positivo à questão.

Transição ao socialismo: Reforma ou Revolução?
Uma análise superficial dessas limitações presentes nas transições brasileiras tem levado até mesmo alguns setores progressistas à confusão, fazendo renascer no Brasil concepções equivocadas, sugerindo inclusive a possibilidade de transição passiva ao socialismo, sem grandes conflitos e até mesmo em aliança com setores da burguesia nacional (secundarizando ou até mesmo negando a luta de classes).
Um dos autores mais usados na fundamentação dessas concepções é Gramsci, justamente por causa dos seus (já citados) estudos sobre as revoluções “passivas”. Entretanto, outros autores clássicos, como Lânin ou até mesmo o próprio Marx, contribuem para uma análise científica deste tipo de fenômeno sem dar qualquer margem para interpretações reformistas.
Na Alemanha também houve um processo de desenvolvimento capitalista originado “de cima pra baixo” que teve eixo nas relações com países mais avançados, como observou Marx (Contribuição à Crítica da Filosofia do Direito de Hegel). Estudando a questão, Lênin foi mais fundo e sua análise sobre a chamada “Via Prussiana de Desenvolvimento Capitalista” relacionou muito bem as ligações entre infraestrutura e superestrutura nestas revoluções “feitas pelo alto”.
A existência desse tipo de fenômeno na história europeia jamais serviu de ferramenta para que estes autores viessem a defender qualquer forma de transição não revolucionária ao socialismo (o que seria contraditório com a própria trajetória de lutas do marxismo-leninismo). Não há motivos para crer que hoje em dia a situação tenha mudado, muito menos no caso brasileiro.
Aqui, a relação de dependência foi justamente o fator que permitiu a não radicalização dos processos de ruptura, logo, é impossível pensar em uma transição passiva, não revolucionária, que ainda rompa com a subordinação aos interesses estrangeiros. A própria burguesia brasileira já se mostrou subserviente e os poucos setores desta que ousaram apontar um rumo diferente foram rapidamente extirpados da cena política.
As lições da história nacional para o socialismo têm sido retiradas de “cabeça para baixo” por estes setores confusos. A transição ao socialismo não deve seguir a tradição dos processos anteriores, deve fazer justamente o contrário, inclusive para poder existir. É uma herança que o povo brasileiro deve renunciar.
Só será possível realizar uma transição pela via passiva se não houver mudanças sociais profundas e muito menos o rompimento com o imperialismo. Se falamos de transição ao socialismo, isso inclui necessariamente transformações radicais, possíveis apenas pela via revolucionária.
A crise do capitalismo no final do século 19 e início do século 20 tornou vivo o debate entre reforma ou revolução. Ao entrarmos no século 21 o sistema capitalista apresenta-se novamente em estágio crítico e essas vias chocam-se outra vez. Cabe a nós encontrarmos a justa solução destas contradições, assim como fizeram Lênin e os comunistas no século passado, abrindo caminho para a emancipação do ser humano e a independência dos povos.

“Assim será o século 21, em seus começos haverá sombras e luzes, mais sombras do que luzes. Depois o quadro se inverterá e a humanidade viverá tempos de grandes esperanças”. João Amazonas

Referências
BUONICORE, Augusto. As Transições na História Brasileira. Portal Vermelho, S/D.
CARVALHO, José Reinaldo. Anti-imperialismo é a Essência do Movimento de Solidariedade. Portal Vermelho, 2011.
FERNANDES, Florestan. A Revolução Burguesa no Brasil. Rio de Janeiro, Zahar, 1975.
FERNANDES, Florestan. Capitalismo Dependente e Classes Sociais na América Latina. Rio de Janeiro, Zahar, 1981.
GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere, vol. 5. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2002.
LÊNIN, Vladmir. El Programa Agrario de La Socialdemocracia En La Primera Revolución Rusa de 1905 – 1907. Moscou, Progreso, 1980.
LÊNIN, Vladmir. Imperialismo, Fase Superior do Capitalismo. São Paulo, Global, 1985.
MARX, Karl. Contribuição à Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. Disponível em: marxists.org/portugues.
PRADO JR., Caio. Formação do Brasil Contemporâneo. São Paulo, Publifolha, 2000.
PRADO JR., Caio. História Econômica do Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1998.
RUY, José Carlos. Os Abismos da Revolução-conciliação e Reforma na Política Brasileira. Revista Princípios 49, São Paulo, Anita Garibaldi, 1998.
SANTOS, Theotônio dos. A Estrutura da Dependência. American Economic Review, 1970.
SODRÉ, Nelson Werneck. As Razões da Independência. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1978.
SODRÉ, Nelson Werneck. Vida e Morte da Ditadura: 20 Anos de Autoritarismo no Brasil. Petrópolis, Vozes, 1984.
TROTSKY, Leon. História de la Revolución Rusa. Madrid, Sarpe, 1985.

Escrito pelo autor do blog e publicado originalmente no Portal Vermelho

sábado, 20 de abril de 2013

Comunismo: um gigantesco processo de emancipação ainda longe de concluído


por Domenico Losurdo [*]

Continuo a julgar correcta a visão da ideologia alemã, segundo a qual o comunismo é sobretudo "o movimento real que abole o actual estado de coisas". Observemos as mutações que se verificaram no mundo a partir da primeira revolução que se reclamou de Marx e Engels. Antes de Outubro de 1917 não havia democracia, mesmo no Ocidente: era o reino das três grandes discriminações para com as mulheres, as classes subalternas, os povos coloniais e de origem colonial.

Com Fevereiro e Outubro de 1917, a Rússia revolucionária reconheceu às mulheres direitos políticos e activos e passivos. A República de Weimar (nascida da revolução que explodiu na Alemanha um ano após a revolução de Outubro) tomou o mesmo caminho, seguido pelos Estados Unidos. É certo que na Itália, Alemanha, Áustria e Inglaterra o sufrágio universal (masculino) estava mais ou menos afirmado, mas ficava neutralizado por uma Câmara alta que permanecia o apanágio da nobreza e da grande burguesia.

A discriminação racial apresentava-se sob uma forma dupla: considerados como indignos de se constituírem como Estado nacional independente, os povos coloniais eram submetidos à dominação absoluta das grandes potências. Num país como os EUA, os afro-americanos eram excluídos dos direitos políticos (e por vezes mesmo dos direitos cívicos). A ultrapassagem da discriminação racial sob estes dois aspectos não pode ser pensada sem o capítulo da história aberto por Outubro de 1917. O papel desempenhado pelos Partidos Comunistas nas revoluções anti-coloniais é notável. E no que se refere aos Estados Unidos? Em Dezembro de 1952, o ministro da Justiça enviava o Tribunal Supremo, ocupada a discutir a questão da integração nas escolas públicas, uma carta eloquente: "A discriminação racial leva a água ao moinho da propaganda comunista". O desafio comunista desempenhou um papel essencial igualmente na ultrapassagem do regime da supremacia branca.

Os direitos sociais e económicos fazem parte da democracia tal como a esquerda a entende. E foi este patriarca do neoliberalismo, Hayek, que denunciou o facto de que a teorização e a presença no Ocidente destes direitos remetiam à influência, por ele considerada nefasta, da "revolução marxista russa".

Compreende-se portanto que, à atenuação do desafio comunista, corresponda no Ocidente uma restauração. Não se trata só do desmantelamento do Estado social. O peso da riqueza é tão forte que, mesmo nas colunas do New York Times, podem-se ler denúncias considerando que o regime em vigor nos Estados Unidos assemelha-se mais a uma "plutocracia" do que à democracia. A contra-revolução é evidente igualmente nos caso do colonialismo, reavaliada pelo teórico da "sociedade aberta", Karl Popper: "Nós libertámos estes Estados (as antigas colónias) muito apressadamente e de modo demasiado simplista".

Vejamos, em sentido contrário, o que se passa num país continente que ficou sob a direcção do Partido Comunista. Pondo fim à catástrofe provocada pelas guerras do ópio e a agressão colonialista, a China devolveu a centenas de milhões de pessoas o primeiro dos direitos do homem, a saber, o direito à vida. O Estado social começa aqui a dar os seus primeiros passos, ao passo que doravante ele é renegado no Ocidente, inclusive no plano teórico.

Mas isto não é tudo: ao reduzir rapidamente seu atraso tecnológico em relação aos países capitalistas mais avançados, a China põe fim à "era de Colombo", que havia começado com a descoberta-conquista da América e que viu o Ocidente sujeitar o planeta inteiro. Vêem-se criar as condições para frustrar as tentações colonialistas e democratizar as relações internacionais. O declínio da doutrina Monroe, à qual a revolução cubana infligiu pela primeira vez um golpe severo, está lá para confirmar.

Como acontecer muitas vezes com revoluções, aquela principiada há aproximadamente um século seguiu um percurso completamente imprevisto. Estamos em todo caso na presença de um gigantesco processo de emancipação que está bem longe de ter chegado à sua conclusão.
[*] Filósofo, professor da Universidade de Urbino, Itália.

O original encontra-se em www.humanite.fr/... 


Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

A nova propaganda é liberal. A nova escravidão é digital



por John Pilger
O que é a propaganda moderna? Para muitos, são as mentiras de um estado totalitário. Na década de 1970 encontrei-me com Leni Riefenstahl e perguntei-lhe acerca dos seus filmes épicos que glorificavam os nazis. Utilizando técnicas de câmara e de iluminação revolucionárias, ela produziu uma forma de documentário que empolgou alemães, o seu Triunfo da vontade; lançava a magia de Hitler.

Ela contou-me que as "mensagens" dos seus filmes dependiam não de "ordens de cima" mas sim do "vazio submisso" do público alemão. Será que isso inclui a burguesia liberal e educada? "Toda a gente", respondeu ela.

Hoje, preferimos acreditar que não há vazio submisso. A "escolha" é omnipresente. Telefones são "plataformas" que lançam toda opinião superficial. Há o Google mesmo no espaço externo se precisar disso. Acariciados como contas de rosário, os preciosos dispositivos nascem já concentrados na sua tarefa, implacavelmente monitorados e priorizados. O seu tema dominante é o ego. Eu. Minhas necessidades. O vazio submisso de Riefenstahl é a escravidão digital de hoje.

Edward Said descreveu este estado conectado em "Cultura e imperialismo" como levando o imperialismo a lugares que frotas navais nunca poderiam alcançar. É o meio final de controle social porque é voluntário, viciante e amortalhado em ilusões de liberdade pessoal.

A "mensagem" de hoje, de grotesca desigualdade, injustiça social e guerra, é a propaganda de democracias liberais. Em qualquer avaliação de comportamento humano, isto é extremismo. Quando Hugo Chavez o desafiou, foi insultado com má fé; e seu sucessor será subvertido pelos mesmos fanáticos do American Enterprise Institute, Harvard's Kennedy School e de organizações de "direitos humanos" que se apropriaram do liberalismo americano e sustentam sua propaganda. O historiador Norman Pollack chama a isto "fascismo liberal". Ele escreveu: "Tudo está normal na aparência. Para os que marchavam a passo de ganso [nazis], substitui a aparentemente mais inócua militarização da cultura total. E para o líder bombástico, temos o reformador manco, a trabalhar alegremente [na Casa Branca], a planear e executar assassínios, sorrindo o tempo todo.

Ainda há uma geração atrás, a discordância e a sátira mordaz eram permitidas nos media de referência, hoje passam as suas falsificações e impera a falsa moral da época (moral zeitgeist). A "identidade" é tudo, feminismo mutante que declara classe [como conceito] obsoleto. Do mesmo modo como dano colateral encobre assassínio em massa, "austeridade" tornou-se uma mentira aceitável. Por baixo do verniz do consumismo, verifica-se que um quarto da Grande Manchester vive em "pobreza extrema".

A violência militarista perpetrada contra centenas de milhares de homens, mulheres e crianças anónimas pelos "nossos" governos nunca é um crime contra a humanidade. Ao entrevistar Tony Blair 10 anos depois da sua criminosa invasão do Iraque, Kirsty Wark da BBC prendou-o com o momento que ele mais podia sonhar. Ela permitiu a Blair angustiar-se acerca da sua "difícil" decisão ao invés de chamá-lo a prestar contas pelas mentiras monumentais e o banho de sangue que provocou. Recordamo-nos de Albert Speer . Hollywood retornou ao seu papel da guerra fria, conduzida por liberais. O filme Argo, de Ben Affleck, vencedor do Óscar, é o primeiro longa metragem tão integrado dentro do sistema de propaganda que a sua advertência subliminar da "ameaça" do Irão é apresentada no momento em que Obama se prepara, mais uma vez, para atacar o Irão. Que a "verdadeira estória" de Affleck, de bons rapazes versus maus muçulmanos, é uma falsificação pois a justificação de Obama para os seus planos de guerra perde-se nos aplausos conseguidos através das RP. Como crítico independente, Andrew O'Hehir denuncia: Argo é "um filme de propaganda no sentido mais exacto, um filme que se reclama inocente de toda ideologia". Ou seja, envilece a arte de fazer cinema a fim de reflectir uma imagem do poder a que serve.

A verdadeira história é que, durante 34 anos, a elite da política externa dos EUA ferveu de desejos de vingança pela perda do xá do Irão, o seu amado tirano, e o seu estado torturador concebido pela CIA. Quando estudantes iranianos ocuparam a embaixada dos EUA em Teerão em 1979, encontraram uma montanha de documentos incriminatórios, os quais revelaram que uma rede de espiões israelenses estava a operar dentro dos EUA, a roubar segredos científicos e militares. Hoje, o dúplice aliado sionista – não o Irão – é a única ameaça nuclear no Médio Oriente.

Em 1977, Carls Bernstein, famoso pela sua cobertura do Watergate, revelou que mais de 400 jornalistas e executivos da maior parte das organizações de media dos EUA trabalhara para a CIA nos últimos 25 anos. Havia jornalistas do New York Times, Time e das grandes estações de TV. Nestes dias, uma força de trabalho tão formal e abominável é completamente desnecessária. Em 2010, o New York Times não fez segredo do seu conluio com a Casa Branca na censura aos registos de guerra do WikiLeaks. A CIA tem um "gabinete de ligação com a indústria do entretenimento" que ajuda produtores e directores a refazerem a sua imagem de uma gang sem lei que assassina, derruba governos e trafica drogas. Quando a CIA de Obama comete múltiplos assassínios por meio de drones, Affleck louva o "serviço clandestino... que todos os dias faz sacrifícios em prol de americanos... Quero agradecer-lhes muito". O vencedor do Oscar de 2010, 00:30 Hora Negra (Zero Dark Thirty) de Kathryn Bigelow, uma apologia da tortura, foi nada menos que aprovado pelo Pentágono.

A fatia de mercado do cinema estado-unidense nas bilheteiras da Grã-Bretanha muitas vezes atinge os 80 por cento e a pequena fatia britânica deve-se principalmente a co-produções com os EUA. Filmes da Europa e do resto do mundo representam uma pequena fracção daqueles que nos permitem ver. Na minha própria carreira de director de cinema, nunca experimentei um tempo em que vozes dissidentes nas artes visuais fossem tão poucas e tão silenciosas.

Em relação a todas as preocupações induzidas pelo inquérito Leveson , o "molde Murdoch" permanece intacto. A intercepção telefónica foi sempre uma diversão, uma pequena contravenção em comparação com o tocar de tambores dos media em favor de guerras criminosas. Segundo a Gallup, 99 por cento dos americanos acredita que o Irão é uma ameaça para si, assim como a maioria acreditava que o Iraque foi responsável pelos ataques do 11/Set. "A propaganda sempre vence", disse Leni Riefenstahl, "se você a permitir". 
14/Março/2013

O original encontra-se no New Statesman britânico e em johnpilger.com/... 

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

Traficantes de Dinheiro: De paraíso fiscal em paraíso fiscal, fazem frutificar o seu capital


por Robert Bibeau [*]

Escândalo fiscal mundial 

É sempre surpreendente ver um cidadão espantar-se com um escândalo amplamente ventilado e divulgado nas redes sociais e há muito revelado, apesar de toda a gente julgar estar imunizado contra esses crimes de iniciados. [1]

Em contrapartida, nunca nos admiramos de ver os meios de comunicação, a soldo, fazer troça, "envergonhados por descobrir" os segredos de Polichinelo que os seus patrões-proprietários-multimilionários escondem há decénios. O escândalo da evasão fiscal e dos paraísos "offshore" que o investigador Alain Deneault denunciou em 2010 no seu livro "Offshore. Paradis fiscaux et souveraineté criminelle" [Offshore. Paraísos fiscais e soberania criminosa] passa subitamente a vedeta nos pequenos ecrãs. [2] No Quebec, a emissão televisiva – 24 horas em sessenta minutos – fez-se eco deste escândalo. [3]

Em França, os senhores Arnault, Depardieu, Cahuzac, Augier e outros defensores da liberdade democrática de esconder a sua "massa" ilícita, indignam-se por serem assim denunciados perante as vaias dos enganados. Na Bélgica, a pátria do rei Balduíno, em tempos proprietário pessoal do Congo, o jornal do PTB também identificou alguns vigaristas riquíssimos. [4]

Este súbito despertar de interesse provém das revelações do ICIJ (International Consortium of Investigative Journalists), agrupamento internacional de jornalistas de investigação, que transmitiu a diversos meios de comunicação, entre os quais Le Monde Radio-Canada , 200 gigabits de dados sobre as contas ou interesses offshore de empresas e de particulares [ http://www.icij.org/ ].

Qual é o efeito da evasão fiscal na economia mundial? As aproximações são numerosas mas todas elas astronómicas e quanto maiores são os negócios que o corsário maneja, mais imponentes são os montantes ocultos. Para o Fundo Monetário Internacional, as somas em questão são calculadas em 5,5 milhões de milhões de euros, ou seja quase o triplo do PIB da França. Segundo o FMI, metade das transacções financeiras mundiais transitam pelos paraísos fiscais, que devem incluir 4 mil bancos e 2 milhões de sociedades de fachada.

A ONG Tax Justice Network afirma que as somas em jogo são ainda mais importantes, atingindo 16 a 25 milhões de milhões de euros, ou seja, o PIB conjunto dos Estados Unidos e do Japão. Isso representaria cerca de um terço das transacções financeiras mundiais. Segundo a TJN, esta soma podia gerar entre 150 e 200 mil milhões de euros de receitas fiscais por ano nas caixas dos estados do mundo inteiro. Em 2012, o economista James Henry, autor de um estudo sobre a economia subterrânea offshore apresentado no site do quotidiano The Guardian , calculou que os 10 bancos monopolistas mais procurados em matéria de gestão do "património privado" – especialistas da fraude fiscal como a Goldman Sachs, o Crédit suíço e o UBS – passaram de 1,8 milhões de milhões de euros em 2005 para 4,8 milhões de milhões em 2010, período que coincide com o vazio da crise económica mais grave depois do colapso de 1929 [Heater Stewart (21.07.2012) 13tn hoard hidden from taxman by global elite. www.guardian.co.uk/business/2012/jul/21/global-elite-tax-offshore-economy ].

James Henry calculou ainda que, se no total uma dezena de milhões de pessoas colocaram os seus haveres nos paraísos fiscais, metade das somas, ou seja, cerca de 8 milhões de milhões de euros, estaria entre as mãos de uns 92 mil super-ricos, ou seja, 0,001% da população mundial; estatísticas corroboradas pelas coligidas sobre a concentração de imensas fortunas familiares [Hunrun (2013) Les 1431 plus grandes fortunes du monde. www.hurun.net/usen/NewsShow.aspx?nid=418 ]. Entretanto, os cidadãos comuns dos países endividados têm que pagar rigorosamente os seus impostos, vítimas das políticas de austeridade dos governos dos ricos em situação de falência. No que se refere à França, o jornalista Antoine Peillon calcula que os valores ocultos no estrangeiro atingem os 600 mil milhões de euros, no seu livro Ces 600 milliards qui manquent à la France (Seuil, 2012) [Fonte : L'Expansion.com, 4/04/2013].

A comissão de inquérito do Senado francês sobre a evasão fiscal avaliou o custo anual que os ricos subtraem ao fisco entre 30 e 60 mil milhões de euros. Mas, para o sindicato Solidaire-Finances Publiques, que apresentou um relatório no início de 2013, a fraude espolia as caixas do estado por volta de 60 a 80 mil milhões de euros por ano [Fonte: L'Expansion.com, 4/04/2013].

Os documentos piratas transmitidos pelo consórcio ICIJ referem-se a 122 mil empresas clandestinas trazidas à luz do dia para um pecúlio oculto calculado entre 20 e 30 milhões de milhões de euros: trata-se em parte de capital-dinheiro arrebanhado nas fábricas e nos comércios, que é misturado com dinheiro sujo do mundo ilegal e que em seguida é reinjectado na economia imperialista. Incidentalmente, outro dia na rádio, um animador paranóico pedia à senhora que estava ao microfone que identificasse o vígaro que havia arranjado o seu lavatório sem facturar – vejam lá, 10 euros escondidos aos impostos… Ah, o mal que nos podem fazer…

Os paraísos dos traficantes de dinheiro 

Contam-se entre cinquenta e cem casinos de negócios, situados em países soberanos, à margem da lei e à margem do direito, e que todos os governantes da Terra conhecem melhor do que nós. Alguns desses Estados criminosos têm a classificação triplo AAA das agências de avaliação americanas! [Liste des États voyous du fisc fr.wikipedia.org/wiki/Paradis_fiscal#Liste_grise ].

Campos de golfe perfeitamente mantidos, que o primeiro secretário da ONU, os presidentes do Banco Mundial e da OCDE, assim como a presidente do FMI, evitam cuidadosamente criticar, a não ser para se queixarem, na esperança secreta de que nada será feito que possa prejudicar os seus investimentos. [5]

Os animadores ruidosos nos altifalantes dos meios mediáticos "preponderantes" têm a audácia de baptizar esta evasão fiscal: "Um delito de investimentos". Basta ler: "Efectuam-se no mundo diariamente milhares de milhões de transacções financeiras. Metade delas realiza-se nos paraísos fiscais ao abrigo de quase toda a tributação. A fuga de documentos relativos a esses países e a essas ilhas impermeáveis aos impostos fez ondas em todos os continentes. O governo canadiano exige a lista dos cerca de 450 canadianos tributáveis que terão investido nesses paraísos fiscais (sic). O montante a recuperar atinge milhares de milhões de dólares". [6]

Gostaríamos de acrescentar aquilo a que o investigador Alain Deneaulr chama "as dificuldades do fisco" – impostos e decrescimento – "em marcha para a decadência" – [ www.nousautres.org/aporie-du-fisc-impot-et-decroissance/ ], colocando assim a tónica onde deve ser posta… É a crise económica sistémica que obriga os esbirros do fisco a essas decisões arbitrárias contra os seus patrões que não apreciam minimamente ver assim usurpado o seu anonimato de opacidade "de investidores traficantes" nem ficarem expostos daqui em diante à vingança popular. Felizmente para esses multimilionários, todo este tumulto publicitário se acalmará dentro de meses numa orgia de comissões de investigação, de cimeiras sobre a fiscalidade e sob uma chuva de declarações por parte dos fala-baratos políticos, tão tonitruantes como fúteis e desopilantes. Sarkozy comprometeu-se a isso há dois anos e meio – Fim aos Paraísos, disse – sabemos o que se passa actualmente! E actualmente é a vez de a corte que rodeia François Hollande passar às confissões envergonhadas. [7]

Um especialista entrevistado na TV5 declarou recentemente que nenhum plenipotenciário da África negra deixa de subscrever a sua conta anónima na Suíça… Má língua, diríamos. Seria melhor que o homem se virasse para os políticos europeus, canadianos e americanos (o candidato às presidenciais americanas, M. Romney, não foi apanhado nesses locais mal afamados?). No Canadá, o "muito respeitável" senhor Paul Martin, em tempos primeiro-ministro da federação (2003-2006) era um praticante fervoroso desse tipo de evasão. O marido de Pauline Marois, homem de negócios cripto-federalista, também seria!?... (Os dados publicitados pelo ICIJ identificam 450 capitalistas canadianos, entre os quais uns cinquenta de Quebec [ www.lapresse.ca/... ].

Todos os que rasgam as roupas na praça pública sabiam – sabem – saberão tudo quanto a essas práticas satânicas – muitos deles a isso se dedicam há muito tempo escondendo o conteúdo dos envelopes com dinheiro que receberam na altura da adjudicação dos tentadores contratos públicos. [8]

Onde ir buscar o dinheiro para transferir para os ricos? 

Os factos falam por si e constituem prova. Os estados capitalistas em crise económica em todo o mundo ocidental e oriental andam à procura de novas fontes de receitas – de novas entradas de capital-dinheiro para o transferir para os capitalistas. Como era de esperar, viraram-se primeiro contra os contribuintes – os assalariados pagos à semana, os ganha-pouco habituados a saldos – os pobres das sopas populares e os desapossados que foram submetidos à investigação da sua gestapo fiscal para lhes roerem as prestações e lhes roerem o seu poder de compra.

Como tudo isso não chegasse para tapar os défices faraónicos provocados pelos presentes fiscais consentidos à banca, às multinacionais riquíssimas e aos mendigos multimilionários; os fiscalistas e os administradores do Estado burguês, muito bem dispostos, lembraram-se de voltar a tributar os "burgueses-bobos-boémios" satisfeitos – que nunca deixam em paz – obrigados como são, esses capitães da administração, a rebuscar o dinheiro onde ele ainda pode ser surripiado, já que as algibeiras dos pobres e dos operários estão vazias.

Sempre que o Estado dos ricos ataca a pequena burguesia e a média burguesia, deixando os prevaricadores e os seus lacaios políticos, os apparatchiks, esconder-se nos "paraísos", fiquem descansados que uma indiscrição enviará esses fraudulentos para o inferno mediático. De resto, são esses comprometidos que manipulam as contas anónimas dos ricos na Suíça.

Não só não são declarados a mais-valia e os lucros espoliados aos trabalhadores, com medo de serem tributados; se por acaso não é possível subtrair ao olhar do fisco qualquer receita, a taxa de imposto que, no Canadá, se situa entre 31% e 53%, para o cidadão comum, não passa de 19% a 27% para a empresa dos bandidos – evidentemente depois de deduzidas todas as isenções e isso, desde que o monopólio multinacional aceite pagar o que deve, o que nem sempre acontece (Rio-Tinto-Alcan recusa-se há três anos a pagar mil milhões de dólares de dívida). [9]

Um subalterno mediático obsequioso acha que a evasão fiscal e os paraísos "offshore" são incontornáveis e inevitáveis tal como a prostituição, a mafia e os carteiristas. Muito lúcido, ele sabe como conservar o seu emprego. No entanto, este poltrão tem razão: a prevaricação, a exploração e a malandragem são os companheiros da cama do lucro. [10]

Oposição ao fisco e outras formas de arrebanhar massa 

Os operários e os empregados são tributados até à morte, pagam impostos depois da morte – até na campa – onde o fisco se serve antes dos herdeiros do cadáver (os ricos beneficiam de toda uma série de escapatórias e isenções). Assim, os truques utilizados pelos operários, pelos empregados, pelos camponeses e pelos artesãos podem variar de uma época para outra, mas o objectivo da manobra mantém-se o mesmo qualquer que seja o sistema económico: reduzir as punções que o Estado efectua nas receitas dos trabalhadores que já estão de tal forma tributados, no trabalho e no mercado, que a reprodução ampliada das classes trabalhadoras está ameaçada. Nos países árabes, por exemplo, em toda a África e na América os jovens trabalhadores já não têm meios financeiros para se casar e ter filhos. Para esses trabalhadores, esconder do fisco as receitas é uma questão de sobrevivência e um dever para com as famílias.

O capitalista, pelo seu lado, confisca a mais-valia – lucros, dividendos, benefícios, juros e rendas – produzida pelos empregados. Acumula assim somas enormes sobre as quais paga poucos impostos e poucas taxas como acabamos de demonstrar. Mais ainda, o capitalista exige dinheiro ao governo para encorajar os investimentos de que será o único beneficiário – benefícios imensos que coloca nos paraísos fiscais a fim de contribuir o menos possível para o ciclo de reprodução ampliado dos trabalhadores que ele abandona à sua desgraça. O trabalhador aldraba o imposto para a sobrevivência da sua família, o capitalista aldraba o imposto para aumentar os seus lucros.

Bem entendido, todo o cidadão honesto, todo o operário empobrecido, todo o trabalhador com dificuldades de crédito, o que foi expulso do seu lar ou da sua casa arrendada, deve indignar-se com esta aldrabice; com este roubo de alto coturno por parte dos que possuem tudo em privado. O trabalhador deve enfurecer-se contra esses malfeitores insolentes e contra os ladrões instalados em cadeiras presidenciais, senatoriais e ministeriais. Mas todos têm que saber que amanhã, dentro de um mês, dentro de um ano, tudo isso se manterá na mesma porque os tubarões da finança, os "banqueiros-gangsters" e o peixe miúdo dos políticos larápios, que hoje são acusados, são também os donos dos advogados, dos procuradores, dos juízes, todos eles coligados. Nada resultará desta miscelânea mediática senão mais inquisição da polícia fiscal contra os trabalhadores e os mal-pagos.

O proletariado chocado não se revoltará ainda desta vez. Esperará pela sua hora e nessa altura ajustará estas contas, e todas as outras, ao mesmo tempo.
12/Abril/2013


1. Le Devoir (5.04.2013) Pleins feux sur l'évasion fiscale. www.ledevoir.com/international/actualites-internationales/37... =infolettre-quotidienne. 
2. Alain Deneault (2010) Off-Shore. Paradis fiscaux et souveraineté crimminelle . Écosociété. Montréal. http://www.ecosociete.org/t137. 
3. Radio-Canada (5.04.2013) 24 heures en soixante minutes. Offshore. http://www.radio-canada.ca/emissions/24_heures_en_60_minutes... 284479&autoPlay=http://www.radio-canada.ca/Medianet/2013/RDI/2013-04-05_19_0... 001_1200.asx 
4. RTBF. Mise au point (30.10.2011) Quand le PTB dénonce la fraude fiscale. http://www.youtube.com/watch?v=oql0C1_pg6Q et http://science21.blogs.courrierinternational.com/archive/201.... L'express (5.04.2013) L'Affaire Augier, Qu'est-ce que l'Offshore-leaks ? http://www.lexpress.fr/actualite/ politique/comprendre-l-affaire-offshore-leaks_1237385.html 
5. Le Monde (4.04.2013) Les pays suspectés de pratique fiscales douteuses. http://www.lemonde.fr/economie/infographie/2013/04/04/les-pa... que-fiscale-douteuse_3154297_3234.html. 
6. Le Devoir (5.04.2013) Pleins feux sur l'évasion fiscale. www.ledevoir.com/international/actualites-internationales/37... =infolettre-quotidienne. 
7. http://www.rue89.com/2009/09/23/sarkozy-magie-magie-les-para... et Le Monde (2013) http://www.lemonde.fr/offshore-leaks/ 
8. http://voir.ca/josee-legault/2012/04/12/enveloppes-brunes-et... 
9. "Para entender as taxas de tributação das empresas, à semelhança do regime fiscal dos particulares, devemos ter em conta ao mesmo tempo o patamar federal e provincial. Por consequência, uma empresa no Quebec paga, em 2013, um máximo de 26,90%, ou seja, 15% ao federal e 11,90% ao provincial. Em contrapartida, é de notar que essa taxa não inclui nem as subvenções, nem as deduções; é assim a taxa a pagar sobre a receita colectável, e nãp sobre o conjunto da receita duma empresa (…) Além disso, essa taxa não é universal: para as duas ordens de governo, existe uma taxa diferente para as PME elegíveis. No Canadá, essa taxa é de 11%, enquanto que é de 8% no Quebec, para uma taxa máxima de 19%". http://www.iris-recherche.qc.ca/blogue/les-taux-dimposition-...
10. http://www.bfmtv.com/economie/paradis-fiscaux-sont-incontour... 

[*] Professor, canadiano, http://www.robertbibeau.ca/ 

O original encontra-se em www.legrandsoir.info/... . Tradução de Margarida Ferreira. 

Este artigo encontra-se em http://resistir.info/ .

terça-feira, 16 de abril de 2013

Sem terra denunciam 'chuva tóxica' lançada por aviões de fazendeiros no Pará

 
 
Florestas cobrem um terço do planeta; desmatamento caiu 20% na última década
 
Por Carlos Madeiro - Do UOL, em Marabá (PA)
 
Agricultores de acampamentos localizados no sudeste do Pará estão denunciando fazendeiros da região por supostamente lançarem agrotóxicos de aviões sobre plantações e moradias em áreas de acampamentos.
O UOL teve acesso a um dossiê elaborado pela CPT (Comissão Pastoral da Terra) com várias denúncias de violência no campo. documento foi entregue no último dia dois a autoridades paraenses e instituições de direitos humanos de todo o mundo, durante audiência pública em Marabá (a 685 km de Belém).
O documento cita que cinco acampamentos que teriam sofrido com a "chuva tóxica". "O Grupo Santa Bárbara, do banqueiro Daniel Dantas, tem se utilizado de outra prática criminosa contra famílias sem terra que ocupam suas propriedades: o uso de veneno. Nos últimos meses, três acampamentos de sem terra que estão localizados em fazendas do grupo (Fazenda Cedro - município de Marabá, Fazenda Castanhais - Piçarra e Fazenda Itacaiúnas - Marabá), aviões do grupo despejaram veneno sobre as roças dos agricultores e sobre as moradias", registra o documento.
Em resposta ao UOL, a Agro Santa Bárbara negou o uso das práticas de que é acusada."A Agro Santa Bárbara é uma empresa legalista, focada na produção de alimentos, uso das mais modernas tecnologias, emprego digno e geração de renda no Sudeste do Pará. Essa é nossa razão de ser e de estar na região: trabalhamos para melhorar a vida das pessoas", diz o texto.
 
Maior extensão de floresta tropical da Terra, a Amazônia é rica em biodiversidade e um dos maiores depósitos de carbono do planeta. Sua exploração deve inspirar cuidados constantes, pois ela tem papel no equilíbrio do meio ambiente Leia mais lubasi/Wikimedia Commons

Mais casos

Ainda segundo o dossiê, a "prática criminosa" também seria utilizada por outros fazendeiros em "áreas de assentamento que fazem divisas com as fazendas." "Duas ocorrências já foram registradas em relação a duas fazendas localizadas no município de Eldorado dos Carajás e uma no município de Floresta do Araguaia."
A denúncia de "chuva tóxica" também é feita pelo MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). "Ele jogam propositalmente e matam as plantas. Já temos várias denúncias formalizadas quanto a isso. Temos cinco acampamentos com relatos de casos nas últimas semanas", informou o dirigente Tito Moura.
Ele jogam propositalmente e matam as plantas. Já temos várias denúncias formalizadas
"Nos últimos anos, temos percebido pessoas doentes que achamos ser por conta de agrotóxicos. É preciso uma análise do solo e da água. Há casos de crianças e idosos adoentados por isso", afirmou Mercedez Queiroz, da coordenação nacional do MST.
O UOL também conversou com agricultores que relatam problemas com os agrotóxicos usados pelos fazendeiros da região. Segundo o representante do acampamento Alcides Jurandir, Francisco Santos, plantações foram atingidas.
"Eles jogaram veneno e atingiram a plantação. Há dois anos haviam feito isso, e crianças do nosso acampamento tiveram problemas de saúde, de pele. Nossa plantação foi perdida, porque a qualidade de venda caiu totalmente", afirmou, citando que ainda espera para ver os resultados da nova "chuva tóxica."

Sem-terra realizam manifestações pelo país

 

16.abr.2012 - O MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) ocupou na manhã desta segunda-feira (16) o prédio do Ministério de Desenvolvimento Agrário em Brasília. Segundo o movimento, o ato é parte da programação do "Abril Vermelho", como o MST chama a onda de protestos e invasões que faz anualmente para lembrar o massacre de Eldorado dos Carajás, ocorrido em 17 de abril de 1996 Leia mais Marcello Casal/Agência Brasil

Guerra química

A situação dos acampados paraenses é vista com preocupação pela RLA (Fundação Right Livelihood Award) - instituição que luta pelos direitos humanos pelo mundo e promove o Prêmio Nobel Alternativo. A entidade quer que o poder público verifique a situação sanitária dos agricultores.
"É uma guerra química. Eles jogam esses venenos, e os acampados respiram. Como essas pessoas estão distantes, não se conhecem as doenças delas. É preciso uma investigação epidemiológica a fim de saber os riscos e a contaminação a que vivem sujeitas", afirmou o biólogo argentino Raúl Montenegro, da RLA.
É uma guerra química. Eles jogam esses venenos, e os acampados respiram
Outras instituições também demostraram preocupação com o caso, "Nunca tinha ouvido falar nada como isso, mas ouvimos esses relatos com preocupação. Precisa ser investigado", disse Átila Roque, diretor da Anistia Internacional no Brasil.
O delegado de Conflitos Agrários confirmou ao UOL que denúncias já foram feitas à delegacia, recentemente, e foram repassadas ao Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis), que deveria confirmar ou não a procedência para provável investigação criminal.

Flagrante necessário

A superintendência do Ibama em Marabá, porém, informou que não há denúncias sendo investigadas neste momento. "Para que o Ibama responsabilize quem lançou o agrotóxico de forma inadequada é necessário que os agentes obtenham o flagrante da infração ambiental", informou o instituto, em nota enviada à reportagem.
"A lei exige também que seja feito um laudo de constatação de poluição antes da autuação ambiental. A multa para estes casos vai de R$ 5.000 a R$ 50 milhões." O órgão alertou que a pulverização é regida por leis específicas.
"Uma propriedade rural que possui a Licença Ambiental Rural (LAR) poderá usar defensivos agrícolas em suas lavouras autorizadas. As regras de uso são definidas pelo Ministério da Agricultura", informa o órgão.
"O Ibama atuará, no entanto, se este uso provocar poluição, dano à saúde humana, dano ao meio ambiente, se o produto utilizado for uma substância proibida ou tornar uma área rural imprópria para a ocupação humana", diz o Ibama.

 

NÃO - Lucimar Barros, agricultor que será desalojado pelas águas da repressa da hidrelétrica de Belo Monte (região de Tapajós): "Não parei muito para pensar, mas vou votar contra. O Pará já é pobre, Tapajós vai ser mais pobre ainda. A gente não precisa de mais políticos, precisa de mais fiscais" Leia mais Rodrigo Bertolotto/UOL
 

sábado, 13 de abril de 2013

A diminuição da Maioridade Penal e as Prisões da Miséria.



Por Claudemir Mazucheli 

Todas as vezes as vezes que "filhos da classe média" sofrem algum tipo de violência, surgem na MÍDIA especialistas com suas   "soluções"  geniais para o problema (na maioria das vezes proposituras fascistoides . (muito diferente quando a violência é contra jovens negros e pobres da periferia - o que a mídia e seus especialistas  defenderam quando a policia exterminou dias atrás frente a uma câmera de segurança um menor de idade - nada!  apernas noticiou o fato).
Em nenhum momento ouviu-se um debate profundo sobre os problemas da violência. Não se discutiu mudança radical na desigualdade social brasileira, não se discutiu os problemas dos modelos educacionais brasileiros, não se discutiu inclusão das periferias, não se discutiu a exposição dos jovens à violência....
É clarividente que a exposição à violência (fortemente marcada pela exploração sexual, violência doméstica, homicídios, tráfico e uso de drogas) e a exclusão dos direitos sociais básicos como educação, saúde, lazer e trabalho, são os principais fatores que caracterizam a vulnerabilidade da população infanto-juvenil. Em decorrência destas situações, há um crescente envolvimento de crianças e adolescentes em grupos ociosos de rua, favorecendo a formação de gangues, o uso de drogas, o abandono escolar, o acirramento de conflitos no espaço familiar e, finalmente, o encaminhamento para instituições do Estado, onde estão sujeitos a diversas formas de violência e violação de direitos.
Nesse sentido será correto punir somente o infrator, menor de idade, jogando-o em uma carceragem carcomida pelo ódio, pelas drogas e pelo crime organizado? 
Não seria para esse infrator uma escola do crime?
Imagine esse jovem  moldando seu caráter dentro de uma penitenciária com milhares de outros condenados... 
É A UNIVERSIDADE DO CRIME... 
É A PRISÃO DA MISÉRIA... (parafraseando Löic Wacquant, título de seu livro - comentado abaixo) ,
Ao propor essa “barbárie” a CLASSE DOMINANTE E MIDIÁTICA, está criminalizando a pobreza, e condenando essa sociedade a um  sistema sócio metabólico  de terror.
Lembrei-me do Filme MAD MAX!
 A arte imita a vida ou a vida imita a arte?


AS PRISÕES DA MISÉRIA

Por comendolivros.blogspot.com.br
“Há sim a necessidade de o Estado seguir o que se propôs, de defender a Segurança Social e impedir que esse processo de criminalização da pobreza marche a trote a cada crise política ou econômica, mas ocorre que há ainda a mídia, aliada ao discurso do neoliberal, agindo como lobos que disfarçados de cães pastores conduzem a massa para o covil.”
Por Jônatas Tiago*
Em as “As Prisões da 

Miséria”, do sociólogo francêsLöic Wacquant, é apresentado - em forma de denúncia - a nova face das doutrinas da penalidade neoliberais que surgiram recentemente nos Estados Unidos e que têm vilmente atraído a atenção da Europa e o mundo, recriando novas formas de opressão. O autor demonstra como os Estados Unidos têm substituído as políticas sociais por políticas criminais e a “Seguridade Social” por um “Sistema Penal vingativo e intolerante”, tratando a população mais pobre e carente não com uma assistência governamental para que possam se desenvolver em prol da sociedade, mas empurrando essa enorme parcela da população para dentro das cadeias para serem exploradas de todas as formas por uma nova indústria prisional. 

Em face da crescente onda de violência que tem submergido das periferias dos centros urbanos, fruto da desigualdade e da ausência de um Estado provedor, e em meio ao discurso eloquente das emoções na mídia que cerca os populares difundindo o medo no seio da sociedade há a emergência de se debater um caminho alternativo para todos. Ou, na pior das hipóteses, estamos sendo mergulhados num caminho sem volta? Tomados não pela razão, mas manipulados pelas circunstâncias, podemos fazer sucumbir os valores democráticos, de justiça social e de igualdade sobre o disfarce de arma contra o crime.
O Estado-Previdência (creio que o autor queria dizer: da Segurida de Social) europeu deve doravante ser enxugado, depois punir suas ovelhas dispersas e reforçar a segurança pública, definida estritamente em termos físicos e não em termos de risco à vida (salarial, social, médico, educativo etc.), ao nível de prioridade da ação pública” (página 19)
O autor demonstra que por trás do repetitivo discurso neoliberal da falência do welfare state e as novas teorias que este movimento tem proposto, surgiu nas últimas décadas, mesmo os Estados mais engajados nas políticas sociais têm retroagido às pressões da oposição com o enxugamento do Estado durante as crises econômicas, o que indiretamente provoca um processo de marginalização intenso que tem esmagado milhares de desempregados no funil das possibilidades de sobrevivência, forçando-os a se contentar com subempregos ou mergulhar na informalidade e consequentemente no crime.
Isso tudo principalmente nas camadas mais pobres da população jovem, que por não haver perspectiva de futuro e nem apoio do Estado para desenvolverem suas capacidades para adentrar ao mercado de trabalho altamente competitivo, acabam convencidas (e não somente persuadidas) a arriscar-se na ilegalidade, ou seja, ao contrário do que cremos, não há necessidade de um caminho alternativo como a doutrina que a “Lei & Ordem” propõe, há sim a necessidade de o Estado seguir o que se propôs, de defender a Segurança Social e impedir que esse processo de criminalização da pobreza marche a trote a cada crise política ou econômica, mas ocorre que há ainda a mídia, aliada ao discurso do neoliberal, agindo como lobos que disfarçados de cães pastores conduzem a massa para o covil.

“Para os membros das classes populares reprimidas à margem do mercado de trabalho e abandonadas pelo Estado assistencial, que são o principal alvo da “tolerância zero”, o desequilíbrio grosseiro entre o ativismo policial e a profusão de meios que lhe é consagrada, por um lado, e a sobrecarrega dos tribunais e a progressiva escassez de recursos que os paralisa, por outro, tem todas as aparências de uma recusa de justiça organizada.” (pagina 39)
A indústria do medo (que nos EUA conduziu ao cúmulo da gigantesca máquina do setor de serviços e industrial que sustentam o sistema penitenciário americano) tem derrotado qualquer esboço de nos preservar no caminho certo. 
Com um discurso persuasivo baseado no apelo ao medo das massas e prometendo devolver a ordem ao meio social com medidas simplistas, essa nova doutrina nos convida a uma nova cartilha de políticas públicas impondo a desregulamentação da economia, combatendo a seguridade social, e fortalecendo um projeto de política pública criminal de “tolerância zero” redesenhado o Estado do Bem-Estar Social num novo e perverso Leviatã, no qual se empurra milhões para a criminalização e, logo depois para cadeia, num vicioso e perigoso processo retroativo, com a tendência de ser cada vez mais tirânico. “Todas essas palavras de ordem – no sentido forte do termo – atravessaram o Atlântico e a Mancha antes de encontrar uma acolhida cada vez mais hospitaleira no continente, onde, cúmulo da hipocrisia ou ignorância política, seus partidários as apresentam como inovações nacionais exigidas pelo crescimento inédito da violência urbana e da criminalidade local” (página 52)
O livro nos provoca inúmeros questionamentos sobre os caminhos que o Brasil tem se inclinado. As tendências totalitárias do grande público brasileiro, que é leigo e incapaz de criticar as ideias que são vendidas pelos meios de comunicação por serem facilmente manipulados pelas próprias emoções, fazem-nos sentir uma enorme incapacidade e cria-nos uma enorme desilusão com os segredos que a história ainda nos guarda. Quanto amanhã? O que será?
“O assombroso crescimento do número de presos na Califórnia, como no resto do país, explica-se, em três quartos, pelo encarceramento dos pequenos delinqüentes e, particularmente, dos toxicômanos. Pois, contrariamente ao discurso político midiático dominante, as prisões americanas estão repletas não de criminosos perigosos e violentos, mas de vulgares condenados pelo direito comum por negócios com drogas, furto, roubo, ou simples atentados à ordem publica.” (página 83)
Será que chegaremos ao ponto de oficializar a criminalização da pobreza? Ressuscitaremos o maldito instituto da escravidão nas nossas cadeias? Criaremos bancos de dados e estratificaremos novamente a sociedade em castas de famílias de bem e famílias de culpados? Mas o pior é que com todo o desenho dos acontecimentos e com pleno respaldo do conhecimento do egoísmo e mesquinhez do ser humano dentro do acentuado processo de desumanização do homem, apenas experimentamos uma péssima sensação de mau presságio, e a única pergunta infeliz que fazemos é: Quando? (“AS PRISÕES DA MISÉRIA”, de Löic Wacquant, sociologia, 176 págs., editora Jorge Zahar – 2001)

fotos: reprodução