segunda-feira, 29 de novembro de 2010

O que houve na França vai mudar a nossa dança?


De Paris a Berlim, de Lisboa a Dublin, de Vilnius a Bucareste, de Londres a Roma. As manifestações e as greves multiplicam-se.

A cada dia, fica mais evidente que estamos assistindo a uma segunda etapa da crise do capitalismo. Os acontecimentos europeus, com a falência da dívida pública da Grécia e de outros países, deixam claro que seguiremos enfrentando uma crise profunda e prolongada.

Como já afirmamos em outros momentos, estamos diante de uma crise de superprodução. Na essência, trata-se da tendência do capitalismo de produzir um desenfreado aumento da capacidade produtiva em busca de lucro, ultrapassando seus próprios limites e engendrando, contraditoriamente, o declínio da taxa de lucro, implicando na diminuição do ritmo de acumulação, no desemprego dos trabalhadores e na própria destruição e desvalorização de capital como remédio.

Os remédios tradicionais vão rapidamente revelando-se insufi cientes. Os estados mobilizaram seus bancos centrais, normalmente responsáveis pela reserva de liquidez no movimento de pagamentos entre os bancos comerciais, para criar créditos e dispor de sufi ciente liquidez monetária. Isso já não basta. Num primeiro momento, os recursos fi nanceiros dos bancos centrais substituíram o gigantesco ganho dos bancos. Mas esse dinheiro não pode substituir o dinheiro dos bancos enquanto meio de pagamento entre eles. Além disso, tanto capital fi ctício não pode fazer grande coisa no sentido da produção. Não existia tanto dinheiro nos cofres para enfrentar uma crise de proporções crescentes.

Acrescentemos, ainda, um agravante. No caso europeu, existe um único banco central continental, que define a política monetária para um conjunto muito desigual de tesouros nacionais. Esse é o cenário dos atuais movimentos especulativos que se voltam para as economias mais frágeis do continente europeu, como Grécia, Irlanda e Portugal. Como o euro é a moeda comum da Comunidade Europeia, não pode ocorrer a bancarrota de um Estado membro: ela provocaria um efeito dominó – a queda do primeiro país seria acompanhada pela queda de outros. Isso explica a reação da Comunidade Europeia ao garantir um enorme crédito para a Grécia. Então, é hora de defi nir quem vai pagar a conta. Os governos promovem arrocho de gastos sociais e atacam as regras previdenciárias.

É neste momento crucial que ocorre o fracasso da reunião do G20! O fiasco pode ser medido pelo vago comunicado fi nal dos presidentes das 20 principais potencias econômicas. Entre as poucas ações anunciadas, está a criação de um sistema para detectar desequilíbrios fi nanceiros e cambiais a cargo do FMI, com critérios que serão definidos em 2011. Nenhum dos participantes guarda qualquer ilusão de que os Estados Unidos se submeteriam a uma autoridade externa, mesmo sendo os controladores do FMI. Os mesmos representantes do governo estadunidense, que haviam se comprometido, na reunião preparatória dos ministros de finanças – duas semanas antes do acordo dos presidentes –, a não tomar qualquer medida que alimentasse a guerra cambial, tiveram a desfaçatez de anunciar o gigantesco pacote de 600 bilhões que desvaloriza o dólar.

Desaparecem as ilusões

Os EUA, donos do maior deficit comercial e da maior dívida externa do planeta, já não conseguem mais agir em defesa dos interesses do sistema capitalista no seu conjunto, utilizando sua posição como maior economia do mundo – e donos do dólar – para favorecer apenas os interesses dos seus próprios capitalistas e enfrentar a crise da sua economia interna em prejuízo de todos os outros países do mundo.

Ressurgem, na agenda política, as pressões capitalistas para que os estados reduzam seus gastos sociais e aumentem a exploração sobre os trabalhadores. Volta a entrar em cena a receita neoliberal: diminuição dos salários e dos benefícios para os trabalhadores, cortes de gastos públicos, aumento dos juros.

O Brasil contornou razoavelmente os impactos da primeira onda da crise. Os bancos brasileiros não estavam tão dependentes do capital fictício, especulativo, como estavam os bancos dos EUA e de outros países centrais do sistema capitalista. Por outro lado, o capital financeiro internacional aplicado na bolsa e em ações de empresas no Brasil não fugiu (como aconteceu em diversos outros países). Ao contrário. Pelas dimensões do país, pela natureza do governo e o potencial de retorno dos investimentos, muitos viram o Brasil como um porto seguro para seu capital financeiro. Além disso, o Estado brasileiro e o governo federal atuaram com muita agilidade, aplicando medidas de política econômica que representaram um colchão de proteção às empresas capitalistas dos setores mais dinâmicos da economia.

A grande interrogação, neste momento, é a capacidade de enfrentar essa segunda etapa. Como reagirá o novo governo, o de Dilma Roussef?

As pressões da burguesia serão imensas. A grande mídia já começa a pautar os velhos analistas do receituário neoliberal: redução de gastos públicos, reforma previdenciária, redução de direitos trabalhistas. O mesmo discurso com os mesmos argumentos.

Novamente, torna-se urgente unificar as forças populares em torno de um programa de medidas da classe trabalhadora para enfrentar a crise.

Fonte: Jornal Brasil de Fato

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